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Eurovisão: como as televisões internacionais geriram 5 casos de plágio

Este artigo tem mais de 5 anos

Antes de Piçarra até houve quem fosse acusado de se plagiar a si próprio. O que aconteceu noutros países quando foram detectados casos de plágio entre candidatos a festivais da canção.

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Joao Pedro Correia

Joao Pedro Correia

Nem o festival em que as canções têm de ser “obrigatoriamente originais e inéditas” escapou ileso à polémica de plágio. O mais recente caso teve como desfecho a desistência de Diogo Piçarra do Festival da Canção, depois de o tema que interpretou e compôs — intitulado “Canção do Fim” — ter sido comparado a uma canção religiosa que também foi gravada e editada pela Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Uma vez que o cantor de 27 anos anunciou a saída do concurso, a RTP limitou-se a decidir que o tema seria substituído. Mas nas edições anteriores, os canais que organizaram os concursos noutros países tiveram de tomar decisões e, nalguns casos, eliminar canções envolvidas em suspeitas de plágios.

O primeiro caso flagrante remonta a 1968. Odd Borre era um cantor pop norueguês habituado às andanças da Eurovisão, onde tentava entrar há quatro anos sem nunca ter conseguido mais do que o terceiro lugar. Naquele ano, a sina de Odd Borre iria mudar: não só viria a interpretar a canção com o maior título de sempre na história do festival, como também iria finalmente representar a Noruega na Eurovisão. A música “Jeg har aldri vært så glad i noen som deg” (algo como “Nunca gostei tanto de alguém como de ti”) tinha três minutos e foi escrita por Kari Nergaardfoi. Só havia um problema: era muito parecida — quase igual mesmo — a “Summer Holiday” de Cliff Richard.

[Oiça aqui a música com que Odd Borre foi a concurso e aquela que foi acusada de plágio]

A Norsk Rikskringkasting AS (NRK), que é a televisão pública norueguesa, fez o trabalho de casa e chegou à conclusão que a canção com o título gigante não podia ir a concurso por suspeitas de plágio. Mas Odd Borre, que já era conhecido da casa, não foi eliminado: em vez disso, a NRK deu uma segunda oportunidade ao cantor e substituiu a polémica canção por outra do mesmo artista. “Stress”, escrita por Tor Hultin e Ola B. Johannessen, lá ganhou o  Melodi Grand Prix 1968 — o equivalente norueguês ao nosso Festival da Canção — e seguiu para concurso na Eurovisão. Mas ficou-se pelo 13º lugar. Nesse ano, Portugal — com Carlos Mendes a interpretar a música “Verão” — ficou dois lugares acima.

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[Veja no vídeo a canção que se assemelha à que foi originalmente apresentada pela Noruega]

https://www.youtube.com/watch?v=-DxqdIA75sc

“Não podia proteger os direitos de autor”

Há cinco anos as suspeitas de plágio recaíram sobre Elitsa & Stoyan, um grupo feminino muito aclamado pelos búlgaros desde 2007, quando as duas cantoras conquistaram a pontuação mais alta alguma vez conquistada pelo país no concurso. Ainda com as alegrias da canção “Water” na memória, os búlgaros escolheram Elitsa & Stoyan para regressarem à Eurovisão na esperança de repetirem a proeza. Mas a Bulgária encontrou um obstáculo pelo caminho: “Kismet”, a canção eleita, tinha problemas de direitos de autor. E foi afastada da corrida.

“Kismet” foi apresentada à Televisão Nacional da Bulgária (BNT) como tendo sido escrita por Elitsa Todorova e  Bistritsa Babi. No entanto, houve uma terceira pessoa chamada Jonatan Tesei envolvida no desenvolvimento da letra da canção. Como o canal de televisão não sabia desse envolvimento, “não podia proteger os direitos de autor” dessa terceira pessoa porque “os direitos de autor têm de pertencer à radiodifusão de acordo com as regras do Festival Eurovisão”: como esses direitos não tinham sido negociados entre Jonatan Tesei e a BNT, a Bulgária temia ser desclassificada do festival e portanto decidiu jogar pelo seguro.

O problema não foi difícil de resolver. “Kismet” tinha ficado empatada com uma outra canção do grupo Elitsa & Stoyan chamada “Samo shampioni” — porque, na Bulgária, a televisão pública escolhe um único artista e ele apresenta três canções que vão a votos. Ambas tinham tido a mesma pontuação na soma dos votos dados pelo júri e pela população, mas “Kismet” foi a eleita porque tinha recebido maior pontuação com o televoto. Perante as confusões com essa canção, “Samo shampioni” avançou. Mas nem sequer chegou à final da Eurovisão.

Em 2015, uma nova polémica, desta vez em sueco: a canção vencedora do Festival Eurovisão foi acusada de plagiar uma famosa música do DJ francês David Guetta. Måns Zelmerlöw conquistou o concurso com uma música chamada “Heroes”, mas durante meses a canção foi alvo de duras críticas por ser alegadamente parecida com a música “Lovers On The Sun”, lançada em 2014.

