Há um antes e um depois nesta notícia. O antes, que foi escrito durante os minutos em que Paulo Gonçalves esteve fora do Dakar, e o depois, quando o português voltou a estar dentro do rali.
O antes:
O radiador é a peça do motor responsável por não o deixar aquecer em demasia. É ele que armazena água e se encarrega de refrigerar as coisas. Se algo de mau aparece — um cabo romper-se, o radiador ficar sem água ou o depósito ter uma fuga — o motor entra em sobreaquecimento, deita fumo e acaba por parar. É um berbicacho que pode afetar qualquer veículo no dia-a-dia e que tinha logo de acontecer à Honda de Paulo Gonçalves, esta terça-feira. O radiador da mota do português rompeu-se e o piloto teve que abandonar o Dakar a meio da nona etapa do rali.
E a culpa foi de um pau. Sim, de um pau vindo de um arbusto que furou o radiador e o obrigou a percorrer vários quilómetros sem refrigeração na mota, até chegar ao segundo ponto de cronometragem de tempos (CP2). Foi aí, perto de Belén, na Argentina, que Paulo Gonçalves tentou resolver os problemas mecânicos da mota. Já era tarde demais. “Um arbusto entrou no radiador da sua mota e partiu-o. Toda a água saiu e poucos quilómetros depois o Paulo teve de parar com o motor partido”, escreveu Martino Bianchi, diretor da Honda, equipa em que o piloto de Esposende era chefe de fila.
E o depois:
Mas, afinal, Paulo Gonçalves não vai abandonar o Dakar, já que a organização do rali decidiu suspender a nona etapa por motivos de segurança, até ao segundo ponto de cronometragem. Logo, e como o português conseguiu chegar à CP2 com a ajuda de Paolo Ceci, companheiro de equipa, tem hipóteses de retomar a corrida na quarta-feira. “Vai reparar hoje a mota para poder começar amanhã [quarta-feira]”, escreveu a Honda, no Twitter. E o português bem pode agradecer a ajudinha do clima.
Latest news: today's stage is stoped at CP 2.Paulo Goncalves managed to arrive at CP 2 so there are some chance that he...
Posted by Martino Bianchi on Tuesday, 12 January 2016
(mensagem publicado por Martino Bianchi, diretor de equipa da Honda, no Facebook.)
A etapa desta terça-feira teve um “grande calor” e estava repleta de dunas, o que provocou problemas num “grande número de competidores, especialmente nas motos”, como escreveu a organização, no site da prova. “Esperava-se que a fisionomia da etapa de hoje apresentasse grandes dificuldades. Perante a situação, a direção da prova tomou a decisão que devia e, com o objetivo de garantir a segurança máxima dos pilotos, a corrida
A sabedoria popular diz que a sorte protege os audazes e, se calhar, também toma conta dos solidários. Paulo Gonçalves foi isso e muito mais quando, aos 15 quilómetros da sétima etapa, viu Mathias Walkner caído na areia, a uns metros da sua mota. O campeão mundial de Todo o Terreno sofrera uma queda há minutos que lhe partira fémur de uma das pernas.
O piloto português será rebocado até ao acampamento em Belén, sendo esta uma etapa maratona, sem assistência mecânica, irá reparar a sua Honda CRF 450 Rally com recurso ao apoio dos seus “aguadeiros” Paolo Ceci e Michael Metge, ambos pilotos da equipa oficial HRC, para amanhã poder continuar em prova” — comunicado da assessoria do piloto.
O português parou de imediato, saltou a correr da mota e auxiliou o austríaco, permanecendo com ele durante cerca de 10 minutos, tantos quanto o companheiro de equipa de Walkner tardou a aparecer. “Tive de parar para lhe dar assistência, fiquei lá até chegar o Quintanilla, estive lá bastante tempo mas depois regressei à corrida. Não sou um herói, sou um ser humano com respeito pelos outros. Fiz aquilo que me competia, ao contrário, acredito que fizessem o mesmo por mim“, escreveu, após a etapa, no Facebook.
https://www.youtube.com/watch?v=Aj5icxINOKw
A organização reconheceu a boa vontade e o desportivismo do português. Ao invés de terminar fora dos 30 mais rápidos da etapa, Paulo Gonçalves faria o terceiro melhor tempo do dia, após o Dakar lhe retirar os cerca de 10 minutos que passara a ajudar Mathias Walkner. Assim, o piloto da Honda continuava na liderança da prova.
Já o era desde a quarta etapa e continuou a sê-lo até ao final da oitava — outro troço em que o azar resolveu pregar-lhe outra partida. Numa etapa cheia de zonas com dunas e areia, o português resolveu fazer grande parte dos 766 quilómetros fora de pista (área recomendada pela organização para os pilotos percorrerem) e, quando ia a abrir, acabou por sofrer um acidente dos valentes. “Tive uma queda bastante forte a meio da ‘especial’, numa zona fora de pista, uma zona bastante ondulada e rápida. Tive alguma sorte em não me ter magoado”, confessou.
Ao azar desta queda seguiu-se a história do pau e do radiador que afetou o português nesta terça-feira. Mas a sorte ganhou ao azar quando a organização do Dakar decidiu suspender a nona etapa até ao CP2. E sorte teve Paulo Gonçalves, por conseguir chegar ao segundo ponto de contagem de tempos com a ajuda de um companheiro de equipa. Agora terá a noite para reparar o radiador da sua Honda para, na quarta-feira, retomar a participação no rali. Ufa, foi por pouco.