Para chegar aos primeiros sapatos foi preciso andar muito. Mais concretamente um ano e dois meses com protótipos e modelos-teste calçados. A equipa usou os sapatos-experiência, a família foi também chamada a servir de cobaia. “Tivemos azar porque muitas das pessoas tinham os pés mais complicados que eu já vi na vida”, brinca Joana Lemos. Azar ou sorte, porque depois de calçarem pés largos ou com o peito muito alto, e depois de serem alargados, subidos e acolchoados, os sapatos da Freakloset estão preparados para tudo. Até para serem feitos à medida.

Antes de haver testes, até antes de haver marca, houve uma tese de mestrado, por sua vez transformada num plano de negócios. Joana Lemos, de 26 anos, estava a estudar marketing na ESADE, em Barcelona, quando se lembrou do closet da mãe, onde ia várias vezes quando precisava de se vestir para uma ocasião especial. “Ela tem peças com 25 e 30 anos que continuam incríveis, com um design atual”, conta a empreendedora de 26 anos, “e isso levou-me a pensar em fazer qualquer coisa com os clássicos que toda a gente devia ter no armário”. Por questões práticas mas também de gosto pessoal, Joana resolveu focar-se apenas na parte do calçado. Nessa altura ainda não sabia que o avô do avô e depois dele também o pai do avô tinham sido sapateiros, apenas que queria fazer coisas diferentes com sapatos.

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Joana Lemos com alguns dos modelos da marca. © ANDRÉ MARQUES / OBSERVADOR

“Pegando no conceito dos básicos, quis fazer uma marca com os modelos clássicos ‘obrigatórios’ — uma bota, uma sapatilha, um derby — e dar-lhes a hipótese de serem customizados”, diz a fundadora da marca. “Sempre me fascinou poder escolher coisas que se adequem ao que eu já tenho e com a personalização é possível criar um produto inédito e verdadeiramente adaptado a diferentes estilos e personalidades. Além disso, num mundo em que é tudo tão igual e as pessoas usam as mesmas coisas, é a forma de nos diferenciarmos um bocadinho.”

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Espreitando para os pés da concorrência foi possível ver que no mercado já havia outras marcas de sapatos construídos à medida do cliente, às vezes até demais. “Há marcas que deixam escolher tudo e dão tantas hipóteses que acaba por se tornar cansativo ou por não jogar uma coisa com a outra”, diz a empresária. No caso da Freakloset, foi então definido um processo que permite expressar a criatividade individual em poucos minutos.

Depois de escolher o modelo, o cliente pode personalizar quatro áreas: a cor da pele, a sola, os atacadores e a parte do calcanhar, que é em neoprene.” Na pele há oito opções, nas restantes mais de 10 para cada. Fazendo as contas, com cinco gestos é possível criar mais de 50 mil sapatos diferentes.

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O mesmo modelo dá origem a sapatos variados. © Divulgação

Desde julho tudo isto pode ser feito diretamente no site da marca, num software desenhado de raiz que teve honras de marcar presença na última edição da Web Summit e em que cada modelo é fotografado centenas de vezes, de todos os ângulos, para se fazer a sua modelagem em 3D. Para já há cinco modelos, para homem e mulher: derby, monk, ankle boot, chelsea boot e loafer, os tais clássicos que a marca quis tornar menos sérios. E mais amigos dos pés.

“O que eu sentia nos clássicos é que não era suposto serem confortáveis”, diz Joana Lemos. “Um sapato clássico é um sapato imponente, duro, consistente, e isso fazia com que muitos me aleijassem, e quase sempre na parte de trás.” Aí entrou a ideia do calcanhar num material diferente: “Começámos a fazer experiências, a testar materiais, e o neoprene ficou, por ser o mais confortável e o mais versátil”, conta a mentora, admitindo que “no início foi complicado acertar com a construção”, não só por estar a juntar uma pele consistente com um material maleável, conhecido por ser usado nos fatos dos surfistas, mas porque “as fábricas nunca tinham visto nada assim“.

Da sola colorida aos atacadores, que podem ou não ser a condizer, todos os sapatos são feitos à mão na capital do calçado, São João da Madeira. No caso dos que são personalizados, não é exagero dizer que são fabricados um a um. “O sapato tem uma componente manual grande, o que faz com que demore mais horas a fazer do que o normal. Para além do neoprene, as línguas, por exemplo, são acolchoadas com látex. Tudo o que abraça o pé tem esponja, para ser confortável.” Tempo de entrega desde a encomenda: três semanas. Preço: a partir de 240 euros, o que leva a marca a posicionar-se no segmento premium.

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O “derby” é um dos modelos que existe há mais de 200 anos e que a Freakloset quis reinventar, dando-lhe novas cores e materiais. © Divulgação

“Não queremos ser uma marca de tendências, queremos criar um produto intemporal, que tanto está hoje na moda como daqui a cinco anos”, diz Joana Lemos. “Por isso é que o design é tão clean, para se poder adaptar durante muito tempo a muitas pessoas. E por isso é que insistimos na qualidade: se eu digo que o sapato vai estar na moda daqui a cinco anos, ele tem de aguentar cinco anos.”

Entre a tese de mestrado e o lançamento da Freakloset, no verão de 2016, juntaram-se mais três pessoas à equipa. Todos juntos tratam da parte criativa, financeira, gráfica, comercial, do design e das redes sociais. E sim, quando precisam servem de cobaias e andam a passear por Lisboa com sapatos-teste, os mesmo sapatos que já os levaram à Semana da Moda de Londres, este domingo, 8, para calçar o desfile de outono/inverno 2017 da marca inglesa Sibling.

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Habituada a trabalhar com blocos de cor, a inglesa Sibling desfilou com sapatos da marca na London Fashion Week.

Entrar no mercado inglês é um objetivo a curto prazo, assim como lançar uns ténis e andar pelos fiordes. “Olhamos muito para o norte da Europa porque achamos que os nórdicos se identificam com este estilo clean e com os blocos de cor”, diz Joana Lemos. Por isso o site está em inglês, as entregas para a Europa são gratuitas e existe uma coleção fixa, com combinações já feitas, mais fácil de penetrar nas lojas.

“A Freakloset é uma marca global”, conclui Joana Lemos. Temos todo o orgulho em comunicar que somos de Portugal, e temos uma tradição e um know how que são muito respeitados, mas estamos a posicionar-nos como uma marca para o mundo.”

Um mundo mais colorido e sem bolhas nos pés.

Nome: Freakloset
Data: 2016
Pontos de venda: Showroom Freakloset (Rua do Passadiço, 68, Lisboa, aberto todos os dias das 9h30 às 18h30), scar.id (Rua do Rosário 253, Porto), Minty e loja online (entregas gratuitas para toda a Europa)
Preços: A partir de 240€

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