São 50 desafios que terminam com uma incitação ao suicídio e que se suspeita fazerem parte dos motivos que levaram uma jovem algarvia a atirar-se de um viaduto na madrugada de quinta-feira, em Albufeira. E que internaram um adolescente no Hospital de Setúbal por causa de vários cortes que tinha num braço, confirmou a GNR à agência Lusa.

O “Baleia Azul” está a preocupar as autoridades um pouco por todo o mundo e, em Portugal, a PSP diz que está “a monitorizar o fenómeno”. Saiba o que é, como começou, que consequências está a ter, que conselhos têm as autoridades e os psicólogos para os pais e que histórias de suicídio estão a abalar o mundo.

De onde vem e como se propaga o “Baleia Azul”?

O jogo “Baleia Azul” — que também é conhecido por Blue Whale Challenge — começou por causa de um artigo publicado num jornal russo, há cerca de um ano, conta o El Pais. O artigo, publicado no Novaya Gazeta, analisava uma série de suicídios de adolescentes na Rússia e revelava que os jovens que se se suicidaram tinham participado, antes, em fóruns na rede social VKontakte (VK.com) — uma espécie de Facebook russo — , onde constava informação sobre o “Baleia Azul”. É aqui que o termo surge pela primeira vez.

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Em fevereiro, duas adolescentes suicidaram-se, na Sibéria, e o administrador do fórum foi detido, acusado de “incitação ao suicídio”. O caso ainda está a ser investigado.

O artigo russo começou a ser propagado pelos meios de comunicação social anglo-saxónicos meses depois, chegando também à comunicação espanhola. Na manhã desta sexta-feira, o termo “Baleia Azul” era o mais procurado no Google, em Espanha. Só recentemente começou a ser noticiado em Portugal. Nesta sexta-feira, a expressão “Baleia Azul” era a segunda mais utilizada no Twitter, em Portugal — até às 22 horas, houve 19,5 mil referências ao jogo em tweets.

“O jogo não existia, mas com a grande repercussão da notícia, pode ter passado a existir”, explicou Thiago Tavares, da Safernet — uma organização não-governamental brasileira de combate ao crime na internet, citado pelo jornal O Globo. Em castelhano, já existem vários grupos fechados com a designação “Baleia Azul” no Facebook. O maior tem cerca de 270 mil membros e é administrado por quatro jovens colombianos, segundo o El Pais. Contudo, foi desativado esta sexta-feira e um dos administradores disse ao jornal espanhol que foi a rede social que o desativou.

Em português (do Brasil), o Observador também encontrou grupos. E há uma página dedicada à luta “contra o jogo Blue Whale Challenge”, com perto de 4 mil seguidores.

Em que consiste o jogo?

Começa com uma troca de mensagens em redes sociais como o Facebook ou o WhatsApp e é composto por 50 desafios diários. Os “curadores” ou administradores destes grupos apresentam-se com uma imagem de uma baleia azul e são eles os responsáveis por lançar os desafios, que incluem ver filmes de terror durante a madrugada, sofrerem com privação de sono, serem obrigados a tirar fotos balançando com os pés em cima de um telhado, automutilarem-se cortando os lábios ou a os caracteres “F57” na palma da mão com uma navalha. O último desafio leva os jovens a cometerem suicídio, saltando de um prédio.

Aqueles que acharem que não estão à altura dos desafios são incitados a “castigarem-se”, cortando-se várias vezes. No final das provas, as “baleias azuis” — como se chamam os jogadores — devem enviar fotos para o “curador”. No desafio número 26, o guardião explica ao participantes qual é a data da sua morte. O desafio seguinte repete-se durante 19 dias e é uma espécie de síntese dos anteriores.

Há algum caso confirmado de suicídio?

Ainda não. Apesar das suspeitas, é difícil comprovar que os suicídios (ou tentativas) ocorram por causa da participação dos jovens no jogo. Ainda não há nenhum caso confirmado, apesar de as autoridades estarem a investigar suspeitas em vários países, como o Brasil, México, Chile, Colômbia ou Rússia.

