Antes, Heloísa Apolónia tinha alertado, no plenário do Parlamento, para um “sério problema”, que era a violação do acordo, sugerindo mesmo ao primeiro-ministro que fosse ler o documento: “Na posição conjunta deixamos claro que não havia lugar a qualquer redução da TSU. Vou pedir-lhe que quando sair deste debate se vá fixar na redação da posição conjunta assinada entre Os Verdes e o PS para que depois possamos continuar a conversar”.

A tese

A discussão foi aberta pela deputada do partido ecologista, Heloísa Apolónia, durante o debate quinzenal desta quinta-feira. Criticando a moeda de troca que, por aquela hora, estava a ser estudada na reunião da concertação social, de reduzir a taxa paga pelas empresas pelos trabalhadores que ganhem o salário mínimo, a deputada do PEV admitiu que o seu partido estava “com um sério problema”, porque na posição conjunta que assinou com o PS assumiu o compromisso de que não haveria lugar a qualquer redução da TSU para as empresas.

Na resposta, ainda no plenário, António Costa disse registar e compreender a sua oposição à proposta apresentada pelo Governo, ressalvando no entanto que ainda não existia nenhum acordo na concertação social. É que a reunião do Governo com os parceiros sociais decorria à mesma hora, acabando pouco depois do debate com uma novidade: salário mínimo aumenta já em janeiro para os 557 euros mas a redução da TSU para as empresas é ainda maior: 1,25 pontos percentuais.

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Já fora do plenário, questionado pelos jornalistas, António Costa recusou estar a violar as posições conjuntas assinadas entre o PS e o PEV (e também presentes no acordo com o BE): “Não, não é assim. O que está no Programa do Governo é que iríamos propor à concertação social uma trajetória anual de convergência no salário mínimo”. Foi o que fizeram, é certo, mas cedendo aos patrões na contrapartida de voltar a aumentar a redução da TSU.

Os factos

O que consta da posição conjunta assinada, em novembro de 2015, entre PS e Verdes, no anexo relativo às questões salariais e de segurança social é o seguinte: “Não constará do Programa de Governo qualquer redução da TSU das entidades empregadoras“. Este é o ponto 2. No ponto 5, volta-se a falar no tema, com PS e Verdes a comprometerem-se a “reavaliar as isenções e reduções da Taxa Social Única (TSU) que de exceção se transformaram em regra, fazendo perder mais de 500 milhões de euros de receitas por ano”.

Heloísa Apolónia explica ao Observador que, no debate, se referia a estes dois pontos concretos da posição conjunta que os Verdes assinaram com o PS. O ponto onde ficou definido que no Programa do Governo do PS não estaria “qualquer redução da Taxa Social Única das entidades empregadoras” e um outro ponto, onde se pode ler a exigência de “reavaliar as isenções e reduções da Taxa Social Única que de exceção se transformaram em regra, fazendo perder mais de 500 milhões de euros de receitas por ano”. Um ponto que, explica, só chegou a entrar no Orçamento do próximo ano por insistência dos Verdes. “Este ano os Verdes conseguiram essa norma no Orçamento e achamos que quando no Orçamento está estipulado não tem lógica estarmos a dar passos atrás, quando devíamos estar a dar passos à frente”, diz.

Foi por causa disto que este ano (ao contrário do que aconteceu no ano passado, em que também se negociou com os parceiros a mesma moeda de troca para o aumento do salário mínimo), os Verdes entenderam levantar a questão junto de António Costa, nos termos em que Heloísa Apolónia o fez no debate quinzenal desta quinta-feira.

Mas há uma diferença. Em 2016, o acordo (já tardio) a que o Governo chegou na concertação social estabeleceu um aumento do salário mínimo para 530 euros com a contrapartida da redução de 0,75 pontos percentuais para as empresas (até janeiro de 2017), para facilitar a transição. Este ano, uma vez que a transição já foi feita, os partidos da esquerda parlamentar não concordam com a continuada redução da taxa para os patrões. Foi o que explicou a deputada bloquista Catarina Martins no debate:

“Não compreendemos como é que o Governo oferece aos patrões descontos na TSU. Se há um ano tinha sido à ultima hora e as empresas não se tinham conseguido organizar, agora sabem há mais de um ano. Com que justificação é que os contribuintes vão financiar as empresas?”, questionou.

Na posição conjunta assinada entre BE e PS também consta a mesma alínea: “Não constará do Programa de Governo qualquer redução da TSU das entidades empregadoras”.

Para Costa, a redução das contribuições das empresas para a segurança social como contrapartida do aumento do salário mínimo é o que permite ir mais além — caso contrário o aumento não seria para 557 euros, já em janeiro, mas apenas para 540. Trata-se de uma “política social” em que, disse, ao prescindir de uma parte do aumento da receita da Segurança Social, se evita o aumento da despesa social. A ideia é ajudar algumas empresas a suportar esse custo acrescido.

Para os partidos da esquerda, contudo, trata-se apenas de um incentivo para as empresas contratarem apenas pelo valor do salário mínimo, e não mais.

A conclusão

António Costa diz que a redução da TSU para as empresas não consta do Programa de Governo, e isso é verdade — mas também é verdade que, na prática, o Governo está a aplicar essa medida. Foi o Executivo quem propôs na concertação social reduzir aquela taxa para as empresas que paguem o salário mínimo. Aliás, trata-se de uma redução ainda maior (1,25 pontos percentuais) do que a que o Governo tinha inicialmente proposto aos parceiros (1 ponto).

Logo, viola o princípio do acordo onde os dois se comprometem a não reduzir TSU das empresas. Embora se mantenha o que estava previsto no programa de Governo, que contempla uma subida anual do salário mínimo até que este atinja 600 euros no último ano da legislatura, em 2019.

Atualmente, as empresas gozam de um desconto de 0,75 pontos percentuais na taxa de 23,75% que pagam, por trabalhador, para a segurança social. Agora, o Governo concordou com os patrões num aumento daquele desconto para 1,25 pontos percentuais, reduzindo assim a taxa para 22,5%, para os casos dos trabalhadores que ganhem o salário mínimo e que por isso venham a ter um aumento salarial. Isto só acontece a partir de 1 de fevereiro, altura em que acaba o desconto de 0,75 em vigor.

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