47 mil pessoas passaram este domingo pelo Parque da Bela Vista, no último dia do Rock in Rio Lisboa. Parece (e é) muita gente, mas foi pouco mais de metade em relação ao dia anterior, talvez à custa do cancelamento do espetáculo de uma das estrelas do cartaz, a jovem Ariana Grande – mais um desaire a juntar à frustração que foi a semi-atuação dos Korn na sexta-feira e, verdade seja dita, ao cartaz que foi globalmente fraco. Ainda assim, houve momentos de festa rija, também neste último dia.
Avicii
O sueco de 26 anos trouxe uma explosão de eletrónica ao festival do rock e não desiludiu. O DJ anunciou numa carta aos fãs que se vai retirar no fim do ano e a presença na Bela Vista pode ter sido a última em Portugal. Se assim foi, entra para a história como um set memorável.
Tim Bergling (o nome de batismo de Avicii) começou a carreira em 2007 e lançou o primeiro hit de sucesso em 2010, “Seek Bromance”. Ao Rock in Rio trouxe um alinhamento de êxitos, uma mistura dos álbuns True (2013) e Stories (2015) com remisturas feitas no momento, como se quer. O público, com muitos jovens acompanhados pelos pais, saltou, dançou, gingou e aproveitou ao máximo o “boom” de luz e cor.
Avicii na cabine-trono instalada no centro do Palco Mundo transformou o recinto numa gigante pista de dança a céu aberto. O DJ só precisava de levantar o braço dos pratos de quando em vez e a multidão respondia a levantar os pés do chão.
Houve tempo para efeitos lúdicos, cut-ups (rearranjos) e até um cheirinho de disco, filtrado com muita pop, o sueco não fugiu à sua fórmula de sucesso. Trouxe efeitos visuais incríveis para juntar à festa e garantir o transe através da alucinação visual e sonora.
O momento alto aconteceu quando o êxito “Wake me Up” saiu dos pratos e ecoou pelo recinto, provocando a convulsão coletiva. Já estávamos no encore e dali a pouco era o fim. E que fim: Avicii agradeceu “um dos melhores espetáculos de sempre”. E relembramos que está quase na “reforma”. Na despedida houve fogo-de-artifício, adeus até 2018. Será que Avicii regressa? O público não se importava nada de repetir a dose.
Ivete Sangalo
“E sempre que o Rock in Rio quiser, o trunfo Ivete está lá para singrar”, escrevemos ontem no resumo do quarto dia e não poderíamos estar mais certos. Ariana Grande cancelou o concerto no Rock in Rio por motivos de saúde e a organização do festival foi ao camarim da cantora brasileira pedir um segundo concerto no Parque da Bela Vista. Escusado será dizer que a resposta foi positiva.
Em menos de 24 horas, Ivete Sangalo voltou a pisar o Palco Mundo com a mesma energia do primeiro dia. “Boa noite meus amores”, cumprimentou a plateia depois de abrir o concerto com “Tempo de Alegria”. “Não estava previsto estar aqui hoje mas qualquer dia que Portugal me chamar eu estarei aqui.” Seguiram-se hinos de sucesso como “Arerê” e “Eva” que deixaram a audiência no relvado a pular, cantar e sambar.
Mas o furacão que é Ivete Sangalo não ficou por aqui. Como uma boa profissional, a artista entregou-se ao público sem o ressentimento de ser uma “segunda escolha” e prometeu repetir a dose do dia anterior — desde que o público a ajudasse a cantar. “Obrigada por me receberem com um sorriso enorme”, agradeceu. “Quero ver essa energia.” E assim foi. As covers “Could you be loved” e “Nossa gente (avisa lá)” deixaram os fãs a bater palmas com um sorriso de orelha a orelha
Desta vez sem chuva, Ivete atuou pela oitava vez no Rock in Rio com mínimas alterações no alinhamento. A voz, essa, continua no auge dos seus 20 anos em solo português. Voltaram a faltar baladas como “Se eu te amasse tanto assim” e “Quando a chuva passar” mas o público não se importou. “Que delícia”, desabafou. “Delícia é você”, respondeu um fã no relvado. Subir pela segunda vez ao Palco Mundo em tão pouco tempo exige coragem e Ivete Sangalo superou o desafio.
Charlie Puth
O norte-americano Charlie Puth entrou em palco com um sorriso rasgado. Levantou o braço, disse adeus e sentou-se ao piano. “Olá”, disse, e o público retribuiu-lhe em uníssono. Entre gritos e aplausos, começou com “Marvin Gaye”, seguindo para “Dangerously”. “Façam barulho!”, gritou, acrescentando que era um prazer estar alí. “É uma loucura!”
E era. O público gritava cada vez mais alto, ao mesmo tempo que seguia em coro todas as músicas. “Escrevi esta música há dois anos no meu quarto”, contou o compositor, referindo-se a “Some Type of Love”. “E agora estou a toca-la em frente a 30 mil pessoas”. Charlie Puth podia estar incrédulo, mas o público estava para lá de emocionado. Em frente ao palco, muitas fãs levavam as mãos à cabeça com as lágrimas nos olhos.
