Ganhou o palco Pitchfork na segunda noite de festival. Desfilou as canções que o confirmaram como compositor à séria, mesmo sem a banda que antes o acompanhava. E mostrou como é que se trabalha bem esta matéria. Isto do rock. Vai daí, um pouco de inveja nunca fez mal a ninguém. Vai aqui uma lista de razões:
Ele é bastante alto e isso faz diferença num palco. Na verdade, faz diferença na vida toda. Não é que este que vos escreve seja propriamente baixo (um pedido de desculpas pela informação desnecessária) mas em sendo um pouquito mais crescido isso não traz problemas, bem pelo contrário.
Toca harmónica e todo o homem devia saber tocar harmónica. Essencialmente porque dá uma pinta danada. E, já agora, porque dá jeito nas festas, qualquer festa.
Faz canções de dor, outras que permitem uma boa dança, outras ainda que parecem saídas de um filme de cowboys. Tudo junto significa que o homem é versátil.
Tem a voz arranhada, ou como dizia uma mensagem recebida a meio do concerto, “um berro maravilhoso”.
Mas, ao mesmo tempo, tem uma voz que chega onde nenhuma outra parece chegar. Isto soa a exagero mas ao vivo o amigo Hamilton parece de facto um exagero, por isso está tudo bem.
Tem uma banda incrível e sabemos todos que ninguém chega a lado nenhum sozinho. Por incrível entenda-se “sim senhor, estes tipos sabem o que fazem e fazem tudo bem feito”. Sabe escolher ou então teve sorte. Em qualquer dos casos, é motivo de inveja.
Já agora, e em particular: tem um baterista que #dátudo. E dar tudo na bateria vale muito, muito mesmo.
Toca uma guitarra de 12 cordas e isso é sinal de força, de convicção. Quer dizer que meia dúzia não lhe chega, se há mais então cheguemos lá.
Agarra num microfone como quem não tem dúvidas de nada, só certezas. Chega-se à frente do palco como um crooner, como um Sinatra num bar sem gente. E cantar com classe num bar sem gente deve ser coisa bastante complicada.
Foi o vocalista dos Walkmen. Ainda não tínhamos falado desta, pois não? Ora bem. E convém sempre relembrar que os Walkmen foram das melhores coisas que aconteceram a quem acha que nunca acontece nada de jeito.
É um tipo realista. Se a banda anterior dele já não lhe diz muito, ele faz discos sozinhos e resolve o problema.
Sabe contar histórias. Quem é que não gosta de saber contar histórias? E não tem vergonha de dizer que quase chorou quando a historia que nos contou neste concerto aconteceu. O pai da noiva que foi ao casamento sem ser convidado, um homem que não vale nada mas que valeu uma ótima canção.
Faz canções como os grandes heróis. Dylan, Waits, Cohen, este malandro sabe tudo, tem a escola que importa.
Tem um nome cheio de consoantes, que não tem nada a ver com aquilo que faz mas que nem por isso quis mudar. Hamilton Leithauser, tipo do rock, da pop, da folk, do arrependimento e da redenção. Duas palavras que significam isto tudo.
Lembra que a anterior banda dele fez um álbum a que deram o título de Lisbon (de 2010) — e recorda-o em pleno festival na cidade do Porto. Isto quer dizer o quê? Atitude, malta porreira. Hamilton é um tipo cheio de atitude. E quando diz adeus, porque este é o último concerto da banda, sabemos que é isso que muda o mundo.
Fora tudo isto: um desarranjado que diz que já teve o mesmo sonho mil vezes, que escreve uma canção sobre isso e que não tem vergonha de a cantar seja onde for merece toda a inveja que lhe podemos dar. Boa, Hamilton.