O Tribunal Geral da UE confirmou esta terça-feira a ilegalidade da cláusula de não concorrência entre a antiga PT SGPS (atual Pharol) e a Telefónica, no âmbito da venda da brasileira Vivo pela ex-PT à operadora espanhola.

No entanto, os acórdãos hoje proferidos pelo Tribunal Geral da União Europeia (UE), no Luxemburgo, estabelecem também que a Comissão Europeia deverá pronunciar-se de novo sobre a fixação do valor das coimas aplicadas às duas empresas, de cerca de 66,9 milhões de euros e cerca de 12,3 milhões de euros, respetivamente, voltando a determinar as vendas das duas operadoras que estejam relacionadas “direta ou indiretamente com a infração”.

Em 2010, a PT e a Telefónica celebraram um acordo de compra de ações que visava o controlo exclusivo da operadora móvel Vivo pela Telefónica, onde inseriram uma cláusula de não concorrência, a ser aplicada entre 27 de setembro de 2010 (data da conclusão definitiva da transação) e 31 de dezembro de 2011.

Mas depois de alertada sobre a existência desta cláusula pela Autoridade da Concorrência espanhola, a Comissão Europeia deu início em janeiro de 2011 a um procedimento contra a Telefónica e a PT, o que levou as duas operadoras a assinarem no mês seguinte um acordo que visava suprimir esta cláusula.

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Contudo, numa decisão de 2013, a Comissão Europeia considerou que a cláusula equivalia “a um acordo de partilha de mercado com o objeto de restringir a concorrência no mercado interno” e aplicou à Telefónica e à PT coimas de 66,894 milhões de euros e de 12,290 milhões de euros, respetivamente. A PT SGPS passou a ser Pharol e a parte mais substancial dos ativos da antiga Portugal Telecom foi integrada na fusão com a brasileira Oi que, por sua vez, vendeu a PT Portugal aos franceses da Altice.

A Comissão concluiu que a cláusula abrangia todos os mercados de serviços de comunicações eletrónicas e de televisão em Espanha e Portugal, excetuando os mercados de serviços globais de telecomunicações e dos serviços grossistas de transporte internacional, e “era suscetível de atrasar o processo de integração no mercado do setor das comunicações eletrónicas”.

A antiga PT SGPS e a Telefónica recorreram e pediram então ao Tribunal Geral da UE a anulação da decisão da Comissão e a redução do valor das coimas aplicadas, alegando nomeadamente a necessidade “de excluir do cálculo da coima o volume das vendas realizadas nos mercados ou com serviços não sujeitos a uma concorrência potencial” e logo “não abrangidas pelo âmbito de aplicação da cláusula”.

As duas operadoras contestaram ainda que “a cláusula constitua uma restrição da concorrência por objeto”, já que consideram que a Comissão “não demonstrou que a Telefónica e a PT eram concorrentes potenciais” e ainda que “a cláusula era, portanto, suscetível de restringir a concorrência”.

Hoje, o Tribunal Geral, através dos acórdãos proferidos, nega provimento aos recursos da antiga PT SGPS e da Telefónica. Refere que, tendo em conta que a própria existência da cláusula é um forte indício de uma concorrência potencial entre a PT e a Telefónica – que o seu objeto consistia num acordo de partilha de mercados, que tinha um âmbito de aplicação alargado e que se inseria num contexto económico liberalizado -, “a Comissão não estava obrigada, como afirmam a PT e a Telefónica, a proceder a uma análise pormenorizada da estrutura dos mercados em causa e da concorrência potencial entre as sociedades nesses mercados, a fim de concluir que a cláusula constituía uma restrição da concorrência por objeto”.

Mas define também que a Comissão “deverá determinar novamente as vendas relacionadas direta ou indiretamente com a infração para o cálculo do montante das coimas”, declarando que as vendas de uma empresa correspondentes a atividades que não possam ser consideradas como estando em concorrência com a outra operadora, no período de aplicação da cláusula, “devem ser excluídas para efeitos do cálculo da coima”.

“Assim, para determinar o valor das vendas das sociedades a tomar em consideração para o cálculo do montante das coimas, a Comissão deveria ter examinando os argumentos da PT e da Telefónica destinados demonstrar a inexistência de concorrência potencial entre elas relativamente a determinados serviços”, explica.

O Tribunal reforça ainda que “só com base nessa análise factual e jurídica é que teria sido possível determinar o valor das vendas relacionadas direta ou indiretamente com a infração”, valor que deveria ter servido de montante de partida para o cálculo do montante de base da coima.

A cláusula em causa estabelecia que “na medida do permitido por lei, as partes abster-se-ão de participar ou investir, direta ou indiretamente através de qualquer filial, em qualquer projeto no setor das telecomunicações” (… excluindo apenas qualquer investimento e atividade detidos ou realizados à data do presente acordo) que possa ser considerado como estando em concorrência com a outra parte no mercado ibérico”.

A Comissão considerou que o processo de integração no mercado do setor das comunicações eletrónicas sairia “gravemente” prejudicado se operadores históricos, como a Telefónica e a PT, “pudessem reforçar o seu já muito forte poder de mercado através de uma colusão, no sentido de proteger os seus mercados nacionais e de evitar a entrada de outros operadores nestes últimos”.

Durante todo este processo, a PT sustentou, que a cláusula continha duas obrigações distintas — uma obrigação principal de autoavaliação e uma obrigação secundária de não concorrência, sendo que a segunda só se tornava vinculativa se a sua legalidade fosse declarada quando do exercício da primeira.

Por sua vez, a Telefónica alega designadamente que a cláusula foi imposta pelo Governo português ou que era, em todo o caso, necessária para que este não bloqueasse o acordo relativo à transação da Vivo.