O ex-primeiro-ministro angolano Marcolino Moco considerou que o “regime angolano está encurralado” e “inventa crimes” que não estão tipificados na legislação em relação aos 15 ativistas que estão detidos, acusados de preparem um atentado contra o Presidente.

Em entrevista à agência Lusa, Marcolino Moco referiu que a detenção dos ativistas é “já um efeito de um regime que se proclamou democrático desde 1992 e cuja democracia devia ser consolidada após o fim da guerra civil, mas cujo caminho que foi seguido foi exatamente o contrário”.

“Começou por se imprimir na ordem constitucional histórica uma ideia de pessoalização do regime e desde essa altura que eu chamei a atenção que esse tipo de regime iria conduzir a situações como esta”, que mostra como “o regime está encurralado e inventa crimes que não estão tipificados na legislação angolana”, disse.

Em setembro, o Ministério Público angolano acusou formalmente 15 ativistas de atos preparatórios para uma rebelião e um atentado contra o Presidente angolano.

O caso tem motivado críticas de organizações internacionais, sobretudo desde a greve de fome do luso-angolano Luaty Beirão, há 26 dias.

Luaty Beirão é um dos rostos mais visíveis da contestação ao regime angolano. É filho de João Beirão, já falecido, que foi fundador e primeiro presidente da Fundação Eduardo dos Santos (FESA), entre outras funções públicas, descrito por várias fontes como tendo sido sempre muito próximo do Presidente angolano.

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Segundo Marcolino Moco, que foi também o primeiro secretário-executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), entre 1996 e 2000, estes jovens “estão a tentar exercer os direitos que estão consagrados na Constituição de 2010” e a quem “se prometeu tudo isso”.

A Constituição “dá-lhe a ele [Presidente] muitos poderes — ele manda na justiça, manda nas Forças Armadas, manda na polícia, manda em tudo – mas a Constituição consagra direitos, garantias e liberdades […] e os jovens acham que devem exercer esses direitos”, disse.

Para o ex-primeiro-ministro (1992-1996), a “indisposição” invocada na quinta-feira pelo Presidente para não comparecer, pela primeira vez desde que está no poder, no parlamento para o discurso do Estado da Nação, “é apenas uma forma de evitar olhar para os olhos das pessoas numa situação que artificialmente ele criou”.

“Por um lado, aparentemente é um problema, mas para ele é mais uma forma de justificar a sua permanência” no poder, disse.

O ex-governante defendeu que “é preciso desbloquear o sistema, com José Eduardo dos Santos ou sem ele”.

“O grande problema é que o sistema pretende afastar setores importantes da direção do país e grave ainda é que não há pudor nenhum em utilizar as riquezas do país para uma família e pouco mais perante a miséria terrível que se vive em Angola”, referiu.

Considerando que os jovens que têm promovido manifestações contra o Governo de Eduardo dos Santos são “pessoas que deviam começar a assumir as responsabilidades do país”, Marcolino Moco lamentou que o Presidente, “que tem 73 anos e está há 36 no poder”, prefira “fazer este bloqueio à juventude”, em vez de “participar numa solução”.

Referindo que sempre evitou usar o termo ditadura para se referiu ao seu país, Marcolino Moco não hesitou hoje em recorrer a ele.

“Quando se está a deixar morrer um jovem na cadeia, que nome dar ao nosso sistema”, questionou.