Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto, e Antero Henrique, diretor-geral da SAD do Porto, foram acusados pelo Ministério Público (MP) de um total 13 crimes de exercício ilícito relacionado com a atividade de segurança privada, mas as ligações de Eduardo Silva e da sua empresa SPDE – Segurança Privada e Vigilância em Eventos ultrapassam as fronteiras do clube das Antas. Godinho Lopes, ex-presidente do Sporting, Hulk, ex-jogador do FC Porto a jogar neste momento no Zenit de São Petersburgo, e Nuno Fréchaut, ex-jogador do Boavista e da Seleção Nacional, também estiveram origem de acusações contra o gestor e segurança conhecido como Edu. Até desavenças relacionadas com a divisão do produto de uma transferência de jogadores para o Sp. Braga e conflitos ocorridos entre jogadores das camadas jovens do Boavista tiveram intervenção da SPDE e levaram a outras acusações.
Todas as situações têm um ponto em comum: não só a a SPDE não tinha alvará para comercializar serviços de segurança privada, como a carteira profissional de Eduardo Silva como porteiro tinha caducado em maio de 2015. Daí a imputação do crime de exercício ilícito da atividade de segurança.
Comecemos por Pinto da Costa e por Antero Henrique que foram acusados por alegadamente terem conhecimento que a SPDE e os seus funcionários não estavam devidamente habilitados a prestar serviços de proteção pessoal.
Desde 2011 que o FC Porto e a SPDE tinham relações comerciais no campo da vigilância dos espetáculos desportivos das diversas modalidades e de diversas infra-estruturas, como o museu do clube. Foi nessa altura que Eduardo Silva começou a acompanhar o presidente do FC Porto nas suas deslocações profissionais e pessoais, prestando um serviço de proteção pessoal – vulgo guarda-costas. Segundo o MP, o mesmo era prestado a título pessoal já que Edu não podia desempenhar esta atividade por não estar devidamente credenciado.
Assim, a 30 de maio terão sido celebrados novos contratos de prestação de serviços entre a SPDE e a Futebol Clube do Porto, Sociedade Anónima Desportiva (SAD), e a Porto Estádio, ficando devidamente expresso em ambos contratos a “prestação de serviços a membros…” dos órgãos sociais das duas sociedades. É a partir desta cláusula contratual que o MP diz que Eduardo Silva passou a prestar de forma indevida serviços de segurança pessoal a Pinto da Costa, a Antero Henrique e às respetivas famílias.
O MP enfatiza na acusação da Operação Fénix que Edu, que gostava de apresentar-se como o “guarda-costas de Pinto da Costa”, era próximo de Antero Henrique, pois os serviços de proteção pessoal eram, de uma forma geral, combinados entre os dois. De forma presencial, pois Antero não gostava de falar ao telefone. Segundo o MP, o diretor-geral da SAD do Porto pagava os serviços de segurança pessoal de “forma encapotada”. Nas buscas à sua residência foram apreendidos cerca de 72 mil euros em numerário que estavam num cofre, afirmando os procuradores responsáveis pela acusação que esse montante destinava-se ao pagamento dos seguranças.
Os serviços de proteção pessoal a Pinto da Costa terão sido prestados nas suas deslocações a Lisboa para jogos com o Sporting e com o Benfica e para o Funchal para jogo com o Marítimo na época desportiva de 2014/2015, existindo também o acompanhamento de Fernanda Miranda, mulher do presidente do Porto, e a vigilância de casas de familiares de Jorge Nuno Pinto da Costa.
Outro serviço de proteção a Pinto da Costa ocorreu aquando de uma suspeita de assalto à casa da família do próprio presidente do Porto. Eduardo Silva foi chamado ao Estádio do Dragão, tendo saído para a habitação da família de Pinto da Costa acompanhado de outro funcionários da SPDE na esperança de apanhar o assaltante – o que veio a acontecer na presença da PSP. Pinto da Costa deslocou-se com Lourenço Pinto, advogado e ex-dirigente da arbitragem muito próximo do FC Porto e do seu presidente, para o local do assalto para perceber em pormenor o que teria acontecido.
Antero Henrique também foi alvo de proteção pessoal por parte de Eduardo Silva e dos seus funcionários. Um dos casos verificou-se no Estádio do Dragão a 18 de maio de 2015. Descontentes com a perda do campeonato para o Benfica pela segunda vez consecutiva, havia o receio que os adeptos do Porto fizessem ‘uma espera’ a Antero – responsável máximo pelo futebol da SAD do Porto e que cada vez mais desempenha o papel de presidente executivo do FC Porto. Devidamente protegido Eduardo Silva, Jorge Sousa, Nelson Matos e Hugo Cunha, Antero Henriques ficou salvaguardado face a possíveis desacatos.
Godinho Lopes com segurança por depor contra Sporting
Seguimos agora para Godinho Lopes. De acordo com a acusação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), liderado pelo procurador-geral adjunto Amadeu Guerra, Eduardo Silva terá determinado a 16 de junho de 2015 um serviço de proteção pessoal – vulgo guarda-costas – para o ex-presidente do Sporting Clube de Portugal. Tal serviço ter-lhe-á sido solicitado por Nuno Teixeira Cruz, alegando este amigo de Godinho Lopes que o ex-líder leonino estava a testemunhar contra o Sporting na Suíça, no âmbito do caso Doyen. Desde a derrota de Godinho Lopes nas eleições para a presidência da direção do Sporting que existia um clima de grande tensão entre a direção de Bruno Carvalho e o ex-presidente leonino.
