PSD e CDS não pedem a demissão do ministro das Finanças nem do presidente da Caixa Geral de Depósitos, mas exigem esclarecimentos. PSD quer que o primeiro-ministro dê um “esclarecimento cabal e urgente” sobre todo o processo que envolve a administração da Caixa Geral de Depósitos, nomeadamente o alegado “conflito de interesses” que se possa ter gerado quando António Domingues, ainda na qualidade formal de vice-presidente do BPI, se deslocou a Bruxelas para negociar, em nome do Estado, o processo de capitalização do banco público. CDS quer ter acesso a toda a correspondência trocada entre Governo e administração da Caixa antes de falar em demissões e responsabilizações. Se houve conflito de interesses, cabe ao Banco de Portugal tirar as ilações, dizem os centristas.

Falando em conferência de imprensa no Parlamento, o líder parlamentar do PSD Luís Montenegro, exigiu que o primeiro-ministro “parasse de se esconder atrás de um qualquer álibi” e esclarecesse “de uma vez por todas” o processo “opaco” que tem envolvido a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e a condução da nova administração. Classificando António Costa e o Ministro das Finanças de os “principais mentores” do processo, Montenegro pediu respostas para as seguintes perguntas:

  • Que reuniões foram essas em que António Domingues participou, mandatado pelo Governo, mas numa altura em que ainda era quadro do BPI?
  • Quem participou nessas reuniões?
  • Que informação foi tratada nessas reuniões?

Em causa para o PSD está o facto de o Governo ter enviado António Domingues para as negociações em Bruxelas numa altura em que, não só ainda não tinha assumido funções como presidente da Caixa, como ainda nem se quer tinha renunciado ao cargo de vice-presidente do BPI. “Domingues contratou uma consultora e advogados para o ajudarem no processo e partilhou com eles as informações a que teve acesso”, logo, “pode haver aqui um claro conflito de interesses”.

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Instado a esclarecer se o PSD acompanhava a opinião do eurodeputado social-democrata Paulo Rangel, ou seja se quer a demissão de algum interveniente do processo, Luís Montenegro limitou-se a dizer que “deve haver consequências”, mas que é o primeiro-ministro que tem de esclarecer se tem ou não confiança nos governantes das Finanças e no presidente da Caixa depois disto. “Fragilizado está o Governo português, o ministro das Finanças e o primeiro-ministro”, disse aos jornalistas. Paulo Rangel defendeu, a título pessoal, a demissão do secretário de Estado do Tesouro, Ricardo Mourinho Félix, que tem dado a cara nesta polémica.

Ou seja, para já, o PSD quer apenas que António Costa fale sobre o assunto quando aparecer em público (“está todos os dias na rua e a fazer declarações públicas”) ou quando vier ao Parlamento. Se nos próximos dias não houver esclarecimentos da parte do Governo é que o PSD admite obrigar os esclarecimentos por outra via.

Quando António Domingues foi ouvido no Parlamento no âmbito da comissão parlamentar de inquérito à gestão da Caixa Geral de Depósitos, o presidente do banco público admitiu aos deputados que tinha negociado o dossiê em Bruxelas e que até tinha contratado a consultora McKinsey e um escritório de advogados da sua confiança para o auxiliarem no processo. O gestor revelou, na audição realizada no final de setembro, que antes de 16 de abril, quando aceitou o convite, pediu três reuniões — em Bruxelas (concorrência), em Frankfurt (supervisão) e no Banco de Portugal.

CDS quer Banco de Portugal a agir em caso de conflito de interesses

Mas garantiu sempre que nessa altura não teve acesso a informação privilegiada. Assim sendo, se a informação é pública, o PSD exige que essa informação seja dada ao Parlamento. “Se a informação era pública, deve ser facultada”. Também o CDS quer ter acesso a toda a informação, para depois poder tirar conclusões. Falando aos jornalistas no Parlamento, o deputado João Almeida lembra que os centristas já pediram, via comissão parlamentar de inquérito, toda a troca de correspondência (os e-mails) entre o Governo e a nova administração da Caixa.

Mas mais: “Queremos saber se houve intervenção dos novos administradores antes de o serem”, disse o deputado João Almeida, remetendo para o Banco de Portugal as decisões sobre esta matéria. É o Banco de Portugal que deve investigar se houve ou não duplicação de papéis, defendeu, sublinhando que, se tiver havido, então o Banco de Portugal saberá e deverá, nesse âmbito, “aplicar os regulamentos das instituições financeiras em matéria de conflitos de interesses”.

Este tema motivou desde o início uma troca acesa de acusações entre António Domingues e Pedro Passos Coelho, com o líder do PSD a sugerir que Domingues teve acesso a informação privilegiada para gerir o dossiê antes de ter tomado posse no banco público. A questão das datas foi sempre um problema: é que António Domingues foi convidado em março para ir para a Caixa, aceitou em abril, mas só a 30 de maio comunicou à CMVM que tinha deixado de ser administrador do BPI. Mas as reuniões que teve em Bruxelas, já mandatado pelo Estado português, foram precisamente durante o mês de maio.

Para o CDS, de resto, esta é mais uma manobra do Governo para não discutir o que é importante, que é o processo de capitalização da Caixa Geral de Depósitos. O Governo tinha inicialmente afirmado que o processo de capitalização ficava fechado até ao fim do ano mas já veio entretanto anunciar que isso só aconteceria em 2017.