Diziam os outros e dizia o músico de si próprio: Nana Vasconcelos era o Brasil. Representava um país inteiro através da música, através da relação instintiva que tinha com a percussão. Sabia os ritmos e os tempos de cada canto do país e levava-os a todo o mundo, através do trabalho que assinava em nome próprio mas também graças às colaborações que mantinha com músicos de diferentes latitudes. Iniciou o tratamento contra o cancro no pulmão no ano passado. Morreu esta quarta-feira, aos 71 anos.

Música brasileira, jazz, world music e outros rótulos do mesmo género. Com os artistas certos as etiquetas conseguem confundir-se todas. Naná era um dos raros habilidosos que lá conseguem chegar, que misturava um amor intenso pela tradição como uma necessidade descontrolada de querer e ter de ser pioneiro. Essa exigência refletia-se depois nos títulos e nas distinções. Foi considerado várias vezes o melhor percussionista do mundo, honra que Vasconcelos haveria de acolher com um sorriso em jeito de “deixa para lá”, que haveria sempre coisas mais importantes a tratar.

Nasceu no Recife em 1944 e fez o que tinha a fazer, como todos os garotos: meteu-se na música porque não tinha por onde escapar. Canções e bailes de rua, o normal para um país que não sabe fazer a coisa de outra maneira. Depois há os que levam o negócio a mais a sério. Naná foi um deles. Nos anos 60 já estava em palco ou no estúdio com gente como Gilberto Gil ou Gal Costa. Depois mudava-se para o Rio de Janeiro e mudava também os horizontes e os objetivos.

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Houve São Paulo pelo caminho e era difícil que não se tivesse tornado em símbolo de uma criatividade cosmopolita. Criou o Trio do Bagaço, com Nélson Angelo e Maurício Maestro, ao mesmo tempo que o mundo se apercebia do inacabável potencial artístico que Naná Vasconcelos guardava. Não havia outro assim, que fosse do berimbau aos tambores, passando pelo canto meio encantado. Daí que gente como Miles Davis, Paul Simon ou os Talking Heads o quisessem nas suas fichas técnicas ou nos seus concertos, numa troca permanente de inspiração, como aconteceu também com músicos portugueses como Sara Tavares ou Carminho.