[Oiça aqui a canção sueca que venceu a Eurovisão em 2015.]

A semelhança parecia de tal modo evidente que até Avicii, DJ sueco que é também co-produtor de David Guetta, reagiu à polémica: “Acho que foi uma ótima e excelente versão da música do David Guetta. Na verdade, acho que foi uma versão pior da música de David Guetta. Mas foi divertido termos ganho, pelo menos. Estou feliz por ter tido um impacto, mesmo que seja a música do David. Mas eu sou um co-escritor, para mim é um pouco mais difícil. Estou feliz por a Suécia ter ganho. Foi divertido ver a Suécia novamente na imprensa. Primeiro o casamento real e logo a seguir a Eurovisão. Parecia que a Suécia estava a tornar-se numa superpotência”.

Måns Zelmerlöw já estava habituado a ver comparada a canção com que venceu a Eurovisão. Quando Michele Perniola, que também tinha entrado na corrida para representar a Suécia na Eurovisão, fez as mesmas acusações no Twitter, Måns respondeu: “Já tivemos esta discussão antes e não penso que sejam semelhantes. Talvez os pilares da música sejam parecidos, mas acho que se analisarmos os tons, não há dois iguais seguidos. Não consigo ver como poderia ser plágio. Lamento que [a Michele Perniola] pense isto”. O caso não foi longe, nem sequer chegou a instâncias legais: David Guetta nunca comentou o caso, Avicii até brincou com o sucedido e Måns Zelmerlöw aprendeu rapidamente a gerir os danos nas redes sociais.

[Esta é a canção de David Guetta que foi comparada a Heroes]

“Se isto não é um escândalo, é-o para mim pessoalmente”

Ao fim de quase cinco décadas, a Noruega voltou a estar no centro das polémicas e uma vez mais por causa de suspeitas de plágio. Só que, desta vez, o caso foi ainda mais peculiar: Freddy Kalas, uma estrela em ascensão no país, não teria plagiado a canção de outro artista, mas antes imitado uma música dele próprio que já era conhecida do público. Tal como no Festival da Canção, o regulamento do Melodi Grand Prix — que decide quem vai representar a Noruega na Eurovisão — só admite peças que sejam “inéditas e originais”, ou seja, que nunca tenham sido publicadas antes da cerimónia do concurso e que tenham sido criadas propositadamente para o festival.

[Esta foi a primeira aposta de Freddy Kalas]

Freddy Kalas - Happy Rush - clip from Good Evening Europe on Vimeo.

A canção com que Freddy Kalas pretendia participar no Melodi Grand Prix em 2016 chamava-se “Happy Rush”, mas todos concordavam — inclusivamente a televisão pública norueguesa — que era demasiado parecida com “Cannabus”, que o próprio tinha lançado em 2011. Por isso, a NRK reuniu com o cantor e impediu-o de continuar no Festival da Canção norueguês com aquele tema. Jan Fredrik Karlsen, da administração da NRK, justificou a decisão numa entrevista: “Os refrões são muito parecidos. Esta é uma competição de composição de canções, portanto as músicas devem ser totalmente originais. É este o acordo que fazemos com os artistas. Se isto não é um escândalo, é-o para mim pessoalmente”. Apesar disso, Freddy Kalas recebeu uma segunda oportunidade: pôde continuar no concurso, desde que apresentasse outra canção para ir a votos no país.

[Esta é a canção com que Freddy Kalas acabou por participar]

Sem nunca comentar o caso, o cantor seguiu em frente: apresentou uma segunda canção chamada “Feel Da Rush” e com ela conseguiu alcançar a pré-seleção de quatro canções. Não foi mais longe, no entanto: quem levou a melhor foi “Icebreaker” de Agnete, que ficou em 13º lugar num ano em que Portugal não participou e em que o grande vencedor foi a Ucrânia. Entretanto, a polémica não parece ter abalado a carreira de Freddy Kalas: “Feel Da Rush” chegou a ser a segunda canção mais ouvida na Noruega.

“Temos que reagir a estas situações como inaceitáveis”

Estas questões de plágio não são apenas conversas de adultos: até o Festival Eurovisão Júnior já teve de lidar com problemas de plágio. Em 2014, a  Natsionalna Telekompaniya Ukrayiny (NTU), televisão pública ucraniana, examinou as 2o canções finalistas do concurso para crianças e descobriu que uma delas não era original. “Tse Ukraina”, interpretada por Polina Ryzhak, não passava de um cover de uma canção de Hannah Montana — personagem encarnada por Miley Cyrus — chamada “Nobody’s Perfect”, lançada em 2006.

[Esta é a canção plagiada]

O júri foi tão implacável como se o caso tivesse acontecido num concurso para adultos. Mykhailo Nekrasov, presidente do júri, disse: “Polina Ryzhak é, claro, uma jovem talentosa, mas quando se trata da imagem da Ucrânia numa competição internacional temos que reagir a estas situações como inaceitáveis. Admitimos que um jovem artista possa ser vítima da ação injusta do compositor da música”. A posição de Polina Ryzhak foi então tomado pelo grupo “Fresh”.

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