Teixeira Cruz, segundo os procuradores João Centeno e Filomena Rosado (autores da acusação a que o Observador teve acesso), terá feito uma abordagem cautelosa, avisando desde logo que compreenderia caso Edu não quisesse ficar com o serviço devido à forte ligação ao FC Porto. O gestor da SPDE, contudo, desvalorizou essa questão, acrescentando que tinha 200 homens em Lisboa e, se fosse necessários, colocaria 150 à disposição daquele serviço em particular.
Certo é que, de acordo com a acusação, não foram os funcionários da SPDE que fizeram o serviço Godinho Lopes. Segundo a o MP, Edu terá contratado quatro seguranças através de um seu contacto em Lisboa que se apresentaram ao final do dia de 16 de junho no aeroporto da Portela, em Lisboa, para proteger Godinho Lopes de qualquer situação imprevista. Um desses seguranças ter-se-á abeirado do ex-líder leonino na porta de saída dos passageiros para informá-lo de que o tinham mandado ali para o proteger.
O facto de Godinho Lopes não ter participado na contração dos seguranças, e de não existir prova de que tenha tido conhecimento da mesma, foi essencial para não ser acusado.
Hulk de visita ao Porto e Fréchaut em Aveiro
O mesmo terá acontecido com Hulk, ex-estrela do FC Porto que foi transferido para a Rússia. De visita ao Porto em novembro de 2014, foi acompanhado por dois seguranças da SPDE por determinação de Eduardo Silva. Nelson Matos e Jorge Sousa, dois dos funcionários da SPDE que foram acusados na Operação Fénix, terão sido os guarda-costas contratados para acompanharem o agora jogador do Zenit durante a sua estadia no Porto.
O caso do Nuno Fréchaut é diferente. O ex-jogador do Braga e internacional A foi acusado de exercício ilícito da atividade de segurança privada por alegadamente ter solicitado serviços de segurança pessoal a Eduardo Silva no dia 19 de maio de 2015. Segundo a acusação, Fréchaut pretendia deslocar-se a Aveiro juntamente com Paulo Silva, irmão de Eduardo, para recolherem um cheque que teria sido emitido por Paulo. O ex-jogador pretendia a segurança de Nelson Matos, mas Eduardo disponibilizou também Hugo Cunha para realizar a proteção de Nuno Fréchaut e de de Paulo Silva no encontro que se verificou em Aveiro com indivíduos não identificados pelas autoridades.
Cobrança de dividas de transferências de futebol
Além dos serviços de segurança pessoal, os procuradores João Centeno e Filomena Rosado visaram na acusação serviços de cobrança de dividas através de violência física e de coação que são igualmente imputadas a Eduardo Silva e a outros funcionários da SPDE por parte do MP.
Uma dessas situações está ligada a uma transferência de um jogador não identificado para o Sporting Clube de Braga mas sobre a qual não recai qualquer suspeita de envolvimento direto de Eduardo Silva. Francisco Cruz e e Manuel Miguel, homens de confiança de Edu, são os visados pelo MP.
De acordo com a acusação, Cruz e Miguel terão sido contratados por José Carlos Reis (apresentado pelo MP como ‘olheiro’, isto é, caça-talentos do clube) para pressionarem Nelson Almeida, empresário de futebol, a pagar uma alegada dívida de 25 mil euros O pagamento dos serviços dos seguranças seria feito em dois tempos: mil euros para fazer o serviço e 25% da dívida depois de Almeida pagar.
Francisco Cruz e Manuel Miguel, diz o MP, terão feito de manobras de vigilância, perseguição e pressão junto de Nelson Almeida durante dois a três dias, entre o final de julho e início de agosto de 2014 que surtiram efeito: o empresário de futebol acabou por entregar dois cheques de 10 mil euros e um de 5 mil euros para saldar a alegada dívida.
Desavenças nas camadas jovens do Boavista
O último caso de futebol relatado na acusação prende-se com a proteção de um menor que jogava nas camadas jovens do Boavista. Segundo Maria Helena Couto e Mário Jorge Couto, o seu filho teria sido roubado por colegas que lhe ficaram com o seu telemóvel. Assim, e com o alegado objetivo de intimidarem os colegas, terão recorrido a Eduardo Silva para contratar um segurança que acompanhasse o jovem jogador no trajeto entre a escola e o Estádio do Bessa e ficasse com ele até ao final do treino.
O objetivo, segundo o MP, era mostrar os seguranças para que os colegas do filho de Maria e de Mário passassem a temê-lo. Além do próprio Eduardo Silva, também Nelson Matos, Jorge Sousa, Hugo Cunha e Francisco Cruz deslocaram-se ao Estádio do Bessa. Não é claro na acusação a razão para a presença de todos estes funcionários da SPDE naquele local.
Eduardo Silva, Maria e Mário Couto foram acusados do exercício ilícito da atividade de segurança privada.