O ministro do Trabalho e da Segurança Social esteve esta quarta-feira no Parlamento a apresentar o Orçamento na sua área de governação, mas com pouco mais a prometer, sobretudo aos parceiros à esquerda foi questionado sobre o fim do corte do subsídio de desemprego ou sobre a revisão do regime contributivo dos recibos verdes, pelo PCP e Bloco de Esquerda, mas pouco acrescentou ao que já se sabe e não se comprometeu com nada.
O mesmo em matéria de reformas antecipadas, com os partidos parceiros do Governo a pedirem mais para reformas antecipadas das longas carreiras contributivas, mas o ministro a declarar que admitir 40 anos como uma carreira que dá acesso a uma pensão completa é “uma opção insustentável”.
Para a direita, o ministro socialista reservou as picardias, até quando falou nas equipas de emergência do seu Ministério que estiveram no terreno a dar apoio às populações afetadas pelos grandes incêndios dos últimos quatro meses. Vieira da Silva diz que os técnicos eram os mesmo que o anterior Governo enviou para a requalificação. Mas ainda que garanta que não vão faltar recursos para apoiar as populações atingidas pelos fogos, o ministro assumiu que podem vir a existir “falhas nas respostas às populações”.
Incêndios: “Não posso dizer que não teremos falhas na resposta às populações”
É um ponto referido em todos os debates políticos, de todas as áreas de governação, nos tempos que correm e não falou na audição do ministro Vieira da Silva que garantiu que os apoios às populações afetadas pelos incêndios vão chegar com “sentido de rigor” e que o Ministério mobilizou equipas para o terreno, ainda que não garanta que não venham a existir falhas. “Não posso aqui dizer que não teremos falhas no terreno na resposta às populações. São de facto situações de enorme fragilidade que encontrámos”. O ministro referia-se ao trabalho de campo já feito, desde o incêndio de Pedrógão Grande, pelas “equipas de emergência” do seu Ministério que, garantiu, vai dar “essa resposta sem nenhuma hesitação“.
Ao mesmo tempo que admite a possibilidade da existência de “falhas” na resposta no terreno, o ministro ataca PSD e CDS: “As equipas de emergência do Ministério são compostas por técnicos, alguns foram aqueles que os senhores consideraram dispensáveis e colocaram na requalificação”. Não eram dispensáveis e a prova que não eram é que foram eles a dar essa resposta”. O ministro descreve que as situações encontradas pelos técnicos são de “enorme fragilidade” e de “grande isolamento”.
Reformas antecipadas: 40 anos como carreira completa é “opção insustentável”
O ministro considera que “a saída precoce é um direito, mas o objetivo é que as pessoas façam uma carreira contributiva equilibrada para si próprias e para o sistema”. Isto em resposta ao Bloco de Esquerda que, a propósito do novo regime das reformas antecipadas para as carreiras contributivas muito longas disse que ainda é “preciso estudar uma solução para defender os lesados do ex-ministro Mota Soares“, pedindo um “complemento de reforma” para as pessoas que viram as suas pensões cortadas. O PCP juntou-se as pedidos sobre as carreiras contributivas mais longas, mas o ministro foi claro ao dizer que “a consideração dos 40 anos como a carreira que dá acesso a uma pensão completa é um opção insustentável“. O ministro recusou mesmo “criar a ilusão dessa possibilidade”.
O Bloco de Esquerda, por seu lado, nas reformas antecipadas reclamou a eliminação do fator de sustentabilidade que diz ter-se tornado “numa penalização ilegítima”, a partir do momento em que a idade legal da reforma deixou de ser fixa. “Fasear a revisão do regime das pensões antecipadas foi a opção do governo, só que este faseamento não pode ser atirar para as calendas a eliminação do fator de sustentabilidade”, avisou o deputado José Soeiro que ainda acrescentou que “cada dia que ele se mantém, mantém-se uma penalização totalmente injustificada sobre as pensões”. O deputado do partido parceiro do Governo no Parlamento mostrou-se mesmo “preocupado que tenha havido várias declarações públicas que ponham em dúvida o cumprimento do objetivo de eliminação em 2018”. Mas não obteve qualquer resposta por parte do ministro, pelo menos neste debate.
Pensões: quem vai receber aumento e em quanto?
O ministro Vieira da Silva deu números para quem verá a sua pensão aumentar e em quanto. Todas as pensões até 857 euros terão um aumento à volta de 1,7%. As pensões entre 857 e 2570 euros terão um aumento de 1,2% (valor previsto para a inflação). As pensões entre 2570 e 5142 euros terão um aumento de 0,95%.
Esta primeira atualização acontece logo no início do ano e decorre da lei, e chegará a 2,8 milhões de pensionistas. O custo para as contas do Estado é de 357 milhões de euros.
Em agosto, mais uma vez, alguns pensionistas terão direito a um aumento extraordinário. Os pensionistas com pensões até cerca de 630 euros mensais terão direito a um aumento que – a contar com o aumento decorrente da lei que entre em efeito em janeiro – terá de perfazer um aumento de 10 euros. As pensões mínimas não contributivas, que não foram atualizadas entre 2011 e 2015, terão direito a um aumento para perfazerem os 6 euros. Esta medida custa 35,4 milhões de euros ao Orçamento do Estado de 2018.