As autoridades estão preocupadas?

Sim. Segundo a BBC, as autoridades do Reino Unido, França, Espanha e Brasil têm utilizado as redes sociais para alertar os pais para os perigos do jogo da “Baleia Azul”. No Twitter, a polícia francesa lembra que a incitação ao suicídio é punível por lei com 5 anos de prisão e multas de 75 mil euros.

A polícia espanhola também já começou a enviar vários alertas sobre o jogo, sobretudo nas redes sociais.

No Brasil, há investigações a suicídios a decorrer em três estados e a a Câmara de Deputados já anunciou que vai realizar uma audiência pública para debater o jogo. Só na cidade de Curitiba, estão a ser investigadas sete tentativas de suicídios de jovens que tinham marcas de automutilação e ingerido medicamentos.

Em Portugal, o que é que se sabe?

Um adolescente de 15 anos, que reside em Sines, foi transportado para o Hospital de Setúbal com cortes num braço — desenhou uma baleia num braço com um objeto cortante. Fontes dos bombeiros e da GNR relacionam o caso com o jogo “Baleia Azul”, avança a agência Lusa. Fonte da GNR de Sines explicou que a CPCJ (Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens) tem conhecimento da situação. Incidente já terá ocorrido há cerca de um mês.

“Os pais estiveram em contacto com a CPCJ e depois a CPCJ e a GNR acharam melhor encaminhar [o jovem] para o hospital”, disse à agência Lusa a fonte da GNR, que não quis revelar mais pormenores para assegurar a “reserva da intimidade” e a “confidencialidade médica”, além de argumentar que o caso está “em análise” pela força de segurança.

A fonte da GNR explicou que não foram detetadas “coisas muito graves” no adolescente, porque a situação estava “numa fase precoce”, mas admitia que a situação “era semelhante” aos passos do jogo “baleia azul” descritos na imprensa nacional e brasileira.

Jovem de 15 anos internado. Autoridades relacionam mutilações com jogo ‘Baleia Azul’

O Correio da Manhã também já tinha noticiado esta sexta-feira o caso de uma jovem algarvia que se tinha atirado de um viaduto em Albufeira, na madrugada de quinta-feira. O Diário de Notícias conta que a jovem de 18 anos tinha a palavra “sim” cortada na coxa, levantando a suspeita de que o ato estaria relacionado com os desafios do “Baleia Azul”. A GNR encontrou-a por volta das duas horas da madrugada e levou-a para o Hospital de Faro.

O que aconselha a PSP?

Ao Observador, fonte da PSP confirmou que “se encontra a monitorizar este fenómeno” e que, “num esforço de prevenção e informação aos pais e responsáveis legais por crianças e jovens, aconselha uma série de medidas adicionais de segurança em ambiente digital”, tais como:

  1. Os pais devem manter-se informados e alertar as crianças para todas as implicações que decorrem da Baleia Azul;
  2. Deve haver uma maior supervisão e monitorização das atividades dos filhos na internet e redes sociais;
  3. Pais devem explicar que perigos existem quando adicionam desconhecidos nas redes sociais;
  4. Familiares, amigos e colegas da escola devem fazer parte da lista de amigos dos adolescentes;
  5. Pais não devem proibir o acesso dos filhos aos meios digitais;
  6. O diálogo e debate no seio familiar sobre segurança, perigos e privacidade na internet deve ser alimentado;
  7. Se há suspeita de que as crianças estão a ser alvo de violência psicológica devem dirigir-se à esquadra da PSP mais próxima;

O que dizem os psicólogos?

Ao Observador, Ana Teresa Marques, psicóloga na Clínica de Psicologia de Lisboa, explicou que “as crianças até terem uma certa responsabilidade não andam sozinhas na rua, porque os pais não deixam”, mas que “os pais não entendem que os perigos na rua são tão reais como os perigos da exposição na internet. Tem que haver controlo paternal sobre o que as crianças — e cada mais novas — fazem na internet”.

