A Associação para o Planeamento da Família quer que os centros de saúde realizem interrupções de gravidez medicamentosas, para dar resposta às mulheres que vivem em zonas do país como o Alentejo, onde apenas um hospital tem esse serviço.

A sugestão é feita pelo diretor executivo da Associação para o Planeamento da Família (APF), Duarte Vilar, a propósito dos dados constantes do Relatório dos registos das Interrupções da Gravidez (IG), da Direção-Geral da Saúde, que revelam grandes assimetrias regionais no acesso aos serviços de saúde que realizam abortos.

O relatório confirma uma evidência, já apontada em relatórios de anos anteriores, de que as utentes de algumas zonas do país têm de viajar quilómetros para se deslocarem a regiões que disponham de serviços de saúde que realizem interrupções de gravidez (IG), sobretudo Lisboa e Vale do Tejo.

As zonas mais prejudicadas são os Açores e o Alentejo: das 72 IG registadas nos Açores, nenhuma foi feita nessa região, ao passo que no Alentejo se registaram 466 IG, mas apenas duas foram feitas na mesma zona.

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Duarte Vilar considera fundamental que “os serviços públicos e privados passem a oferecer serviços de gravidez onde não há”, principalmente nos Açores e Alentejo, que “revelam desigualdades profundas”.

Referindo o caso do Alentejo, o responsável lembra que só essa região “representa um terço do país”, pelo que “não se compreende” que de três hospitais com obstetrícia — Portalegre, Beja e Évora – e que poderiam oferecer esse serviço, “apenas o de Portalegre oferece”.

“Os outros não estão a dar a resposta que deveriam e que as populações dessas zonas esperam dos hospitais”, afirmou.

Esta carência poderia facilmente ser colmatada se os centros de saúde pudessem praticar as IG que são feitas com recurso a medicamentos (e que são a grande maioria), considera, sugerindo que sejam “replicadas experiências feitas na região norte em que a IG medicamentosa é feita no contexto dos centros de saúde e não só nos hospitais”.

De acordo com o relatório, o centro de saúde de Amarante é o único de todo o país que realizou interrupções de gravidez, com um total de 131 IG feitas em 2014.

O relatório confirma mais uma vez a tendência de queda do número de IG que se vem verificando desde 2012, sendo que no ano passado se realizaram 16.589 abortos (por todos os motivos), menos 1.692 do que em 2013 (total de 18.281), o que traduz uma descida de 9,3%.

Avaliando apenas as IG “por opção da mulher” (representam 97% do total e realizam-se até às 10 semanas de gestação), em 2014 realizaram-se 16.039, menos 9,5% do que em 2013 (17.728).

Para Duarte Vilar, esta descida consistente desde 2012, após um pico verificado em 2011, demonstra uma evidência, que já tem sido sustentada por estudos sobre contraceção, de que o uso de contracetivos em Portugal é altíssimo.

Segundo o diretor da APF, depois de números relativos a 2007 e 2008 apontarem para que o uso de contracetivos pelas mulheres rondasse os 87%, outros dados divulgados recentemente revelaram que o uso de contraceção pelas portuguesas era superior a 90%.

“As mulheres e os casais controlam a natalidade na base da contraceção e não do recurso ao aborto. Esta é a primeira conclusão de uma evidência que se tem consolidado todos os anos, que é a do decréscimo do número de abortos”, afirmou.

Os dados relativos à reincidência demonstram que 71,06% das mulheres nunca tinham abortado, 21,90% tinham feito uma interrupção de gravidez, 5,11% tinham feito duas e 1,93% tinha realizado três ou mais abortos ao longo da sua vida.

Quanto às mulheres que já tinham feito uma outra IG nesse ano (2014), o relatório da DGS indica terem sido 303 (1,9%).

O perfil das mulheres que optam por interromper a gravidez não tem sofrido grande alterações ao longo dos anos, sendo mais predominante nas mulheres entre os 20 e os 24 anos, seguido das de 30 a 34 anos. Paralelamente, tem diminuído entre as jovens com menos de 20 anos.

Relativamente ao grau de instrução, cerca de 38% tinham o ensino secundário e 21,4% tinham cursos superiores.

Quase metade (41,14%) das mulheres que abortaram não tinha outros filhos, 29,45% tinham um e 21,78% tinham dois.