Acima do dilema gel de banho ou sabonete, creme ou loção, há um debate que não envelhece no mundo da beleza: vale mesmo a pena usar cosméticos de luxo quando os seus equivalentes low-cost têm igualmente boas qualidades? Há opiniões drásticas. Perry Romanowski, um dos fundadores do site The Beauty Brains, defende que muitos produtos de beleza custam 1,50€ a produzir e são vendidos por 250€, embora as percentagens reais sejam um dos segredos mais bem guardados de toda as empresas de cosmética. “Geralmente, esses produtos não usam ingredientes assim tão caros que possam justificar o custo até porque nenhum creme anti-rugas vale 12o€. Na verdade, qualquer produto que custe mais de 20€ é um desperdício de dinheiro”, afirma o também autor de vários livros sobre cosmética.
Mas o que está realmente em causa na cosmética de luxo? Quando falamos de marcas como La Mer, Guerlain, Sisley ou Chanel, há mesmo justificação científica para os preços excêntricos que praticam? Estamos a pagar qualidade ou marca? Ciência ou vaidade?
O que os cosméticos de luxo fazem de bom… e de mau
As empresas de cosmética estão conscientes das preocupações que os consumidores têm com o envelhecimento. Isso significa que sabem o que queremos ouvir e obter. O site de beleza Byrdie explica que a elegância da fórmula dos cremes mais caros justifica muitas vezes o seu preço e dá o exemplo dos silicones que tornam os cremes suaves, como se deslizassem na pele. A questão é que silicones como a dimeticona ou ingredientes refletores de luz não contribuem em nada para a nossa pele — apenas permitem uma aplicação mais suave. Se formos a um supermercado e comprarmos um creme barato sem silicones, vamos perceber que é espesso e até pastoso. Os ingredientes hidratantes podem ser os mesmos, mas vamos sempre preferir o creme que tem a fórmula mais suave porque ingenuamente dá-nos uma sensação de melhor qualidade. É essa suavidade que, muitas vezes, estamos a pagar.
Por outro lado, geralmente quando falamos de marcas de luxo, falamos de marcas que incluem os seus próprios cocktails de ingredientes feitos em laboratórios exclusivos. Por outras palavras, são ingredientes que não vão ser encontrados nos corredores dos supermercados — e isto é bom na cosmética. Neste segmento, há mesmo marcas — como a Dior ou a Yves Saint Laurent — que já ganharam prémios Nobel pelos ingredientes que descobriram e que trouxeram avanços na ciência. E a verdade é que concorrentes mais pequenas não têm o dinheiro que as grandes marcas de luxo têm para pagar estes estudos que até podem ter efeitos notáveis na pele. Podemos quase imaginar as marcas de luxo como o motor que faz toda a cosmética girar: cobram valores altos pelos seus cremes mas com isso têm dinheiro para fazer estudos exclusivos e descobrir ingredientes que, mais tarde, vão também ser utilizados nas marcas mais baratas. Toda a cosmética ganha, assim como os consumidores.
No entanto, e este é o lado mais obscuro da cosmética de luxo, por serem as proprietárias dessas patentes e dessas descobertas, as marcas não precisam de revelar exatamente como, na prática, esses ingredientes se misturam. O que significa que um creme pode ter 90% de água e apenas 10% de ingredientes ativos e, ainda assim, são estes 10% que vão aparecer primeiro na lista dos ingredientes e vão justificar os três dígitos no seu preço.
O peso de consumidores e celebridades no mercado de luxo
Sejamos honestos: a maioria dos consumidores acredita que “mais caro” significa “melhor”. Mesmo que as promessas dos cremes mais caros sejam as mesmas dos cremes mais baratos. Grande parte do valor de uma marca de luxo baseia-se não tanto nos seus ingredientes mas noutros fatores como as embalagens, o marketing e o facto de nós, consumidores, continuarmos a colocar nas marcas de luxo um peso quase místico. É por isso que o consumidor final não se preocupa que a Estée Lauder detenha a luxuosa La Mer e a acessível Clinique. Ou que a L’Oréal Paris venda a cara Lancôme e a barata Garnier.
