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Comida tradicional com cerveja artesanal: guia para um casamento feliz

Este artigo tem mais de 5 anos

Há cada vez mais cerveja artesanal nos frigoríficos e torneiras deste país. Mas qual será a melhor forma de a casar com clássicos como o cozido, a cabidela ou a francesinha? Um especialista responde.

Cada uma destas cervejas casa na perfeição com um prato de cozinha tradicional portuguesa.
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Cada uma destas cervejas casa na perfeição com um prato de cozinha tradicional portuguesa.

© Tiago Pais / Observador

Cada uma destas cervejas casa na perfeição com um prato de cozinha tradicional portuguesa.

© Tiago Pais / Observador

Em 1998, seria difícil manter uma conversa sobre cerveja em Portugal que fosse para lá da questão do costume: “Sagres ou Super Bock?”. Mas foi nesse ano que Bruno Aquino se começou a interessar pelo tema, depois de, como conta, “ter estado na Bélgica durante algum tempo”. A variedade encontrada por aquelas terras levou-o a querer “conhecer a cerveja em todos os seus detalhes”.

E fez por isso: tirou um curso de Análise Sensorial na Universidade Católica de Leuven, na Bélgica, criou a página e fórum Cervejas do Mundo, organizou concursos de produção artesanal de cerveja, colaborou com restaurantes na elaboração de cartas de cerveja e começou a dar, com alguma frequência, workshops e palestras na matéria. Tudo somado, além de ser uma das poucas pessoas em Portugal que ostenta o estatuto de beer sommelier, tornou-se uma referência neste movimento — isto apesar de, como ressalva, “não trabalhar na área cervejeira”.

Para ele, não há dúvida que o casamento entre a cozinha portuguesa e a cerveja artesanal não só é possível como pode ser feliz. O Observador desafiou-o a combinar seis pratos e uma sobremesa típica com cervejas artesanais, para ajudar a desfazer o mito de que a cozinha portuguesa só vai bem com vinho. Eis as suas sugestões, com os devidos comentários por baixo:

(nota: quem queira fazer da arte de harmonizar comida e cerveja profissão atente ao 1º Curso Internacional de Beer Sommelier de Portugal, a ser ministrado na Zymology entre 30 de maio e 4 de junho e entre 6 e 10 de junho. A análise sensorial vai ocupar a maior parte das cerca de 100 horas do curso. Ao todo, vão ser provadas mais de 100 marcas de cerveja. O valor de inscrição é de 2950€ (impostos não incluídos) e o prazo máximo de inscrição 30 de março.)

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Cozido à Portuguesa

Estilo aconselhado: Abbey Tripel ou Saison
Exemplos de cervejas: Toira Oiro, Burguesa Tripel, Dois Corvos Saison

“O típico cozido à portuguesa resulta de uma combinação muito diversa de ingredientes, desde couves a batatas, passando por carne e enchidos, a arroz e feijão. Tal variedade possibilita várias combinações, sugerindo-se assim dois estilos tipicamente belgas: uma Tripel ou uma Saison. São cervejas bem carbonatadas e não muito doces. No caso da Saison pode surgir alguma acidez, que ajuda a cortar a riqueza do cozido. São dois estilos muito versáteis: ligeiras notas a especiarias, boa base de malte e uma carbonatação que facilita na limpeza do palato.”

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A Ouro é a Belgian Tripel da cervejria Toira, produzida na Anadia. É uma das sugestões de Bruno Aquino para acompanhar um cozido à portuguesa. (© Divulgação)

Bacalhau com Grão

Estilo aconselhado: Blond/Golden Ale
Exemplos de cervejas: Barona Blonde Ale, Bolina Blonde Ale, Against The Tide Just An Ale

“As Blond Ale são cervejas que proporcionam um perfil bastante límpido quando em comparação a outros estilos. Perfeitamente adequadas, portanto, a um prato como o bacalhau cozido com grão, que apesar do seu carácter não é uma receita excessivamente intensa. Aqui procura-se equilibrar o salgado do bacalhau, escolhendo uma cerveja com um amargor médio e final algo seco, notas ligeiramente frutadas e corpo leve a médio. Neste caso o bacalhau terá os seus momentos de brilho intercalados com os da cerveja.”

Arroz de Cabidela

Estilo aconselhado: Amber/Brown Ale
Exemplos de cervejas: OPO 74 Red Mosquito, D’os Diabos Brown Ale, Aroeira Taborda

“Prato rico, caldoso, com um toque mineral e a vinagre, requer uma cerveja que acompanhe bem a intensidade dos sabores sem que todavia entrem em confronto ou se sobreponham. As Amber e Brown Ales têm um perfil a lúpulo pouco intenso, com notas a caramelo, amêndoas e ligeiro torrado e uma carbonatação tendencialmente baixa. Têm um caráter algo licoroso que liga muito bem com a carne e com o molho voluptuoso deste prato.”

