“Amo, amo, amo, a minha irmã e o meu cunhado”. A frase é de Elizabeth Jane Robinette Flores, irmã de Louise Turpin — a mãe das 13 crianças mantidas em cativeiro em Perris, cidade no condado de Riverside, na Califórnia. Foi escrita num comentário em resposta a uma das dezenas de fotografias daquela que tentava aparentar ser uma família feliz, que o casal publicava numa página do Facebook que tinha em conjunto.
Numa entrevista dada ao programa “Good Morning America” do canal ABC News, desta quarta-feira, Elizabeth Flores relatou os pormenores da relação (ou ausência dela) com a família Turpin — que não sugere ser a de alguém que ‘ama, ama, ama’ a sua irmã e o seu cunhado. Flores quis deixar claro perante os sobrinhos e sobrinhas que “durante anos” implorou para ver as crianças e “toda a família”, mesmo que através de videochamada.
“Nós nunca fomos autorizados a fazer parte da vida deles”, disse Flores, admitindo que deixou de ter uma relação com a irmã há 20 anos. Falavam por telefone “de vez em quando”, por vezes, de ano a ano. Na altura em que o casal vivia no Texas, Flores chegou a ir a casa da família mas não passava da entrada. “Nunca havia nenhuma criança, só ela e o David. Eu dizia sempre: ‘Quem me dera que trouxesses as crianças'”.
“Se eu ia tomar banho, ele ia lá”. Irmã de Louise recorda a altura em que viveu com o casal
Flores recuperou ainda memórias macabras do tempo em que viveu durante uns meses com a irmã e com o cunhado, David, enquanto andava na universidade, no Texas — onde os Turpin viveram até 2010, até se mudarem para a Califórnia. Nessa altura, o casal só tinha quatro filhos e o mais velho andava na escola primária.
Ele [David] fez coisas que me deixaram desconfortável. Se eu ia tomar banho, ele ia lá e via-me a tomar banho. Era como uma piada. Mas ele nunca me tocou, nem nada”, contou Flores na entrevista ao “Good Morning America”.
Flores revelou ainda que nunca contou episódios como estes a ninguém porque era “nova” e estava “assustada”. A irmã de Louise reconheceu que, na altura, o casal era muito “rigoroso” mas nunca viu “algum tipo de abuso”. “Agora que sou adulta, olho para trás, vejo coisas que não via na altura”, admite Flores.
“‘Meu Deus, eles estão tão magros’ e ela ria-se”. Relatos de outra irmã de Louise
A “aparência frágil” e os sinais de subnutrição das 13 crianças não foram só detetados pelas autoridades que as encontraram “acorrentadas às suas camas com correntes e cadeados, na escuridão e num ambiente com cheiros nauseabundos”. No dia a seguir ao caso ter sido descoberto, a polícia revelou que a filha de 17 anos — que conseguiu fugir através de uma janela e denunciar a situação às autoridades — “parecia ter 10” devido ao seu “tamanho pequeno” e “aparência magra”. Uma fonte policial revelou à NBC News que as crianças só comiam uma vez por dia e tomavam banho duas vezes por ano.
É um facto — visível nas fotografias partilhadas pelo casal na página do Facebook que tinham em conjunto — reconhecido por Teresa Robinette, outra irmã de Louise. Não só o reconhece, como várias vezes confrontou a mãe das crianças. “Meu Deus, eles estão tão magros”, costumava dizer Robinette. “Ela [Louise] ria-se“, conta agora, dizendo que a irmã apresentava uma justificação: “Bem, o David é tão alto e magro. Eles vão ser como eles”.
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Robinette também confirmou o que a irmã, Flores, dissera no que toca ao rigor com que educavam as crianças: “Não eram autorizados a namorar. Eles não tinham uma vida social. Não tinham permissão para ver televisão. Não podiam falar ao telefone, ter amigos, coisas assim. As coisas normais que as crianças fazem”, revela esta outra irmã de Louise. Robinette contou ainda que a irmã fugiu de casa quando tinha 16 anos para casar com David, o pai das crianças, que na altura tinha mais oito anos do que ela.
Antigo vizinho conta que a família “era como um culto” e que as crianças pareciam robôs
Mike, antigo vizinho da família Turpin e que não quis revelar o último nome, é médico e, por isso, costumava chegar a casa durante a madrugada. Em muitas dessas vezes, viu cenas macabras entre a meia-noite e as três da manhã dentro do número 160 da Rua Muir Woods, em Perris, que lhe permitiram chegar a uma conclusão: a família “era como um culto”.
Eles marchavam para a frente e para trás durante a noite. A luz estava sempre ligada durante todo o tempo e eles [os pais] faziam as crianças marchar para a frente e para trás”, contou Mike ao The Telegraph.
Mike revelou ainda que a sua mulher costumava chamar às crianças “clones”. “Eles falavam de forma robótica, de uma forma monótona e ao mesmo tempo”, descreve. Apesar de o antigo vizinho ter assistido várias vezes a estas cenas macabras, nunca sentiu a necessidade de chamar a polícia.
Louise e David estão presos preventivamente sujeitos a uma fiança de nove milhões de dólares (cerca de 7,3 milhões de euros). Foram acusados de nove crimes de tortura e dez crimes de abuso de menores. O casal vai ser ouvido esta quinta-feira em tribunal — o que deverá trazer respostas às perguntas que ainda estão por responder.
O que falta saber sobre o caso dos pais que acorrentaram os 13 filhos na Califórnia
(Artigo atualizado às 19h00 com a informação revelada pela fonte policial à NBC News)