But those who hope in the Lord
will renew their strength.
They will soar on wings like eagles;
they will run and not grow weary,
they will walk and not be faint.

Antes de entrar em qualquer prova, Caeleb Dressel benze-se. A religião é uma presença constante na vida deste jovem americano de 20 anos que passou para o topo do desporto mundial ao igualar o feito de Michael Phelps: sete medalhas de ouro nos Campeonatos do Mundo de piscina longa de natação, três das quais alcançadas no mesmo dia em apenas 102 minutos e a última garantida este domingo, na estafeta dos 4×100 metros estilos. E também recorda essa mesma força nas redes sociais. Afinal, é por esse salmo de Isaías que guia a sua vida.

Mas os que esperam no Senhor
renovarão as forças.
Subirão com asas como águias;
correrão, e não se cansarão,
caminharão, e não se fatigarão.

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Mas Caeleb Dressel é também um miúdo de 20 anos como outro qualquer. Um miúdo que brilhou nos Mundiais de natação mas que, já esta segunda-feira, terá um exame de álgebra. “Vou ter esse teste, tive um durante as qualificações internas, tive outro durante o estágio… e não sou bom a matemática. É complicado estar a estudar e fazer isto ao mesmo tempo”, atirou após a conquista das três medalhas de ouro este sábado.

Os Estados Unidos estavam “reféns” de heróis no setor masculino. Missy Franklin, lesionada, não foi a Budapeste mas houve Katie Ledecky e Lilly King, que teve o maior duelo dos Mundiais com a russa Efimova. Já as ausências de Michael Phelps (que se reformou) e Ryan Lochte (castigado) continuavam por preencher. Nathan Adrian chegou-se à frente, mas Caeleb arrebatou para si todos os holofotes, vencendo as finais de 50 metros livres, 100 metros livres, 100 metros mariposa, 4×100 livres, 4×100 estilos, 4×100 livres mistos e 4×100 estilos mistos. “O miúdo está on fire“, resumiu Phelps.

Sei que as comparações são inevitáveis mas não quero ser comparado ao Michael [Phelps], adoro o Michael. Adoro-o de morte, acabou de mandar-me uma mensagem a dizer ‘bom trabalho’. É um grande gajo e um grande líder. Não sou capaz de me colocar nesse grupo de Spitz e Phelps, comecei agora a molhar os meus pés na natação internacional. Agora estou apenas a divertir-me, não estou ainda a contar medalhas. Sei que os resultados vão aparecer mas não penso nas coisas assim para não colocar mais pressão sobre mim”

Nascido em Green Cove Springs, na Flórida, Caeleb Dressel (que tem três irmãos, Tyler, Kaitlyn e Sherridon, todos ligados também à natação) era um miúdo hiperactivo como tantos dos nadadores internacionais de maior dimensão. Numa longa reportagem do Washington Post feita no ano passado, dá-se mesmo esse exemplo de como, quando tinha oito anos, não parava sossegado em lado nenhum e só estava onde não devia estar. Mas a família, muito próxima, sempre soube perceber o seu feitio especial. E foi por isso que, mesmo quando abandonou de forma momentânea a natação, deixou-o refletir sozinho sobre isso.

Como contou o The New York Times, quando tinha apenas seis anos, deixou a natação para passar mais tempo com o pai, depois de lhe ter sido diagnosticado um cancro (que conseguiu superar). E voltou. Aos 17 anos, quando estava na Bolles School, foi o primeiro a baixar dos 19 segundos com aquela idade nos Nacionais Juniores de Piscina Curta, o que deixou pasmado o Centro Aquático de Greensboro. E o que fez? Durante seis meses, não foi uma vez à piscina, nem sequer pensou na eventualidade de poder tocar a água da piscina. Refletiu e enviou uma mensagem ao treinador com a fotografia de uma piscina. Ia voltar.

“Fez parte do seu amadurecimento como pessoa. Sentiu que estava a nadar para outros e não por ele. Precisava do seu espaço. Como lhe disse um dia o nosso advogado, ‘Não deixes que a natação te defina. Tu és o Caeleb. Nada por ti porque nunca vais conseguir agradar a multidão’. Foi uma fase”, explicou a mãe, Christina.

“A minha paixão voltou, voltei a sentir o amor pelo desporto”, disse Caeleb ao treinador, após uma paragem de seis meses com 17 anos. “O problema foi voltar a ficar em forma porque é difícil quando se faz uma paragem tão grande

Caeleb Dressel já tinha ganho seis medalhas (um ouro, duas pratas e três bronzes) nos Mundiais de Juniores de 2013, no Dubai. Dois anos depois, entrou na Universidade da Flórida. E foi ganhando várias provas nacionais, umas atrás das outras. Conseguiu entrar na Team USA para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, conquistando duas medalhas de ouro nas estafetas: nos 4×100 metros livres e nos 4×100 metros estilos, apesar de só ter feito as eliminatórias (na final estiveram Ryan Murphy, Cody Miller, Michael Phelps e Nathan Adrian). Na única prova individual, os 100 metros livres, acabou em sexto. Agora, “explodiu”.

