Não é por serem tramados de realizar que os milagres, às vezes, não aparecem. É mais por falta de tempo. É difícil estar a uma quarta-feira com o corpo enfiado num fato, gravata a apertar o pescoço, sorriso automático na cara, a dizer olá ao clube e a ser apresentado como o novo treinador quando já se está a pensar o que fazer no dia seguinte. José Peseiro sabia que só teria quinta, sexta e sábado para mostrar à equipa a forma com a queria ver a jogar à bola no domingo. Seriam, no máximo, seis horas a dar ideias, explicá-las e pedir coisas para que a hora e meia que aí vinha contra o Marítimo acabasse como o treinador queria: com três pontos. Mas “também não se pode pedir muito sem treinar”.

O jogador é uma criatura de hábitos e milagre seria vê-lo a perdê-los em três treinos. Os quilos de músculo encavalitados em pés de lã de Danilo perdiam bolas à entrada da área que nunca se costumam arriscar a perder. Os passes curtos e rasteiros em que o mexicano das orelhas para fora pouco se engana eram uma fonte de assobios para Herrera. Os cruzamentos do lateral com pé contrário ao lado em que joga eram algo que Layún não conseguia fazer. O “fundamental” para José Peseiro era que os jogadores “acreditassem” que “se estavam aqui, é porque são bons”. Mas estavam a ser piores que o costume e as poucas coisas em que o treinador pôde mexer não ajudaram.

O 4-3-3 de Lopetegui passou ao 4-2-3-1 com que Peseiro colou Herrera a Danilo e deixou André André ser o médio que ajudava os extremos e o avançado. Corona e Brahimi deixaram de ter que estar colados às linhas e iam, os dois ao mesmo tempo, pedir a bola ao centro a cada ataque para vagar metros que convidasse Maxi e Layún a terem espaço livre. Depois terá dito a todos para não arriscarem tanto como o faziam e isto deu segundos preciosos para que o Marítimo pudesse pressionar os dragões lá à frente, perto da área. O FC Porto estava incómodo, via-se, e nem o golo a triplas entre a canhota de André André, a barra da baliza de Salin e as costas do guarda-redes francês deram lhe deram comodidade.

A bola que Dyego Souza cabeceia à barra, quatro minutos depois, seria como a mola espetada nas costas do sofá que desconvida a muitas mexidas. Os dragões arriscaram ainda menos, guardavam-se para ataques rápidos, “contras” em que juntasse os laterais aos extremos. Em três deles, a bola e Maxi Pereira encontraram-se para o uruguaio cair na área, gritar-se penálti e não se ouvir qualquer apito. Pelo meio viam-se mais passes para o lado e para trás que o habitual, muitos, que deixaram o Marítimo encher-se com a confiança de quem deve continuar a fazer o mesmo. O intervalo não mudou os madeirenses, embora servisse para tentar alterar os dragões.

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Porto's Mexican forward Jesus Corona gestures after missing a chance to score a goal during the Portuguese league football match FC Porto vs CS Maritimo at the Dragao stadium in Porto on January 24, 2016. AFP PHOTO / MIGUEL RIOPA / AFP / MIGUEL RIOPA (Photo credit should read MIGUEL RIOPA/AFP/Getty Images)

Foto: MIGUEL RIOPA/AFP/Getty Images

A equipa passou mais três minutos no balneário a ouvir José Peseiro do que os adversário estiveram a escutar Nelo Vingada. O treinador tanta coisa disse que os jogadores regressaram cautelosos, a abrandar o que antes aceleravam, a tocar para o lado bolas em que iam procurar um toca-e-vai para a frente. Aboubakar não tocava na bola e Brahimi via pouco dela. Jesús Corona dizia-lhe olá mais por correr atrás dela depois de os centrais ou Danilo a passarem pelo ar. Era uma equipa a espreitar a defesa subida de outro e o que surpreendia era o FC Porto ficar com o papel de bisbilhoteiro. Só assim, com o extremo mexicano a correr atrás de um passe longo para o espaço, é que tentou, com o pé esquerdo, rematar em jeito para Salin provar o jeito que tem para paradas difíceis. Foi a única chance para os dragões fazerem golo. Foi aos 72’.

O que se viu antes, a espaços, passou a ver-se muito, depois: os madeirenses com mais bola, a montarem jogadas ao primeiro toque, a respeitarem quem estava de frente para o jogo, a tentarem fazer rápido as coisas simples. Levavam quase todos os ataques até à área dos dragões e não acertavam com remates na baliza pela mesma razão que há uns jogadores para jogarem no Marítimo e outros no FC Porto: qualidade. Dyego Souza não arranjavam maneira de finalizar jogadas e os remates de Fernando Ferreira e Éber Bessa nunca fizeram com que Casillas sujasse o equipamento. Maxi Pereira dizia no fim que “aos poucos”, os jogadores terão de “ir percebendo o que o treinador quer”. Porque ainda não houve tempo para entenderem e, também, por não terem mostrado que perceberam o pouco que Peseiro lhes terá já pedido.

A partida acabou com uma equipa a apertar, roubar bolas perto de área alheia e tirar o oxigénio à outra. O problema para José Peseiro é que foram os dragões a terminarem sem ar, na próxima casa. “Com certeza vamos jogar muito mais do que jogámos hoje. Esta equipa vai render mais, quer individual quer coletivamente”, garantiu o treinador, no final. Disse que não ter dúvidas disso. “Acredito que, jogando bem, estaremos mais próximos de vencer”, disse, também. Talvez. Mas a jogar assim-assim, não.