Ainda é cedo para tirar conclusões sobre o que levou o avião russo a despenhar-se no sábado na península do Sinai, matando todas as 224 pessoas a bordo, mas uma coisa o comité intergovernamental que está a investigar o acidente parece ter a certeza: o avião partiu-se no ar antes de atingir o solo. É pelo menos isso que mostram as primeiras análises aos destroços do avião – espalhados numa área de 20 quilómetros quadrados ao longo do deserto. Mas quanto às causas do desastre, a incerteza é maior. Depois de o Estado Islâmico ter reivindicado a autoria do ataque, a hipótese de uma bomba ter sido colocada no interior do avião ganha força. O Guardian confirma esta segunda-feira, citando fonte oficial da companhia aérea russa, que a hipótese de falha técnica está a ser excluída – “fator externo” é o mais provável.
Os restos mortais de 144 pessoas chegaram entretanto à Rússia, que prossegue o luto pelas 224 pessoas que morreram a bordo. Segundo o ministro russo Vladimir Puchkov, que se encontra na península do Sinai a coordenar os trabalhos de resgate, a operação de recuperação dos cadáveres deverá ficar terminada esta noite, altura em que será enviado um segundo avião com restos mortais para São Petersburgo.
O que se sabe para já?
- O avião da MetroJet, que tinha como destino São Petersburgo, caiu a sul da cidade egípcia de Al-Arish, capital da província do Norte Sinai, pouco depois de levantar voo de Sharm el-Sheik. Morreram 224 pessoas, sendo que a maior parte eram famílias russas que estavam de férias na estância balnear do Mar Vermelho e que regressavam naquela altura a São Petersburgo. Iam 17 crianças e 207 adultos a bordo, não houve sobreviventes.
- As primeiras análises aos destroços do avião apontam para o facto de não se ter despenhado durante o embate no solo, mas sim no ar. Há pedaços do avião espalhados por uma vasta área de 20 quilómetros quadrados, o que leva a crer que o avião já se havia desintegrado antes de embater no solo. Hipótese de explosão, com bomba colocada dentro da aeronave, ganha força.
- O contacto com a aeronave perdeu-se 23 minutos depois da descolagem do aeroporto de Sharm el-Sheikh. Segundo dados publicados pela FlightRadar24.com, o avião tinha atingido uma altitude de 33 mil pés quando, cerca de 20 minutos depois de ter descolado, baixou abruptamente para os 6 mil pés. Os 20 segundos seguintes (que ainda foram captados pelas torres de controlo) terão sido de subidas e descidas de altitude abruptas. Terá sido nessa altura que se perdeu o contacto com os radares.
- Tratava-se de um avião Airbus A321-200 da companhia aérea russa Kogalymavia, uma companhia aérea privada fundada em 1993, com base no aeroporto moscovita de Domodedovo, que realiza habitualmente voos fretados e que opera sob o nome de MetroJet.
- As autoridades que estão a investigar as causas do desastre mantém (quase) todos os cenários em aberto: erro do piloto, ataque terrorista, bomba a bordo. Não houve pedidos de ajuda da parte do piloto, o que parece querer dizer que a causa do acidente foi súbita e inesperada. Esta segunda-feira, fonte oficial da companhia aérea descartou falha técnica e apontou o dedo a um “fator externo”.
- No próprio dia do acidente, a representação do Estado Islâmico no Sinai reivindicou a responsabilidade pela queda do avião, mas o anúncio não foi encarado como muito plausível já que não é certo que aquele grupo terrorista tenha acesso a mísseis terra-ar.
- Algumas companhias aéreas estão a recalcular as suas rotas para evitar circular sobre a Península do Sinai e a circulação de aviões do mesmo modelo da MetroJet foi entretanto proibida, até se esclarecer se se tratou de falhas mecânicas ou não.
- As caixas negras do avião foram recuperadas no domingo e vão começar a ser examinadas esta segunda-feira na esperança de perceber melhor o que aconteceu nos últimos momentos antes da queda.
- Chegaram esta segunda-feira os primeiros restos mortais das vítimas a São Petersburgo: 144 no total. A Rússia está de luto.
- O acidente é o mais grave da história da aviação russa.
Pode ter sido uma bomba? Erro do piloto?
As dúvidas permanecem desde sábado. Nas horas que se seguiram à queda do Airbus A321, os governos tanto do Egipto como da Rússia foram unânimes em afirmar que tudo indicava tratar-se de uma falha técnica ocorrida na aeronave, minimizando tanto quanto possível a hipótese de ter-se tratado de um ataque do Estado Islâmico. Para dar força a essa tese, depressa circularam notícias na imprensa russa a lembrar que aquele modelo de avião, que tem 18 anos, já tinha sofrido um acidente em 2001 quando a cauda do avião embateu contra o solo no momento da aterragem. Mas a verdade é que um dia depois, tanto o Comité Intergovernamental de Aviação (MAK), que está a investigar o caso, como o próprio presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi, deram um passo atrás nas certezas para dizer que era “muito cedo” para determinar as causas e que era preciso um “estudo técnico extenso e complicado”.
A isto juntou-se o facto de o Estado Islâmico ter reivindicado a responsabilidade do ataque, dizendo tratar-se de vingança pela intervenção russa na Síria – reivindicação que, ainda assim, não foi dada como muito plausível porque o avião já tinha atingido uma grande altitude (30 mil pés) para poder ser atingido por um míssil – e porque não é certo que os terroristas naquela região tenham acesso a mísseis terra-ar. Segundo o jornal britânico The Telegraph, contudo, especialistas franceses (onde a Airbus está sediada) estarão a dar relevo à possibilidade de o avião ter explodido com uma bomba colocada a bordo. “O comunicado de reivindicação do Estado Islâmico não diz que abateram o avião, mas que o destruíram”, disse ao Le Parisien Yves Trotignon, um ex-agente da inteligência francesa, deixando no ar a possibilidade de terem sido colocados “explosivos a bordo” ou ter havido “sabotagem”.
Também Mark Rosenker, ex-presidente do National Transportation Safety Board dos Estados Unidos fez a mesma questão: “Pode ter sido alguém a pôr uma bomba lá dentro? Tem de se olhar para esta hipótese”, disse, citado pelo New York Times, acrescentando que a equipa de investigação, liderada por egípcios mas composta também por especialistas de França, Alemanha, Rússia e Irlanda, deverá estar capaz de fazer as primeiras conclusões assim que as caixas negras forem analisadas.
Apesar de muitos analistas lembrarem que o aeroporto egípcio de Sharm el-Sheikh tem medidas de controlo de segurança semelhantes às de qualquer outro aeroporto, nenhum descarta a possibilidade de bomba. Certo é que as análises que têm sido feitas aos destroços mostram a zona da cauda do avião separada do resto e queimada – o que sustenta a tese de explosão.
O New York Times alerta ainda para a teoria de outros especialistas: erro do piloto. É que, apesar de as aeronaves da Airbus estarem equipadas com software sofisticado para permitir que o avião voe de acordo com determinados parâmetros de segurança, ainda cabe aos pilotos manter-se atentos a fatores como a velocidade, a temperatura do ar e a altitude. O que os analistas dizem é que um avião totalmente carregado com passageiros e combustível a subir muito rapidamente através do ar quente do deserto pode ter sofrido uma falha aerodinâmica – e, dependendo da velocidade da descida, pode ter sido isso que fez partir-se no ar antes de atingir o solo.