Os contactos com Lula da Silva foram sempre encarados por José Sócrates como fundamentais no seu trabalho como consultor da Octapharma para a América Latina. Desde que as investigações do processo ‘Operação Marquês’ se iniciaram no verão de 2013, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal detetou diversos contactos entre o ex-primeiro-ministro português e o ex-presidente brasileiro que confirmam esta tese.

Mas nem sempre as tentativas de contacto tiveram sucesso, assim como nem sempre estavam relacionadas com a Octapharma.

Lula da Silva, por exemplo, veio a Lisboa em outubro de 2013 para participar no lançamento do livro de José Sócrates, assim como também se deslocou à capital portuguesa em abril de 2014 para participar nas comemorações do 40.º aniversário do 25 de Abril na Fundação Mário Soares. Neste último caso, Sócrates teve um papel decisivo na vinda do ex-presidente brasileiro, apesar do convite formal ter partido do ex-Presidente da República português. Uma das viagens terá sido paga por construtoras brasileiras que estão a ser investigadas na Operação Lava Jato.

Um mês antes de ser detido, a 21 de novembro de 2014, José Sócrates tentou também intermediar a vinda de Lula da Silva a Lisboa para participar e discursar no XX Congresso do PS. António Costa tinha ganho a António José Seguro no final de setembro as eleições diretas para a liderança socialista e esse seria o seu primeiro congresso como secretário-geral. Lula da Silva, por seu lado, tinha acabado de ajudar Dilma Roussef a ser eleita como presidenta do Brasil após a segunda volta das presidenciais de 26 de outubro.

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Ao que o Observador apurou, José Sócrates, com a ajuda de Guilherme Dray (seu ex-chefe de gabinete durante o segundo mandato como primeiro-ministro), não só tentou intermediar conversas telefónicas entre Lula da Silva e António Costa, como chegou a ponderar financiar uma semana de férias de Lula e da sua mulher em Portugal para facilitar a sua vinda a Lisboa para discursar no XX Congresso do PS. Sem sucesso, contudo. Lula da Silva acabou por tirar uma semana de férias mas não em Portugal.

Última reunião impossibilitada por prisão

José Sócrates nunca escondeu a sua admiração por Lula da Silva, o homem que governou o Brasil entre 2003 e 2011 e que, apesar de acossado por investigações criminais a pessoas próximas, sempre teve influência junto do governo de Dilma Roussef – sua sucessora e líder do ‘seu’ partido: o Partido dos Trabalhadores.

Por isso mesmo, e enquanto consultor da Octapharma, José Sócrates tentou recorrer com regularidade aos conhecimentos de Lula da Silva junto do governo brasileiro. Os pedidos de encontros com o ex-presidente brasileiro, segundo a investigação da Operação Marquês, foram vários desde setembro de 2013 e até Sócrates ter sido detido.

Os pedidos de reunião eram sempre feitos através de Guilherme Dray, então administrador da Ongoing que não só ia regularmente ao Brasil em trabalho como mantinha bons contactos com o staff de Lula da Silva, nomeadamente com Paulo Okamoto (ex-chefe de gabinete no Palácio Planalto e presidente do Instituto Lula). Das duas vezes que José Sócrates falou com Lula da Silva, as conversas terão sido sempre pessoais. Não existirão registos de conversas telefónicas diretas entre os dois.

Entre setembro de 2013 e fevereiro de 2014, ao que o Observador apurou, José Sócrates terá pedido a Guilherme Dray a marcação de cinco reuniões com Lula da Silva. Nem todas se verificaram, até porque Sócrates desmarcou por duas vezes. Uma porque Lalanda Castro, líder da Octapharma Portugal, não podia deslocar-se ao Brasil e outra, em julho, porque Sócrates teve conhecimento de que a revista “Sábado” iria publicar uma reportagem onde era revelada a existência da investigação que decorria contra si no DCIAP.

A última reunião com Lula pedida a Dray seria para a data de 25 de novembro, visto que Sócrates partiria para o Brasil no dia anterior. O ex-primeiro-ministro, contudo, não viria a realizar essa viagem por ter sido detido no aeroporto da Portela no dia 21 de novembro quando estava ao a chegar de Paris.