Entrou na sala de imprensa a mexer no telefone. Estava alheado, talvez a receber mil e uma mensagens emocionadas, a lembrar-lhe a cada dois segundos que aquele era o fim. Antes, Ryan Murphy já havia confidenciado que o mood no balneário foi suave. Phelps não quis dizer nada de extraordinário. “Não tenho nada para dizer. Vamos lá e matar”, revelou Murphy.

Michael Phelps chegou com Bob Bowman, o seu treinador de sempre. É o homem que sabe todos os segredos, defeitos, virtudes e sacrifícios que o maior atleta olímpico da história teve de cumprir. Quando Bowman foi perguntado se seria possível encontrar outro Michael Phelps, o treinador fugiu a sete pés desse cenário. “Espero que não… e espero que ele não me encontre a mim”. O ambiente ficou leve, as gargalhadas atropelaram-se.

“É muito mais emocionante do que em 2012”, começou por dizer Phelps. “Isso é uma coisa boa: olhar para trás e dizer que consegui tudo o que queria”, solta, emocionando-se. Ele vai travando o discurso, prefere pensar bem. É ponderado, mas o tom é sincero. “É a cereja no topo do bolo. Não podia estar mais feliz pela forma como acabou.” As lágrimas após a derradeira corrida caíram porque compreendeu que tudo acabou. This is it.

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Quando uma jornalista lhe perguntou onde guardava tantas medalhas, Phelps sorriu e disse que não dizia. “Nunca digo isso. Se calhar há duas, três pessoas que o sabem.” Um dos privilegiados será o seu filho, que até já viu uma das cinco medalhas de ouro que o pai ganhou no Rio. Mostrou-a pelo telefone e o garoto, diz Phelps, ficou vidrado. “Não sei quando vou realizar [que tenho 28 medalhas]. Todos os dias dizia ao Bob: ’22, a sério’. E depois mais um dia, e mais um dia…”

A aventura na natação arrancou em 1992, quando tinha sete anos. “Começou com um sonho em pequeno. Queria fazer algo que nunca ninguém tinha feito. E acabou por ser algo muito fixe. Disse isto muita vez, e é mesmo verdade: foi um sonho tornado realidade. É a maneira perfeita para acabar”, repete.

Bob Bowman foi perguntado sobre Phelps, sobre a evolução, sobre as diferenças, e o treinador preferiu focar a liderança do nadador. “Foi a primeira vez como capitão, fez um grande trabalho. Liderou os mais novos, teve voz. Isso ajudou-nos a conseguir a coesão de equipa certa”, garante.

“Todas as medalhas são especiais de certa maneira”, diz Phelps. “É cedo para dizer [qual prefere]. Talvez um dia. Eu e o Bob estamos juntos há 20 anos, 20 anos… Têm sido uns 20 anos maravilhosos. Foi especial. Vou reformar-me, mas não terminei nisto de nadar.”

Michael Phelps foi então convidado a abrir o coração. O que mudou? Quem é este homem que tudo ganha, que caiu e levantou voo outra vez? “A maior coisa que mudou foi que me viram. Nunca me tinham visto. Eu disse isto a algumas pessoas: ‘o mundo vai ver quem sou’. Eu acho que mostrei. Aconteceram coisas incríveis, dias e dias.”

USA's Michael Phelps' mother Deborah (R) and partner Nicole Johnson holding Michael Phelps' son, Boomer cry during the podium ceremony of the Men's swimming 4 x 100m Medley Relay Final at the Rio 2016 Olympic Games at the Olympic Aquatics Stadium in Rio de Janeiro on August 13, 2016. / AFP / Odd ANDERSEN (Photo credit should read ODD ANDERSEN/AFP/Getty Images)

Nicole, o filho de Phelps e a mãe do nadador (ODD ANDERSEN/AFP/Getty Images)

A seguir surgiu uma pergunta curiosa, relativa ao número 23. Ou seja, a coincidência entre Michael Jordan e o número das suas medalhas. “Tudo acontece por uma razão. O Michael Jordan tem sido uma inspiração para mim durante toda a minha carreira. Ver o que ele fez no basquetebol… Eu queria fazê-lo no desporto. Fizemos muito, mas há muito trabalho para ser feito. Eu pensei nisso hoje: 23 é um número especial, e será ainda mais especial”, explica.