Este sábado António Costa será — sem história — reeleito líder do PS, nas diretas do partido em que também concorre Daniel Adrião. O challenger sabe que não ganha, mas também não era esse o objetivo deste candidato a secretário-geral. Dizer que é um desafiador da atual liderança é excessivo, é o próprio que o assume, enquanto se descreve como um militante com 30 anos de partido, mas ao mesmo tempo “um outsider” que pretende apenas dar “um contributo de cidadania”.

Daniel Adrião tem 48 anos, inscreveu-se no PS aos 15 em Alcobaça, mas tem percurso político quase incógnito. De relevante, a este nível, só mesmo duas candidaturas à liderança da Juventude Socialista, primeiro contra António José Seguro, depois contra Sérgio Sousa Pinto. Também não as ganhou. Hoje está à frente de um movimento de cidadãos dentro do PS que quis avançar com uma moção de estratégia global. “Nem sequer ponderámos apresentar uma moção setorial porque nem sequer são discutidas nos congresso, sendo remetidas para a Comissão Nacional”. A consequência é que, para apresentar uma moção de estratégia, tem de avançar com uma candidatura à liderança. Assim foi.

O objetivo de Daniel Adrião:

Candidato-me à liderança, mas por imposição regulamentar”.

Com esta frase o socialista retira-se do confronto direto com o atual líder, que se prepara para vencer as diretas do partido com uma votação expressiva. Aliás, o único desafiador de António Costa diz que o seu objetivo é defender “uma revolução democrática. Entendemos que é preciso uma profunda alteração do sistema político, quer ao nível dos partidos, quer ao nível da representação”. A moção que leva ao congresso, “Resgatar a democracia”, defende a mudança das regras de eleição dos deputados, através da criação de círculos uninominais (de onde sairiam 130 deputados), compensados com círculos nacionais (para eleger 100 deputados, em vez da totalidade, como acontece agora). Mas também tem alterações para dentro do partido: instituir as eleições primárias abertas as simpatizantes, não só para as lideranças do partido, mas também para a escolha de candidatos a deputados e a presidentes de câmara.

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A ideia desta candidatura é sobretudo aproveitar o momento para recolocar um debate que tem barbas na política nacional, mas que nunca conheceu qualquer evolução, acabando sempre por bater na barra de uma qualquer liderança dos dois maiores partidos, à esquerda ou à direita. E os argumentos para isso são vários, com o socialista a chegar mesmo a dizer que “há uma relação direta entre o défice de participação democrática e o aumento das desigualdades e da pobreza”. É por isso que assume agora o papel de “ajudar António Costa” a voltar a este debate, “criando uma forte corrente de opinião dentro do PS”.

Mas há críticas ao atual líder?

António Costa terá enfrentado muitas resistências relativamente a estas alterações. Não tem só a ver com a geringonça, mas com o próprio aparelhismo dentro do PS, o situacionismo interno que tem horror à mudança.”

Há críticas, até porque Costa deixou cair a reforma do sistema eleitoral do seu programa depois da negociação com o PCP, BE e PEV. Os partidos mais pequenos sempre resistiram a estas mudanças, temendo que com ela perdessem representatividade. “O PSD era contra passou a ser a favor, o PS era a favor passou a ser contra”, critica o candidato. Costa ficou refém dos partidos à esquerda do PS? “Não tem só a ver com a geringonça, mas com o próprio aparelhismo dentro do PS”. A questão, garante, “assusta quem detém o poder porque abre o processo de decisão que deixaria de ser controlado”.

Mas também há outro tipo de críticas, nomeadamente sobre a governação. Ainda que aprove a aproximação à esquerda que o PS fez, Adrião acha insuficiente a atitude que António Costa tem na Europa. “Como primeiro-ministro de um governo de esquerda, António Costa é o líder socialista que está em melhores condições de liderar um movimento de mudança entre os socialistas europeus que têm seguido o pensamento único, o consenso de Bruxelas”, diz, referindo-se às políticas de austeridade. E aí este socialista pede “mudanças de fundo” no tratado orçamental e uma “renegociação profunda da dívida”.

Quem é que está com ele?

Este é um movimento de cidadania, não tem notáveis. Não é um movimento de popstars

Nas últimas semanas, Daniel Adrião percorreu cerca de metade das federações distritais do PS para apresentar a moção que leva ao congresso de Lisboa, dias 3, 4 e 5 de junho e admite que “a mobilização não tem sido muito grande”. Ou seja, este grupo não tem expressão relevante dentro do partido, não é uma ala crítica ou opositora da atual liderança. “Não é um movimento crítico, mas de massa crítica”, determina o socialista que tem representado este grupo de cidadãos no PS mas que não tem ambição de ir além disto: “O cargo mais importante da democracia é o de cidadão e é esse que quero exercer”.