Apelando a uma observação dos pais mais atenta, a psicóloga disse que é preciso que os pais estejam atentos “a sinais externos”, como, por exemplo, se a criança tem marcas e não fala sobre elas, se anda perturbada, desatenta, ou apática. “Os pais devem conversar e explicar os perigos da internet, a manipulação, onde a realidade e a fantasia acabam”, disse ao Observador, explicando que “envergar nestas coisas é um indício de patologia e não um diagnóstico”.

Os pais devem ter abertura para procurar ajuda de profissionais sem passarem à criança a ideia de que está doente. “As crianças escondem mas as crianças adoram contar coisas, e estão, quase inconscientemente, a pedir ajuda ou atenção”, acrescentando que o conselho que mais dá ao pais é para, quando estão em casa, em vez de se desligarem da internet e do entretenimento, devem jogar um jogo, conversar ou brincar.

Que casos é que estão a abalar o mundo?

O primeiro caso a chocar a imprensa foi o das adolescentes Yulia Konstantinova, de 15 anos, e Veronika Volkova, de 16, que se atiraram de um edifício de 14 andares, na cidade de Irkutsk, na Sibéria. Uma delas terá publicado uma foto de uma baleia azul nas redes sociais, momentos antes de morrer.

Só no Brasil, a Globo explicava que estão em curso investigações em três estados. No Rio de Janeiro, há a suspeita de uma tentativa de suicídio, em Mato Grosso houve mesmo uma morte uma pessoa e no estado de Paraíba, há um grupo de alunos de uma escola a ser investigado, por terem um grupo de WhatsApp que divulga as regras do jogo.

‘Baleia Azul’. Autoridades brasileiras investigam jogo que termina em suicídio

Em Barcelona, há o caso de uma jovem, menor, que terá alertado a própria família para o que estava a acontecer com ela. A família denunciou o caso à polícia espanhola, conta o EL Mundo, e a jovem foi encaminhada para receber assistência médica.

Segundo a BBC, foram referenciados vários casos de suicídio que estarão relacionados com o jogo da Baleia Azul na Rússia, no Brasil, no México, no Chile e na Colômbia, onde se suspeita que três adolescentes tenham cometido suicídio por causa deste jogo. O primeiro caso relacionado com o “Baleia Azul” na América Latina ocorreu no início de abril. Tratava-se de uma jovem de 19 anos que tentou suicidar-se.

Que outros jogos perigosos de adolescentes já foram notícia?

Não é a primeira vez que um jogo de adolescentes é notícia pelas piores razões. O “desafio do Paracetamol” levou à morte de uma adolescente escocesa, por overdose, em 2011. Tinha 19 anos. Na altura, a mãe veio a público pedir para acabarem com o jogo nas redes sociais, conta o The Mirror. Em que consistia? Através da hashtag #paracetamolchallenge, os adolescentes desafiavam-se uns aos outros em redes sociais como o Facebook, Twitter ou Instagram a tomarem uma dose de paracetamol superior à recomendada.

O desafio do preservativo — que se propagou nas redes sociais com a hashtag #CondomChallenge — também é um dos jogos perigosos recentes. Neste desafio, os jovens permitiam que fosse filmado o momento em que os amigos deixavam cair preservativos cheios de água na cabeça uns dos outros, conta o Evening Standard. Em vez de explodir, o preservativo — por ser de látex — formava uma bolha de água em cima da cabeça dos jovens, que corriam o risco de ficar sem ar. Começou no Japão e também se tornou viral.

A irmã mais nova das Kardashians também foi responsável por um desafio que levou milhares de raparigas a insuflar o ar contido em garrafas, até ficarem com um inchaço nos lábios. Quem queria ficar com uns lábios parecidos aos de Kylie Jenner só tinha de fazer o desafio e divulgá-lo nas redes sociais com a hashtag #KylieJennerLipChallenge. Resultado: lábios roxos, danos, feridas e outras complicações.