Os passes falham-se aos montes. Nas pernas não há corda ou, se há, poucos a puxam. O espaço para pensar abunda e não obriga a que se fique alerta. Os segundos, os que costumam aparecer a menos, surgem agora a mais e deixam que cada equipa tenha tempo a mais para pensar no que fazer à bola. Pelo menos lá atrás, junto às áreas, onde se joga a passo e se veem mais jogadores a andarem do que a correrem. O jogo aborrece, chega a ser uma seca, e por isso há um ou outro artista que, fartos da calma, inventam uma aventura de “eu contra o mundo” e tentam fintar tudo o que lhes aparece à frente.
Isto não é o retrato de um jogo domingueiro entre amigos, mas bem que podia ser o resumo (um pouco exagerado, ok) do que, em Genebra, portugueses e italianos andaram a fazer até ao intervalo. Todos sabem que este amigável é a única coisa que os separa das férias e, mesmo que, antes, Fernando Santos apele ao “orgulho nacional”, o jogo é pachorrento. A bola é da Itália, ou de Andrea Pirlo, que pensa bem mais rápido do que corre e a quem todos passam. E como eles jogam ao ritmo do capitão barbudo, a squadra azzurra é lenta a fazer quase tudo.
Portugal não faz melhor. Danilo é o melhor amigo da cautela e não arrisca passes na primeira internacionalização, enquanto Tiago e João Moutinho juntam-se mais a ele, no meio campo, do que aos extremos ou a Éder, no ataque. Varela e Quaresma, à vez, lá vão tentando umas aceleradelas com a bola. Mais o segundo, que insiste em tentar inventar jogadas sozinho e não com a ajuda dos outros. Como fazem os italianos. Darmian e De Sciglio, os laterais atacam muito e deixam Candreva, Soriano e Bertolacci a correrem por Pirlo, que por mais pressão que Éder faça consegue estar sempre a conversar à vontade com a bola.
Aos 19’ há um remate que Bertolacci faz rasar o poste e, aos 28’, surge outro de El-Sharawy, à beira da área. Beto nem se mexe em ambos. Da única vez que a seleção nacional decide correr a sério e pressionar, aos 33’, quase marca — acontece quando Éder sprinta para apertar Sirigu e consegue atrapalhar o guarda-redes, que chuta contra ele e faz com que a bola sobre para Varela. O extremo, que não jogava na seleção desde o Mundial, bate de primeira com a canhota, mas De Sciglio corta a bola em cima da linha. E mais nada se passa de bom se passa além do mau que lesiona Fábio Coentrão e o faz ir de férias magoado na coxa.
Aparece o intervalo para depois surgir o bom. Sim, porque da primeira para a segunda parte é um salto do dia para a noite sem direito a pôr-do-sol. Tudo muda de repente e para melhor. A seleção acelera, joga rápido e os passes saem de primeiro e para o pé. Os erros acalmam-se e a bola que, aos 50’, a cabeça de Bonucci remate ao poste da baliza de Beto — vinda de um livre de batido por vocês-sabem-quem — serve para acordar ainda mais os portugueses. Adrien Silva entra em jogo para correr o que Tiago não conseguia e para contagiar Moutinho com a mesma rotação. Há mais bolas a chegar a Éder e bastantes mais a serem guardadas pelo avançado. Veem-se coisas, finalmente.
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E vê-se também uma novidade aos 52’, quando Éder, ao fim de 17 jogos, marca um golo pela seleção. Fá-lo graças a Eliseu, que roubou uma bola lá bem atrás no meio campo português, arrancou com ela e fintou dois italianos antes de a passar a Quaresma. O extremo estava na esquerda e ajeitou o corpo para fazer o que tanto gosta a sacar uma trivela para cruzar a bola. Lá estava Éder no fim desse cruzamento para marcar. O golo fez bem, tão bem a Portugal, que a cada minuto que passou, a equipa foi jogando melhor. Deu para Adrien rematar de longo, para Moutinho-versão-capitão fintar éne italianos e para Éder ser a referência segura que nem sempre costuma ser.
Com os minutos a passar também dava para antever que, 39 anos depois, era desta que a seleção nacional ia ganhar um jogo à Itália. Nem com tanta substituição — além de Cédric e Adrien, entraram Daniel Carriço (estreia), Nani e Pizzi — o jogo abrandou do lado português e via-se que o intervalo serviu para os jogadores se lembrarem que se podiam despedir com um até já simpático dos adeptos. Algo do qual os italianos apenas se lembraram quase no fim, quando Gabbiadini, aos 90′, deu a Beto a parada da noite e, minutos depois, Matri rematasse pouco ao lado do poste, já na área. Algo que Ranocchia também fez pouco antes de o árbitro mandar toda a gente de férias. Aí já Éder tinha inventado um pontapé de bicicleta à entrada da área para provar que este era mesmo o seu melhor jogo pela seleção.
Quando o árbitro apitou três vezes toda a gente tinha a certeza — agora sim, chegavam as férias. E umas quantas certezas. A primeira, que a seleção jogou bem melhor no velhinho 4-3-3 do que no novato 4-4-2 que, na Arménia, teve Cristiano Ronaldo para resolver o jogo. Depois, que Éder, se jogar assim, dá muito jeito à equipa. A terceira, e a última, que só voltaremos a ver Portugal jogar em setembro, quando a França for jogar um amigável ao Estádio de Alvalade. Até lá a seleção nacional está de férias. Até já.