A “Some Type of Love”, seguiu-se outra música “gravada no quarto”. “Há um ano estava num apartamento a fazer música e, um ano depois, estou a fazer isto”, admitiu Puth. É uma vida incrível, mas os paparazzi não o largam. E, por isso, o cantor norte-americano dedicou-lhes uma música — “Losing My Mind”, escrita num dos muitos momentos em que perde a cabeça por causa disso. “Cantem se souberem”, pediu. “É sobre a minha ansiedade.”
Em “My Gospel”, Puth deu tudo no piano, e chegou mesmo a tocar de pé. As fãs, perto do palco, com bandeiras e a voz afinada, gritavam o seu nome — “Charlie! Charlie! Charlie!”. O cantor não conseguiu deixar de sorrir, e aproveitou para atirar elogios à audiência. “Vocês são tão queridas e tão sexy! Vou morrer!”, disse, derretendo o coração das milhares de fãs no recinto.
Depois dos temas rápidos, veio a balada — “Up All Night”, escrita quando uma rapariga lhe partiu o coração. Antes de “One Call Away”, pediu uma salva de palmas para Ariana Grande que, por motivos de saúde, se viu obrigada a cancelar o concerto de domingo no Rock in Rio. A cantora era uma das mais aguardadas do dia. “Ela está doente e não pode vir. Ela sente-se péssima. Digam uma oração por ela”, pediu.
O concerto estava no fim, mas os fãs não queriam deixar Charlie Puth ir embora. “Querem mais uma? Temos tempo para mais uma!”, exclamou, explicando que tinha escrito a música seguinte “em dez minutos” e que isso tinha mudado a sua vida. Entre o público, já se ouvia as palavras “See You Again”, e os primeiros acordes do piano confirmaram a expectativa. O tema que tornou famoso Charlie Puth foi uma bela despedida, num concerto que encheu as medidas das centenas de jovens que aterraram na Bela Vista para o ver.
Em resposta às palmas e aos gritos, Puth chegou-se à frente com o resto da banda para agradecer. Fez uma vénia, tirou uma fotografia, e saiu a correr do palco. Os fãs ficaram tristes por ver o ídolo ir embora, mas não perderam mais tempo e seguiram caminho. “Vamos jantar”, ouvia-se entre a multidão.
Hinds
São quatro miúdas giras de Madrid com muita pinta e boa energia. Ao fim da primeira canção lançaram um grande “Qué pasa Portugaaaal?”. No pasa nada, respondemos nós. Fazem um rock de garagem arranhado e despretensioso que, não fugindo à origem, tem-se vindo a aprimorar.
Eram por isso uma grande aposta do Palco Vodafone e fazia todo o sentido tê-las a encerrar o último dia de festival. Subiram ao palco com muita energia, simpatia e generosidade. Deram um bom concerto, mas não encheram as medidas. Ao fim de algumas canções, já tudo soava a mais do mesmo.
B Fachada
No dia em que reinava a pop, a irreverência de B Fachada podia não encaixar bem. Mas resultou muito melhor do que se previa. O público aderiu em grande a um concerto que deu a conhecer o melhor de B Fachada, que entrou em palco muito bem-disposto.
Sem papas na língua, não poupou críticas a ninguém, mas sempre com graça que não o deixa ficar mal. Pelo alinhamento passaram canções da larga discografia do cantor, com predominância do álbum homónimo lançado em 2014.
Bernardo Fachada sobreviveu a um público que não é o seu e até a uma falha de energia em palco, que só veio mostrar que quem tem mestria suficiente, não precisa de eletricidade. A falha foi resolvida prontamente, mas antes disso, B Fachada não deixou que lhe cortassem o pio e cantou a cappella.”Isto está quase tão bom como Capitão Fausto”, disse o músico em jeito de provocação. Foi bem melhor, garantimos nós.
Isaura
Isaura Santos foi a artista portuguesa que abriu o Palco Vodafone neste último dia de festival. A cantora atua geralmente sozinha, mas este domingo fez-se acompanhar por uma banda que a ajudou a construir os ritmos e harmonias que servem de apoio à sua (grande) voz. A pop eletrónica foi uma boa aposta num dia que apelava a um público mais jovem. A desilusão pelo cancelamento de Ariana Grande não pareceu afetar muito a audiência, que se mostrou animada e muito recetiva à música ainda relativamente desconhecida de Isaura – com exceção do single “Change It”.
Pelo alinhamento passaram outros temas do seu EP de estreia, Serendipity, mas houve também espaço para apresentar música nova, como “8”, que interpretou duas vezes e encerrou o concerto. Pelo caminho, passou também por um cover de “Talking Bodies”, de Tove Lo.
Foi um concerto com muita energia por parte do público, que apesar de não ser muito, soube fazer a festa. Mas, acima de tudo, o espetáculo deu a conhecer uma Isaura capaz de agarrar a malta.