O ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, pouco adianta sobre o que vai acontecer em concreto com o Infarmed e não responde o que será feito caso os trabalhadores não aceitem ir para o Porto, mas, em resposta ao Observador, lembra que há tempo ainda pela frente e que o processo envolverá os funcionários, com a garantia de “estabilidade pessoal e profissional”.

“Foi definido um tempo suficientemente alargado para uma análise detalhada deste processo, o qual envolverá os profissionais com a garantia de que serão parte ativa no processo de decisão e de construção das soluções mais adequadas”, afirmou Adalberto Campos Fernandes, em resposta por escrito, acrescentando que “foram ainda reafirmadas aos trabalhadores todas as garantias de estabilidade pessoal e profissional“. O governante rematou dizendo que “este é, aliás, um requisito obrigatório para o sucesso de qualquer transformação”.

O ministro da Saúde explicou ainda que a mudança de parte da Autoridade do Medicamento para a Invicta se trata de uma “opção política”, lembrando que o XXI Governo Constitucional assumiu, no seu programa de Governo, “como prioridade política a descentralização tendo em vista a coesão territorial e a diversificação dos polos de desenvolvimento”, assim como a “maior equidade nas oportunidades de valorização do país através da desconcentração de entidades e serviços”. “Trata-se, por isso, claramente de um exercício de opção política.”

Questionado sobre quando é que foi iniciado este debate e tomada a decisão, Adalberto Campos Fernandes não esclareceu, referindo apenas que a opção da descentralização “tem vindo a ser ponderada ao longo do tempo” e repetindo que, “no caso específico em apreciação, acresce o reconhecimento de competências existentes na região norte do país, as quais ficaram bem expressas durante o processo de candidatura ao acolhimento da sede da Agência Europeia do Medicamento”.

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“Afirmada a intenção política abre-se agora um espaço de diálogo, com todos os agentes envolvidos, no sentido de consensualizar as melhores opções que tenham como prioridade garantir a estabilidade e a valorização dos profissionais bem como a qualidade reconhecida dos serviços.”

Quando aos custos de transição associados à eventual construção de mais um laboratório no Porto, à contratação de mais pessoal — que Rui Moreira destacou, na terça-feira, como uma consequência positiva desta operação — , ou acréscimo nos custos com o pessoal para compensar deslocações, Adalberto Campos Fernandes apenas respondeu que “serão reduzidos uma vez que a deslocalização será parcial, faseada e contará com a disponibilidade de instalações já existentes“. E rematou que “do ponto de vista político, as vantagens da descentralização compensarão o investimento associado a este processo”.

Também o secretário de Estado adjunto e da Saúde disse esta manhã que esta é uma “decisão estrutural” e que “não foi uma decisão tomada de forma simples, nem por impulso”.

Decisão apanhou muitos de surpresa

Mas o que é certo é que apanhou muitos de surpresa. O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, garantiu ter conhecido a decisão apenas às 8h35 de terça-feira, por telefone. A presidente do próprio Infarmed, Maria do Céu Machado, citada pelo Público, disse que ficou a saber da decisão também na manhã de terça-feira por telefone.

E os trabalhadores, esses, souberam pelas notícias: “Fomos apanhados de surpresa”, dizia, na terça-feira ao final da tarde ao Observador Rui Spínola, presidente da Comissão de Trabalhadores do Infarmed. “Uma decisão desta natureza, com o impacto que tem na vida das pessoas, não pode ser tomada de forma tão extemporânea”, acrescentava, adiantando que esta “não é uma decisão técnica, não existe qualquer parecer técnico”.

A comissão de trabalhadores marcou logo um plenário para esta quarta-feira e já hoje, pela hora de almoço, Rui Spínola fez saber que foi preenchido pelos funcionários um inquérito sobre a disponibilidade de irem trabalhar para o Porto e que os resultados tinham sido enviados para o ministro, em carta fechada.

Trabalhadores do Infarmed fizeram inquérito sobre mudança para o Porto

O que muda, quando muda, para onde muda?

Também não ficou ainda completamente clara a forma como se processará a deslocalização. O ministro da Saúde disse que iria ser constituído um grupo de trabalho para “definir o como, o quando e de que maneira se vai fazer” a deslocalização do Infarmed, sendo que “nos primeiros tempos”, será mantido em Lisboa um polo regional e “a instalação no Porto será feita de forma progressiva”. O objetivo, acrescentou, é que “daqui a dois, três anos, 70% ou mais dos recursos estejam na cidade do Porto”. E apontou o início da mudança para 1 de janeiro de 2019.

Rui Moreira falou em transferência da sede do Infarmed e da “parte significativa dos serviços”. E a presidente do Infarmed, ao Público, disse que “a ideia é ter dois polos, um em Lisboa e outro no Porto” e acrescentou que “o volume de negócios do Infarmed e o nível de competência que tem não permite que, de repente, uma agência destas mude de uma cidade para outra. Não poderão ser feitas grandes divisões porque as pessoas trabalham em conjunto”, disse.

Trabalhadores do Infarmed souberam da mudança pelos jornais e estão “preocupados”

A Câmara Municipal do Porto pôs à disposição do Infarmed os mesmos três edifícios que tinha oferecido para acolher a Agência Europeia do Medicamento: Palácio dos Correios, nos Aliados, Palácio Atlântico, na Praça D. João I, ou um novo edifício na Avenida Camilo Castelo Branco. O Observador soube que a ideia é que o Infarmed venha a instalar-se no Palácio dos Correios.

A notícia da mudança do Infarmed para o Porto foi avançada pelo Jornal de Notícias ao início da tarde de terça-feira, um dia depois de a Invicta ter ficado em sétimo lugar na lista de candidatas à nova sede da Agência Europeia do Medicamento (EMA), e confirmada horas mais tarde pelo ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes.

Questionado sobre se esta decisão relativa à deslocalização do Infarmed teve alguma ligação à derrota da candidatura do Porto à EMA, Adalberto Campos Fernandes preferiu responder que a resolução “significou o reconhecimento do enorme trabalho que a região do Norte do país e o Porto tiveram com a candidatura à EMA, uma candidatura que prestigiou o país e demonstrou vitalidade”, tendo evitado uma segunda vez a questão ao dizer que a decisão “é o reconhecimento de que Portugal é um todo e que se defendemos a descentralização temos de ser coerentes com isso“.

O Infarmed, criado em 1993, é atualmente presidido por Maria do Céu Machado, tem uma dotação orçamental de 65 milhões de euros, 350 funcionários e mais de 300 peritos a colaborar com os seus serviços.