Recibos verdes: 100 mil “proteção de mínimos”, avisa ministro
O ministro acusou o Governo anterior de ter colocado mais de 100 mil trabalhadores independentes – quando antes seriam cerca de 40 mil – a descontar o valor mínimo para a Segurança Social, o que levou a que estes trabalhadores passassem também a ter o mínimo de proteção social. Segundo o ministro, a maior parte dos trabalhadores destes trabalhadores teriam descontado valores inferiores a metade do valor do Indexantes dos Apoios Sociais (IAS), ou seja, perto de 200 euros.
Vieira da Silva diz que esta alteração foi feita de forma “pouco clara”, que deixou estes trabalhadores expostos, porque com a atual carreira contributiva estarão condenados a receberem pensões mínimas quando chegarem à idade da reforma.
“Pode parecer interessante, mas é uma opção irresponsável que condenou cerca de 100 mil trabalhadores, que descontaram pouco sem as pessoas perceberem qual o impacto que é uma proteção de mínimos”, disse.
Vieira da Silva disse ainda que irá apresentar até ao final do ano a revisão do regime de contribuições dos trabalhadores independentes, uma proposta que já deveria ter avançado durante o ano, e que tem sido adiada, apesar das propostas dos pedidos mais à esquerda desde pelo menos 2016.
Sobre isto, o ministro disse ainda que o objetivo é tentar garantir que não há aumento da carga contributiva sobre estes trabalhadores, mas a proposta ainda está a ser ultimada e trata-se de um dossier complexo: “Esta é uma proposta difícil do ponto de vista político e do ponto de vista técnico”.
Fim do corte do subsidio de desemprego sem garantias do Governo
Na reunião, o deputado José Soeiro (BE) questionou o ministro com o fim do corte de 10% no subsídio de desemprego. “Chegámos a acordo com o Governo para eliminar o corte em junho de 2017 para quem tinha subsídio mais baixo e para concretizar tudo em 2018. O Orçamento tem de dar acolhimento a esta discussão”, disse o deputado. Mas o ministro não respondeu, pelo menos lá dentro. À saída e em declarações aos jornalistas, Vieira da Silva não se comprometeu com a medida.
“Vamos ver no debate”, foi a resposta de Vieira da Silva quando questionada se havia ou não uma garantia dada pelo Governo de que esta medida seria aprovada.
“Reforço a ideia, que partilho, que já aqui foi defendida por outros membros do Governo, que um orçamento é um orçamento na sua globalidade, por isso vamos ver no conjunto das mudanças que eventualmente venham a ser discutidas se essa tem possibilidades de encontrar um consenso das senhoras e senhores deputados”, disse o governante.
A medida custaria aos cofres do Estado entre 40 a 50 milhões de euros.
Financiamento da Segurança Social: “Transferências extra acabaram porque sistema está melhor”
Já era conhecido, mas Vieira da Silva voltou a garantir que no próximo ano a Segurança Social vai deixar de receber a transferência extraordinária do Orçamento do Estado para equilibrar as contas do sistema, porque já não precisa. “Nós acabámos com a transferências extraordinária porque o sistema está melhor”, afirmou o ministro perante os deputados.
O tema levou a uma troca de palavras mais acesa – rara na audição desta tarde – entre o ministro e a deputada do PSD Inês Domingos. “Não conheço muitas formas piores de tratar o tema da sustentabilidade do que aquela que fez”, disse o governante à deputada, referindo-se às questões da social-democrata sobre se iria ter direito à sua pensão quando chegasse à reforma. E Vieira da Silva disse ainda que “são sempre aqueles que são adversários do sistema público de sistema social” que usam estes argumentos.
Vieira da Silva disse mesmo à deputada “não se enerve” e logo de seguida, de forma irónica, pediu-lhe que a deixasse falar porque durante a “brilhante intervenção da deputada” o ministro “não disse uma palavra”.
O ministro apresentou ainda aos deputados a consignação à Segurança Social de 2 pontos percentuais da receita estimada com IRC, a um ritmo de 0,5 pontos percentuais por ano até atingir os 2 pontos percentuais em 2021.
A Segurança Social irá receber metade desta transferência em 2018, e a segunda parte correspondente a 2018 só em 2019, na altura da liquidação do imposto. A previsão do Governo é que a Segurança Social receba já 70 milhões de euros este ano.
Subsídio de doença: “Não atingimos objetivos”
Foi o PSD que levantou a questão, com o deputado Adão Silva a apontar o aumento constante dos gastos com subsídios de doença e a “manifesta incapacidade do Governo em ser capaz, com rigor, de administrar esta prestação e dá-la a quem precisa”. Entre os dois últimos orçamentos apresentados por este Governo, a despesa com esta prestação subiu 179 milhões de euros, atira o deputado social-democrata ao ministro Vieira da Silva que intervém a seguir para admitir: “Reconheço que não atingimos os objetivos”.
O ministro da Segurança Social não especifica como o Governo pretende fazer para apertar esta fiscalização da “utilização abusiva” da prestação, apenas diz que quer “ir mais longe, utilizando critérios mais finos, mais dirigidos para os segmentos onde o risco de utilização indevida é maior”. Mais à frente no debate, a secretária de Estado Cláudia Joaquim revelou que, ainda assim, até setembro último, foram feitas mais de 224 mil juntas médicas, o que se traduz num aumento da fiscalização face aos dois anos anteriores.