Eduardo Silva disse esta sexta-feira que o elo de ligação entre o F.C. Porto e a empresa de segurança SPDE era o diretor da PortoEstádio, Carlos Carvalho. Com estas declarações, o responsável pela SPDE e principal arguido no Processo Fénix nega que os contratos passassem por Antero Henrique, ex-diretor da SAD do clube.

Pinto da Costa, que na primeira sessão tinha dito que as questões contratuais com a SPDE eram tratadas pela administração e que não passavam por ele, vê aqui confirmadas as suas declarações. ‘Edu’ confirmou que conhece Antero Henrique desde 2004 e que lhe ligava diretamente para o telemóvel quando o F.C. Porto se atrasava nos pagamentos, mas que não era com ele que discutia os serviços de segurança que prestava ao clube.

Uma da questões chave do Processo Fénix é conseguir provar que a SPDE fazia segurança privada ilegalmente. Os clientes que alegadamente contrataram este tipo de serviços sabendo que a SPDE não tinha o alvará para os fazer, casos de Pinto da Costa e Antero Henrique, também são arguidos.

Uma das situações mais conhecidas aconteceu a 18 de maio de 2015. A acusação refere que ‘Edu’ Silva, Jorge Sousa, Nelson Matos e Hugo Cunha fizeram proteção pessoal, vulgo guarda-costas, a Antero Henrique, numa noite em que a equipa chegava ao Dragão após mais um mau resultado. Muitos adeptos aguardavam a comitiva.

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O juiz Miguel Teixeira leu várias escutas sobre a estratégia que os arguidos definiam ao minuto, sobre como manter Antero Henrique em segurança, para depois o levarem a casa. Outros vigilantes da SPDE foram colocados na entrada da residência pessoal de Antero, e na entrada da garagem. “É uma proteção que eu faria a um amigo que estivesse em dificuldades“, justificou o advogado Artur Marques, no intervalo da sessão, corroborando as declarações de ‘Edu’. Quanto aos agentes de serviço, o responsável pela SPDE justificou tratar-se de “vigilância estática” incluída no contrato, e não proteção pessoal. Os vigilantes estariam na casa “para prevenir as pinturas rupestres que adeptos podiam fazer nas paredes”.

© Hugo Delgado / LUSA

A cada situação relatada pelo juiz, Eduardo Silva respondia com uma justificação que pretendia mostrar que nem ele, nem os funcionários da SPDE, estavam a efetuar segurança pessoal. Uma função para a qual não tinham alvará. Quando o ex-jogador do F.C. Porto Hulk esteve na cidade, Eduardo Silva ordenou que o vigilante da SPDE Nelson Matos ficasse “a fazer segurança ao gajo“, leu o juiz, citando uma escuta. ‘Edu’, como é conhecido, negou que se tratasse de um serviço de guarda-costas. “A relação que tenho com o Hulk é de amizade”, corrigiu, alegando que os vários agentes da SPDE que acompanharam Hulk e os amigos na saída à noite nada mais faziam além de garantir uma boa receção do jogador à cidade onde viveu.

Entre os vários casos relatados está também a alegada proteção de um menor que jogava nas camadas jovens do Boavista. Os pais, Maria Helena Couto e Mário Jorge Couto, contactaram ‘Edu’ porque o filho tinha sido roubado pelos colegas, que lhe ficaram com o seu telemóvel. De modo a intimidarem os colegas, pediram que um segurança acompanhasse o jovem no trajeto entre o Externato Ribadouro, onde estudava, e o Estádio do Bessa. O responsável pela SPDE foi buscar o rapaz na sua viatura, acompanhado por outros agentes da empresa, mas recusa que tenha sido um caso de proteção pessoal. “A minha intenção era apresentá-lo aos seguranças do Boavista”, justificou. Os outros vigilantes que o acompanharam fizeram-no apenas porque ‘Edu’ “nunca anda sozinho”, disse. Mais uma vez, tratava-se de um casal amigo.

E Nuno Frechaut, “para além de meu vizinho é um amigo”, disse Eduardo Silva. Por isso, não hesitou quando o ex-internacional da Seleção A de futebol lhe ligou a dizer que ia com o irmão de ‘Edu’, Paulo Silva, a Aveiro recuperar um cheque que o próprio Paulo teria passado, mas os dois teriam receio de ir sozinhos. ‘Edu’ prontificou-se a “arranjar uma turma” para os acompanhar, que incluiu os arguidos Nelson Matos e Hugo Cunha. Recusa, mais uma vez, que se tenha tratado de proteção pessoal.

O jogador da Seleção Nacional de futebol, Nuno Frechaut, é um dos arguidos do processo. Está acusado de um crime, por ter recorrido a serviços de segurança privada não habilitados para a função. © José Coelho / LUSA

O nome de Anselmo Ralph surge no processo porque, a 7 de maio de 2015, ‘Edu’ Silva terá sido mandado pela Federação Académica do Porto, cliente da SPDE, ir buscar o cantor angolano ao hotel, a fim de o trazer para o concerto que daria na Queima das Fitas, acompanhá-lo no recinto e, no final, levá-lo de volta ao hotel. ‘Edu’ Silva justificou o episódio como uma mera indicação do caminho entre o hotel e o recinto. Uma situação a que chamou de “encaminhamento”, por oposição ao acompanhamento pessoal, de que é acusado.

O caso mais dramático do processo — a morte de Luís Miranda, na sequência de uma alegada agressão de um segurança da SPDE no “Chic Bar”, em Vila Nova de Famalicão, foi abordado na sessão desta sexta-feira. O juiz quis perceber se ‘Edu’ Silva teria combinado uma versão a contar em tribunal, que ilibasse o segurança Jorge Ribeiro. “Só tive conhecimento [do caso] quando se deu o óbito”, disse. Ou seja, cinco dias depois da agressão. Garantindo que não conhece Jorge Ribeiro, Eduardo Silva foi confrontado com uma escuta em que quis saber se a testemunha principal do caso tinha falado “tudo direitinho”. “Tinha a expectativa de saber se ele tinha contado como tudo aconteceu”, justificou ao juiz.

O mega julgamento vai durar meses. A próxima sessão está marcada para 24 de fevereiro e contará com as declarações de Alberto Couto, ex-agente da Divisão Criminal da PSP e indiciado por seis crimes.