Depois de ter vencido as eleições legislativas de 25 de janeiro e de ter saído por cima no referendo de 5 de julho, o Syriza prepara-se agora para um eventual cenário de eleições antecipadas. A imprensa grega aponta os meses de outubro ou novembro como os mais prováveis para uma nova consulta popular. Esta pode chegar pela via de uma moção de confiança ao governo grego que, nas atuais condições do parlamento grego, o executivo liderado por Alexis Tsipras terá dificuldades em vencer.
Esta hipótese começou a ser colocada logo após o parlamento grego ter aprovado na manhã de sexta-feira o plano para o terceiro memorando de entendimento grego — isto é, depois de nove longas horas de debate. Pouco depois de os votos serem contados (222 a favor, 64 contra e 11 abstenções), a estação pública de televisão grega, a ERT, avançava que o primeiro-ministro, Alexis Tsipras, iria pedir ao parlamento que votasse uma moção de confiança ao seu executivo num futuro próximo. A convocatória deverá ser feita depois de 20 de agosto, altura em que a Grécia fará um pagamento de 3,2 mil milhões de euros ao Banco Central Europeu.
Na segunda-feira o ministro da Energia, Panos Skourletis, disse que é “óbvio que, depois da profundo golpe dentro do grupo parlamentar do Syriza, se dê esse passo”, referindo ainda que “é uma questão de responsabilidade democrática”. Se esse cenário se confirmar, os números não são sorridentes para Tsipras no plano imediato.
“Uma das páginas mais negras da história da democracia”
Primeiro, porque está a braços com uma crise dentro do seu próprio partido — quase um terço dos deputados do Syriza não votaram favoravelmente o plano de resgate — e por consequência dentro da coligação — dos 162 deputados que apoiam os partidos no poder, só 118 disseram “sim” a novas medidas de austeridade. Embora não seja líquido que estes números sejam tirados a papel químico para uma eventual votação de uma moção de confiança, a verdade é que há cada vez mais divisões entre Tsipras e alguns dos deputados do seu partido — demasiadas para que seja provável que Tsipras consiga os 151 votos necessários para vencer a moção.
A Plataforma de Esquerda, a fação mais à esquerda dentro do Syriza, liderada pelo ex-ministro da Energia, Panayotis Lafazanis, parece estar irremediavelmente contra o primeiro-ministro. “A luta contra o novo memorando começa hoje, com a mobilização de pessoas em cada canto do país”, pode ler-se num comunicado assinado por Lafazanis e outros 11 militantes do Syriza. A imprensa grega toma como praticamente certa a intenção do ex-ministro de formar um novo partido de esquerda radical. E num site que é afiliado a este braço do Syriza, o Iskra, a maior parte das críticas não são dirigidas à chanceler alemã, Angela Merkel, nem ao ministro das Finanças germânico, Wolfgang Schäuble, mas sim ao governo de Tsipras. Num destes textos, o realizador do documentário Dívidocracia, Aris Hatzistefanou, fala da votação de 14 de agosto como “uma das páginas mais negras da história da democracia parlamentar não só da Grécia mas do mundo inteiro”.
Depois, porque os partidos da oposição não parecem estar dispostos a estender a mão para ajudar Tsipras a manter-se como primeiro-ministro. A Nova Democracia, o partido de centro-direita que é o mais expressivo dentro da oposição, já disse que não vai votar a favor do governo grego na eventualidade de uma moção de confiança. E os socialistas do Pasok também já vieram dizer o mesmo.
Syriza pode ganhar maioria absoluta
Ainda assim, apesar de os ventos parecerem contrários a Alexis Tsipras, é possível que seja ele próprio, e o seu governo, a sair vitorioso deste hipotético desafio. Olhando para as sondagens, Tsipras tem todas as razões para querer provocar novas eleições. Os estudos de opinião mais recentes (segunda quinzena de julho), apontam que o Syriza teria um resultado entre 41% e 43% — um resultado histórico para o seu partido e mais do que suficiente para conseguir chegar a uma maioria absoluta sem ter de recorrer a uma coligação.
Além disso, segundo uma consulta do mês passado, a taxa de aprovação de Tsipras é de 59%. A oposição está a par destes números, o que lança algumas dúvidas sobre até que ponto é que esta deseja novas eleições. No debate de sexta-feira, o líder interino da Nova Democracia, Vangelis Meimarakis, perguntou repetidas vezes a Tsipras se ia convocar novas eleições. Só que, em vez de fazê-lo como é costume dos partidos da oposição (que, fazendo fé na tendência cíclica da alternância no poder, desejam novas eleições), Meimarakis tentou convencer Tsipras de que essa hipótese seria desastrosa: “Umas eleições antecipadas resultariam num desastre económico para o país”.
Novas eleições são sinónimo de novas listas — o que, neste caso, tendo em conta a oposição interna no Syriza, não é um mero detalhe. Ao reunir uma novo grupo de candidatos ao parlamento grego, Tsipras pode deixar de fora aqueles que, dentro do seu próprio partido, mais ondas têm levantado à sua governação. Por portas e travessas, esta pode ser uma receita perfeita para o primeiro-ministro de 39 anos, dir-se-á. O seu ministro da energia, Panos Skourletis, prefere falar em estabilidade:
As eleições antecipadas são um imperativo para atingir estabilidade política. Dados os problemas dentro da maioria parlamentar pode ser considerada tudo menos estável.”