Aroeira Taborda

Chegou a Taborda. É uma brown ale, daquelas castanhas. É forte, ao nível de uma dupla patada do Tarzan. É daquelas gostosas que gingam o corpo maltado goela abaixo. É daquelas difíceis de engolir com a boca fechada (tarefa difícil, tal o espanto). Até fizemos um vídeo e tudo

Posted by Cerveja Aroeira on Wednesday, 9 December 2015

Francesinha

Estilo aconselhado: India Pale Ale
Exemplos de cervejas: Passarola IPA, Oitava Colina Urraca Vendaval, Amnesia Rage IPA

“A francesinha é um prato que pede (perdão, grita!) por cerveja. O molho das ditas, muitas vezes elaborado com cerveja, harmoniza na perfeição com uma gama muito variada de estilos, ainda que a nossa opção tenha recaído nas muito na moda India Pale Ale.

Nesta situação, podem-se de facto aplicar os três parâmetros base da harmonização:

  • por semelhança: que se baseia na combinação entre cervejas e pratos com elementos comuns, por exemplo, uma cerveja mais ácida com um prato ácido, realçando o sabor de ambos;
  • por contraste: baseia-se na combinação entre cervejas e pratos que tenham elementos que contrastem entre si, como amargor e doçura ou robustez e leveza;
  • por corte: há uma quebra drástica em algum elemento do prato harmonizado, nomeadamente quando o amargor e a carbonatação ajudam a limpar a gordura presente no palato.

Uma IPA consegue, na verdade, tudo isto quando combinada com uma francesinha: temos a semelhança por haver um elemento em comum, neste caso a cerveja; contraste, pois o amargor da IPA combate alguma doçura e o picante do molho; corte, pois a boa carbonatação e o amargor do lúpulo ajudam a limpar a gordura e o palato. É, portanto, uma combinação irresistível!”

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A IPA da Passarola é boa para acompanhar comida gordurosa e picante, como uma francesinha. (foto: © Divulgação)

Carne de Porco à Alentejana

Estilo aconselhado: American Pale Ale
Exemplos de cervejas: Mean Sardine Amura, Gíria American Pale Ale, Vadia Orgânica

“As American Pale Ale são versões mais musculadas das clássicas Pale Ale inglesas, sendo tendencialmente mais encorpadas, com maior amargor e teor alcoólico. Para serem American é também usual serem produzidas com lúpulos norte-americanos. São cervejas bastante refrescantes, com aromas cítricos, resinosos ou herbais e bom amargor quer no nariz, quer na boca, o que ajuda a combater a gordura por vezes excessiva de um prato como a carne de porco à alentejana, para além de equilibrar o salgado do próprio prato.”

Sardinhas assadas

Estilo aconselhado: Bohemian Pilsner
Exemplos de cervejas: Vitoria Pilsner, Maldita Pilsner, Letra B Pilsner

“As Pilsner da Boémia têm um perfil aromático muito rico, sendo cervejas refrescantes e com um bom equilíbrio entre o malte e o amargor do lúpulo, inclusivamente no retrogosto. Com boa carbonatação e corpo leve, são indicadas para pratos também eles com sabores delicados como marisco ou peixe grelhado. Apesar das sardinhas serem um peixe gordo e com um sabor bem mais intenso do que muitas outras espécies de peixes da nossa costa, este estilo de cerveja, tendo um amargor proeminente mas não agressivo, que rapidamente desaparece, facilita a limpeza da gordura e do sabor do nosso palato, permitindo que cada nova garfada funcione quase como se fosse a primeira.”

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A B é a Pilsner da Letra, cerveja artesanal minhota, de Vila Verde.
(foto: © Luís Lobato)

Arroz Doce

Estilo aconselhado: Stout/Imperial Stout
Exemplos de cervejas: Imperial Stout by Pedro Sousa, Amphora Centvrivm, Rapada Dry Stout

“Nesta harmonização procura-se uma vez mais criar o efeito de contraste, valorizando os sabores e aromas da cerveja e do prato através das características intrínsecas de ambos. Utilizemos pois o clássico arroz doce emparelhado com uma Stout ou uma Imperial Stout, cervejas bem encorpadas, com notas de malte torrado, café, chocolate negro e frutos secos, como passas ou figos. Estas cervejas têm uma característica adicional, que é o de terem algum amargor fruto da torrefação do cereal, o que permite contrastar muito bem com a doçura do arroz. Uma ótima maneira de terminar uma refeição bem portuguesa!”

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