Há duas coisas que todos falam em relação a Caeleb Dressel além da fé e das tatuagens: a força e potência que coloca em cada prova, em 50 ou 100 metros; e o perfil diferente de todos os outros nadadores de alta competição. O americano tem uma “anormal” necessidade de desligar da natação quando não está nas piscinas. Em casa, por exemplo, a modalidade que ele e os irmão praticam não entra. Só assim consegue recuperar o fôlego para, nas provas, ser o mais focado de todos os atletas, como referem vários treinadores.

Mas então o que faz extra natação e estudos (está a tirar Gestão)? É um castiço: tão depressa passa tardes a andar de cavalo na herdade da família como se entretém com os irmãos e os amigos no tiro aos pratos e ainda há as maratonas de filmes, de jogos de tabuleiro (Risco) ou de torneios de ténis de mesa. Através da sua conta oficial do Instagram, percebe-se também a paixão pela namorada, que também é nadadora na Universidade da Flórida (Meghan Haila), e uma vida sempre em diversão, a rir-se de vídeos caricatos de animais ou a fazer rir os outros mascarado. E se repararmos em fotografias antigas, percebemos que vai tirando e fazendo novas tatuagens no braço…

Para já, o único desejo de Caeleb Dressel é arranjar umas semanas para poder explorar a Europa mas, em virtude dos compromissos da natação e da Faculdade, não sabe ao certo quando fará a viagem. O que sabe, ele e todos, é que nada será como era na vida deste americano de 20 anos. “Está a fazer tudo de forma metódica, foi exatamente o que vi com o Michael [Phelps] em 2008″, comentou o companheiro Nathan Adrian.

O resumo dos Mundiais de Budapeste. Com nota muito positiva

Os Mundiais de Budapeste, um ano depois dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, tiveram provavelmente um nível de resultados superior ao que era expectável, tendo em conta a habitual “descompressão” que existe no ano 1 do Projeto Olímpico (que é e será sempre o maior objetivo de qualquer atleta de alta competição). Houve recordes do Mundo (este domingo caiu a marca dos 4×100 metros estilos femininos e Lilly King estabeleceu um novo máximo nos 50 metros bruços) e recordes dos Campeonatos, despiques que foram capazes de prender quem gosta da modalidade, alguns feitos inéditos como a primeira medalha de ouro para uma brasileira ou o primeiro pódio de sempre para o Egito.

No setor masculino, e além de Caeleb Dressel, o grande destaque foi para Adam Peaty, britânico que venceu os 50 metros bruços, batendo por duas vezes o recorde mundial, e os 100 metros bruços. Também o chinês Sun Yang ganhou dois ouros nos 200 e nos 400 metros livres, falhando apenas o pódio com uma prova menos conseguida nos 800 metros livres. O italiano Gregorio Paltrinieri somou ao bronze nos 800 metros livres o ouro nos 1.500, no último dia de finais. Mas as maiores figuras vieram da parte feminina.

Comecemos por Katie Ledecky: será possível ganhar cinco medalhas de ouro e uma de prata e não ficar satisfeita com os resultados? Pois bem, isso aconteceu com a americana de 20 anos, que falhou a conquista dos 200 metros livres frente à “veterana” Federica Pellegrini. Mas houve também Sarah Sjöstrom, a sueca voadora que venceu três medalhas de ouro e uma de prata batendo o recorde mundial dos 50 e dos 100 metros livres; Lilly King, que ganhou com recorde mundiais o duelo particular com Efimova nos 50 e 100 metros bruços (perdeu nos 200 metros da mesma disciplina), além dos dois ouros em estafetas juntamente com Simone Manuel; Mireia Belmonte, a grande referência espanhola que conquistou o ouro nos 200 metros mariposa e ainda foi “sacar” duas pratas nos 1.500 metros livres e nos 400 metros estilos; e a húngara Katinka Hosszu, que a nadar em “casa” venceu os 200 e os 400 metros estilos, além da prata nos 200 metros costas e o bronze nos 200 metros mariposa.

Ainda no setor feminino, nota ainda para as primeiras medalhas de ouro do Canadá e do Brasil em Mundiais, conseguidas por Kylie Masse (com recorde mundial nos 100 metros costas) e Etiene Medeiros (50 metros costas).