A questão foi levantada pelo Bloco de Esquerda, na audição parlamentar do ministro da Segurança Social sobre o Orçamento para o próximo ano, com o deputado José Soeiro a apontar a falta de proteção para os pensionistas com carreiras longas, que se reformaram de forma antecipada, durante a troika. Tiveram cortes “que muitas vezes ultrapassavam os 60% e os 70% e que ficaram com pouco mais de 200 euros depois de uma vida de trabalho”, disse o deputado que pediu uma solução para que “ninguém que descontou durante décadas e esteja abaixo do limiar da pobreza continue assim em 2018”. E o ministro Vieira da Silva acabou por lhe dar resposta, logo de seguida: “Existe espaço para discutir se outros pensionistas com carreiras contributivas sólidas e longas deverão ter uma opção semelhante” ao complemento solidário para idosos (CSI).

A compensação de reforma para idosos com mais baixos rendimentos, foi criada no primeiro Governo de Sócrates — era Vieira da Silva o ministro com a pasta da Solidariedade Social — e é um complemento de pensão para idosos em idade de reforma e com reformas abaixo do limiar da pobreza. Agora, o ministro admite que possa ser alargado a mais pensionistas com reformas baixas, ainda que não tenham atingido a idade de reforma, como pede o Bloco de Esquerda. Mas por agora é só mesmo uma abertura de porta, ainda falta o acerto que deve acontecer no debate do Orçamento na especialidade, tendo em conta esta manifestação de abertura por parte do ministro da Segurança Social.

Já noutra fase da audição, Vieira da Silva defendeu o “investimento e a promoção do Complemento Solidário para Idosos como resposta estrutural e decisiva para melhorar o sistema de proteção social“. No Orçamento para este ano, o Governo prevê uma despesa efetiva de 217 milhões de euros com o CSI, um aumento de 5% face ao que prevê executar no total deste ano. O ministro sublinhou que o Orçamento do próximo ano já prevê que o alargamento do CSI aos pensionistas por invalidez. E, no final do debate, questionado pelos jornalistas, Vieira da Silva não quis detalhar mais, dizendo que ainda está tudo em aberto, mas que “essa filosofia [de alargar o CSI] não só foi aceite como já foi proposta. Temos uma proposta dessa natureza”, disse em relação à que já consta no Orçamento.

Ainda sobre pensões, o ministro voltou a ser questionado pelo PSD sobre a diferença que existe no aumento extraordinário para este 2018: 10 euros em agosto para todos os pensionistas, mas apenas seis euros para pensões mínimas. A deputada social-democrata Clara Marques Mendes questionou sobre a “descriminação aos pensionistas com as pensões mais baixas das mais baixas” e Vieira da Silva garantiu que “não há uma descriminação negativa, todos os pensionistas vão ter um crescimento das suas pensões”. Ainda atirou: “Muitos pensionistas com pensões muito baixas, 700 mil, não tiveram nenhum aumento no tempo dos vossos governos”.

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O tema continua a incendiar ânimos entre o ministro e a direita e desta vez não foi diferente. No CDS, Filipe Anacoreta Correia a acusar o ministro de “não assumir a paternidade da austeridade. Se não é o pai da austeridade é avô da austeridade“, disse o deputado a Vieira da Silva que, antes dele, tinha feito referência às pensões baixas que “estiveram 4 ou 5 anos congeladas” na anterior legislatura.

E à direita a troca de palavras não ficou por aqui, Vieira da Silva também reagiu quando o PSD, ainda pela deputada Clara Marques Mendes, quis puxar dos louros da governação anterior, PSD/CDS, e disse ser “importante perceber que a reforma da legislação laboral teve o seu efeito positivo”. E depois desafiou o ministro: “Sabendo que os parceiros de coligação do Governo têm vindo a reclamar uma reversão da legislação laboral, questiono se vai ou não ceder a esta chantagem dos parceiros” e reverter essa reforma do Governo anterior. Vieira da Silva respondeu também com um desafio: “Já agora gostava de explicar as reformas que fizeram que estão agora frutificar num crescimento do emprego que não acontecia há décadas”. E ainda com um ataque ao PSD, acabando por não dizer o que fará de concreto: “Faremos as mudanças que acharmos que o país e o mercado de trabalho precisam. Não cederemos a chantagem nenhuma, nem às vossas, das bancadas da oposição”.

Vieira da Silva sem brindes à esquerda e a admitir “falhas” na ajuda a quem sofreu com fogos

Apesar de o rebuçado praticamente no início do debate (ao contrário do nada que deu à esquerda na primeira audição, quando explicou o Orçamento da Segurança Social no Parlamento), Vieira da Silva acabou por ouvir reparos da esquerda. No Bloco, José Soeiro disse que “no setor privado está tudo por fazer no combate à precariedade”, admitindo que foram dados “passos no público e alguns até no privado, com o reconhecimento dos falsos recibos verdes”. Mas depois atacou pelo flanco da direita e atirou que “continua a ser possível, por decisão do PSD e CDS [na anterior legislatura], que se mantenha na legislação laboral que um jovem que esteja à procura de trabalho tenha acesso a uma função permanente mas em trabalho precário”.

O ministro respondeu por poucas palavras, começando por discordar do deputado da bancada parceira deste Governo: “Não é verdade que nada foi feito no setor privado”. Mas também não especificou mais sobre o “o caminho que está a ser feito” nesse setor e que, admitiu “ainda pode ser aprofundado. E o Governo está disponível para o fazer”. E também acabou por dar um não à esquerda. José Soeiro disse que, no debate da especialidade, o Bloco vai apresentar uma proposta de alteração para agravar a Taxa Social Única dos contratos a prazo. Lá dentro, Vieira da Silva não respondeu, mas aos jornalistas acabou por explicar depois: “Não me parece que haja muitas condições para o Orçamento entrar nesse terreno, nesta fase”.

Vieira da Silva também falou na nova Prestação Social de Inclusão, para dizer que é “um terreno relativamente novo” mas que as pensões que existiam “nesta área eram uma cópia insuficiente do que existia nos outros regimes de proteção social”. E deixou as restantes explicações para a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, que disse que “a nova prestação pode ser melhorada”, admitindo que “não tem dúvidas disso”, mas que “isto” é “até onde se pode ir agora”. Ainda se virou para o PSD por “ter a lata” de falar agora, “quando não a criaram” no Governo. Não criaram porque essa não era a vossa política”, disse. À direita, as bancadas ofenderam-se com o tom e exigiram desculpas. Foi o ministro que veio serenar os ânimos, garantindo que não tinha havido “intenção” de Ana Sofia Antunes em ofender os deputados.

Este artigo foi atualizado 20h30 com declarações do ministro aos jornalistas no final da audição.