Em tempos em que a política e a economia tendem a ser tomadas como um todo uno e indivisível, a Polónia prepara-se para contrariar essa tendência. Apesar de o Plataforma Cívica, o partido de centro-direita que governa o país desde 2007, ter encabeçado um crescimento de 24% da economia em oito anos, é o Lei e Justiça (PiS), de direita conservadora e xenófoba, que aparece em primeiro nas sondagens para as eleições deste domingo.

O PiS, fundado pelos geméos Jaroslaw e Lech Kaczyński em 2001, surge à frente nas intenções de voto com cerca de 37% e perto de conseguir a primeira maioria absoluta da história parlamentar da Polónia. São precisos 231 assentos parlamentares para controlar a Sejm e das últimas nove sondagens (realizadas entre quinta e sexta-feira), sete colocam o PiS aquém dessa marca e, assim, à mercê de outros partidos para atingir uma maioria.

Em segundo lugar aparece o Plataforma Cívica (PC), o partido fundado pelo presidente do Conselho Europeu e ex-primeiro-ministro, Donald Tusk. Nas mesmas nove sondagens dos últimos dias, surge entre os 20% e os 26,3% — a anos-luz dos 41,5% de 2007 e dos 39,2% de 2011. O PC é agora liderado por Ewa Kopacz, a antiga ministra da saúde a quem coube preencher o lugar vago por Tusk.

Escutas à mesa de restaurantes de luxo

Apesar do crescimento económico sentido no país — a Polónia entrou na União Europeia em 2004 —, o PC saiu altamente prejudicado de um escândalo em que políticos do seu partido foram gravados à mesa de um dos restaurante mais caros de Varsóvia a discutir trocas de favores políticos e outros assuntos numa linguagem boçal. Suspeita-se que as conversas possam ter sido gravadas pelos empregados do restaurante. O conteúdo destas discussões foi divulgado pela revista polaca Wprost.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Numa das conversas, datada de julho de 2013, o então ministro do Interior, Bartłomiej Sienkiewicz, conseguiu assegurar junto do governador do Banco Central da Polónia, Marek Belka, uma política monetária favorável mesmo antes das eleições legislativas em caso de uma quebra da economia. Mas tudo tem um preço, e neste caso o arranjo não se faria sem uma condição: o então ministro das Finanças, Jacek Rostowski, teria de ser afastado do seu cargo.

Poland's main opposition Law and Justice party (PiS) candidate for the prime minister's post, Beata Szydlo is pictured during a campaign meeting in Warsaw on October 17, 2015. AFP PHOTO / JANEK SKARZYNSKI (Photo credit should read JANEK SKARZYNSKI/AFP/Getty Images)

Beata Szydło, líder do PiS, está perto de se tornar na primeira mulher a governar a Polónia

Por outro lado, a estrela em ascensão desta campanha tem sido Beata Szydło, a líder do PiS que agora pode tornar-se na primeira mulher a encabeçar um governo na Polónia. Nascida em Brzeszcze, uma pequena cidade no Sul do país com pouco mais de 10 mil habitantes, Szydło conta buscar a maior parte dos votos ao eleitorado rural, conservador e católico, alheio ao crescimento vibrante sentido sobretudo na capital Varsóvia.

Tenho 52 anos e venho de Przecieszyn — uma vila no concelho de Brzeszcze. Recordo com carinho o calor da minha casa. Não senti falta nem de apoio nem de disciplina. Os meus pais trabalharam muito. O meu pai era mineiro”, lê-se no site oficial da candidata a primeira-ministra.

O programa do PiS foi bem recebido durante a campanha, de onde se destaca a redução da idade da reforma (dos 67 anos para os 65 nos homens, 60 para as mulheres), o aumento do salário mínimo para 12 zlotys por hora (€2,82), um aumento de subsídios às famílias e um aumento da fasquia mínima para quem tem de pagar impostos sobre o rendimento. Por outro lado, Szydło promete um aumento de impostos para os bancos e para os supermercados estrangeiros — entre os quais se encontram os portugueses Millenium BCP e a Jerónimo Martins, dona do Pingo Doce e que na Polónia tem mais de 2 600 lojas com a marca Biedronka.

Além disso, o PiS tem conseguido capitalizar o sentimento anti-russo historicamente sentido na Polónia e entretanto fortalecido com a guerra no Leste da Ucrânia. Uma promessa central do partido é a de aumentar a despesa com a defesa para 2,5% do PIB — ou seja, cerca de 12,7 mil milhões de euros. Uma medida que, se for concretizada, fará da Polónia o segundo país entre os 28 da NATO que mais investe no exército e noutras forças militares. Mais do que isso, só os EUA.

“Vamos trabalhar, trabalhar, trabalhar — e não apenas fazer promessas”, disse Szydło num discurso de campanha.

Por trás deste perfil, tem estado o antigo primeiro-ministro polaco e presidente do PiS, Jaroslaw Kaczyński — irmão de Lech Kaczyński, cuja morte num desastre de avião em Smolensk, na Rússia, ainda está a ser investigada. Depois de ter liderado a oposição ao Plataforma Cívica desde 2007 sem conseguir passar para a frente nas votações, Kaczyński é agora uma figura omnipresente na campanha do partido xenófobo e eurocético. O Financial Times chama-lhe “o Poder por detrás do trono polaco”.

“Uma Budapeste em Varsóvia”

“Já há sinais do reaparecimento de doenças muito perigosas que não eram vistas na Europa há muito tempo: cólera nas ilhas gregas, disenteria em Viena e vários tipos parasitas que não são perigosos nos organismos destas pessoas que aqui podem ser”, disse Kaczyński numa ação de campanha. A retórica xenófoba e, mais recentemente, anti-refugiados, não é uma novidade no discurso de Kaczyński, que em 2012 demonstrou simpatia pelo governo húngaro, de Viktor Órban: “Estou profundamente convencido que o dia do nosso sucesso vai chegar quando tivermos uma Budapeste em Varsóvia”.

O primeiro passo nesse sentido foi dado em maio, quando o candidato do PiS, Andrzej Duda, saiu vitorioso contra as previsões de todas as sondagens. Já durante a sua campanha, o ex-eurodeputado do PiS fez questão de levar Szydło ao seu lado em várias ações — a maior parte feitas pela Polónia rural.

“Ela é a cara da direita moderada da Polónia. É a mulher trabalhadora, engenhosa e inteligente atrás a vitória espetacular de Andrzej Duda na campanha presidencial”, disse à BBC Marek Magierowski, conselheiro do presidente polaco para os assuntos diplomáticos.

Uma dessas ações consistiu numa viagem à vizinha Eslováquia, que entrou no euro em 2009, onde procurou demonstrar como um cabaz de bens essenciais era mais caro do outro lado da fronteira graças à adoção da moeda única. Segundo os cálculos de Duda, a conta ficava 50% acima do valor na Polónia.