Uma investigadora de Coimbra admite a necessidade de criar um estatuto próprio para os robôs, cujas relações com os humanos levantam questões como compensações de danos e para as quais o Direito não tem resposta.
“O Direito não está preparado para regular as relações sociais, profissionais e pessoais entre humanos e robots”, que são máquinas cada vez mais sofisticadas e inteligentes, afirma Ana Elisabete Ferreira, do Centro de Direito Biomédico (CDB) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (UC).
Perante esta realidade, deveriam os robôs ter responsabilidade jurídica, questiona a investigadora, que está a desenvolver um estudo sobre o assunto desde 2011.
“A programação da inteligência artificial é hoje muito complexa e já não se limita a dizer ao robot o que fazer — prepara o robot para fazer escolhas éticas, com base naquilo que um ser humano, em regra, faria”, afirma a investigadora, citada pela UC, numa nota divulgada esta segunda-feira.
“O problema jurídico hoje mais relevante é o de compensar os danos provocados por robots que tomam decisões autónomas, ou seja, danos provocados por uma decisão do robot, e não por um defeito técnico, de programação ou de fabrico”, sublinha Ana Elisabete Ferreira.
Segundo o estudo da especialista do CBD, desenvolvido no âmbito da sua tese de doutoramento sobre direito e neurociências, a responsabilidade jurídica dos robôs “é uma questão que pode ter diferentes respostas no sistema jurídico português, dependendo sobretudo de quem é o proprietário do robot e para que fim é utilizado, mas não há uma solução unitária”.
“O nosso sistema jurídico vê os robots como coisas dominadas pelos humanos, pelo que os humanos (e as empresas que os utilizam) são responsáveis por eles”, salienta Ana Elisabete Ferreira. Esta perspetiva, observa a investigadora, “está agora a ser colocada em causa, defendendo-se que os robots devem ter um estatuto jurídico próprio e ser titulares de direitos e deveres”.
O Comité de Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu divulgou, a 16 de maio, um relatório no qual é proposto o estatuto jurídico de ‘pessoa eletrónica’ para os robôs mais avançados, bem como “a criação de um sistema de ressarcimento dos danos através de seguro obrigatório para esse efeito, a ser suportado, em última instância, por um fundo estadual”.
“Abrindo-se um novo estatuto jurídico específico (o que tem sido negado, por exemplo, aos animais ou aos embriões), enceta-se uma nova era para a responsabilidade”, conclui Ana Elisabete Ferreira.