Como escreve o jonal norte-americano New York Times, as marcas de luxo vivem da fé que as mulheres têm naquilo que elas representam. Prova disso é o facto de nos armazéns de luxo Bergdorf Goodman, em Nova Iorque, os cremes que custam mais de 85€ representarem 25% das receitas das lojas. A marca La Prairie, em tempos, criou uma versão maior do seu Caviar Luxe Crème (que passou a custar 460€) porque era o produto mais vendido da marca em todo o mundo. Se as mulheres continuam a pagar preços excêntricos por um boião de creme, porque não hão-de as marcas de luxo praticar preços ainda mais excêntricos? Está tudo relacionado com o que o consumidor quer ser ao usar aquela marca.
“Marcas premium obrigam a preços premium“, declarou Romanowski ao já premiado site americano de notícias AlterNet, acrescentando que o preço dos cosméticos reflete a imagem que a marca quer ter. Há mais pormenores a engrossar o preço como as embalagens luxuosas mas, na grande maioria dos casos, o preço deve-se aos custos de marketing, à publicidade e aos nomes sedutores que vêm associados a essa marca. Romanowski dá o exemplo da Chanel: é preciso ter em conta as porta-vozes que a marca escolhe anualmente para dar a cara pelos seus cosméticos, como Nicole Kidman, Diane Kruger ou Keira Knightly, e que nos dizem “comprem isto e vão ficar parecidas comigo”. A verdade é que nenhuma delas vale só 5€ e isto justifica em grande parte os valores excêntricos que a marca pratica. A consumidora compra porque quer ser igual a essas porta-vozes e porque acredita na sua mensagem.
Há, afinal, cremes de luxo que realmente valem o seu preço? Claro que sim. Mas cabe ao consumidor fazer a triagem e determinar se um creme vale mesmo aquilo que custa através dos testes clínicos que a marca fez e dos estudos que desenvolveu ao longo dos anos. E nunca comprar um creme caro só porque é caro sem antes investigar o que a marca investiu na sua criação. Há muitos exemplos de cosméticos de luxo realmente bons e que justificam o porquê de serem tão dispendiosos.
O caso do icónico La Mer
O já lendário hidratante de La Mer é um bom exemplo daquilo que os consumidores têm de estudar antes de arruinarem o cartão de crédito numa perfumaria. Foi concebido pelo físico aeroespacial Max Huber depois de ter sofrido graves queimaduras químicas. Huber passou 12 anos a estudar a sua fórmula e fez mais de seis mil experiências com Macrocystis pyrifera (uma alga marinha encontrada no mar perto da sua casa, na Califórnia), até chegar ao creme final que ajudou a restaurar a sua pele queimada. Huber começou a vender a sua criação, chamando-a Crème de La Mer (ou seja, creme do mar) em 1965 e depois da sua morte, em 1991, a companhia Estée Lauder comprou a marca e tornou-a um dos mais lendários nomes de luxo do mundo. Há quem lhe chama o creme milagroso (em Portugal, o pote de 30 ml custa 159€) mas na verdade, além da alga patenteada por Huber, este hidratante contém cálcio, magnésio, potássio, ferro, vitaminas C, E e B12 e óleos de citrinos, eucalitpos, alfafa e girassol — todos bio-fermentados para um comprovado retrocesso no envelhecimento.
Na fotogaleria conheça outros cremes de luxo excêntricos à venda em Portugal ou online e o porquê do seu preço ser, afinal, tão elevado. Todos eles tiveram anos de estudos por trás, têm descobertas científicas patenteadas e efeitos comprovados naquilo a que se propõem — retardar o envelhecimento da pele.