Cresci a ouvir uma lengalenga que nem sabia bem o que significava mas que me fazia muito sentido – não lamentar o passado, não ansiar o futuro, viver apenas o presente. Era a conversa das nossas mães — e da minha que me dizia para não sofrer por antecipação — nos primórdios do “mindfulness” que estava ainda longe de ser uma palavra do momento. No início do ano, o site Pinterest partilhou que os pins para “viver o momento” tinham aumentado 464%, o que mostra um interesse cada vez maior neste tema, talvez porque estamos finalmente a ganhar consciência do quão desconectados estamos da vida presente.

E este é um sentimento provavelmente comum – perder demasiado tempo preocupado com eventos que vão acontecer no futuro ou a sofrer por coisas que aconteceram no passado. Acrescentando a isto o facto de que passamos o dia rodeados por distrações digitais e nem damos pela vida passar. Mas viver-se em piloto automático não é forma de estar. Como Vasco Gaspar, autor do livro Aqui e Agora disse ao Observador, “se a minha cabeça está no passado ou no futuro, estou a perder a vida”.

Mas como é que podemos, afinal, adaptar esta capacidade de estar presente ao nosso dia-a-dia?

Quatro passos para estar presente no dia a dia

Leah Santa Cruz, professora de meditação e “mindfulness” e uma das profissionais do programa Mindsail, disse ao site Byrdie que há quatro pequenos gestos que podemos fazer no dia a dia e que nos ajudam a estar presentes:

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  1. Meditar: é a melhor forma para “desligar” de tudo e treinar o cérebro a estar presente. E tem benefícios a longo prazo: melhora a concentração, a saúde física e cardíaca, reduz o stress e retarda o envelhecimento.
  2. Respirar: as técnicas de respiração são óptimas para momentos de ansiedade, mas Leah diz que a respiração consciente é uma boa forma de concentrar a energia e acalmar a mente, o que ajuda a ter uma respiração profunda e estável.
  3. Parar de pensar demasiado: estamos normalmente tão presos aos pensamentos que nos esquecemos de ver e viver o que está realmente à nossa frente. Leah diz que quando estamos a fazer algo, devemos concentrar-nos no que vemos, no que cheiramos ou provamos ou sentimos e no que está à nossa volta.
  4. Praticar a gratidão: sermos gratos pelas coisas que temos é uma forma de colocar os pés no chão. E quando refletimos sobre as coisas por que agradecemos, aproximamo-nos do presente. Experimente registar três coisas por que está grato todos os dias.

Fazer pausas dos telefones e das redes sociais

A maioria das pessoas está viciada nos seus telefones. Passamos o dia agarrados a eles, dependemos de mil e uma aplicações e até para falar com os nosso amigos usamos um chat ao invés de bebermos um café com eles no fim do dia de trabalho. Alexandra Frey, uma das fundadoras do The Mindfulness Project (que dá cursos e worshops) disse ao jornal The Telegraph que não são os telefones que são maus, mas sim o nosso comportamento compulsivo. Assim, não temos de deixar de os usar nem entrar numa espécie de detox extremista em que os desligamos por completo, mas sim limitar o seu uso. Sempre que for pegar no seu telefone para ver o Instagram ou o Facebook pare para pensar se precisa mesmo de o fazer ou se está apenas a fazê-lo para se abstrair do que o rodeia. “Essa pausa cria um espaço entre o estímulo e a resposta e é nesse momento em que paramos para pensar que libertamos a mente”, explica.

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Trocar os gritos por um momento de pausa

Um dos momentos mais comuns em que o “mindfulness” pode ajudar é nos serões com a família. E Alexandra Frey dá o exemplo de alguém a discutir com o pai e a ficar cada vez mais irritado e a reagir como toda a gente reage – a gritar. Podemos perceber que estamos irritados e escolher a raiva como resposta. Ou podemos escolher uma resposta diferente e, ao invés de gritar, baixar a voz e, com isso, fazer com que o pai também tenha de baixar a sua para ouvir. Estes são os novos caminhos que a prática do “mindfulness” ajuda a criar nas nossas vidas de acordo com Frey.

Tiffany Cruikshank, fundadora do Yoga Medicine explica que o “mindfulness” não é um objectivo mas sim uma forma de estar que nos ajuda a alcançar os objectivos. Assim, não é o “mindfulness” que faz com que já não tenhamos vontade de gritar com o nosso pai mas sim uma forma de percebermos que gritar não resolve nada no momento.

Não ter expectativas

Uma das coisas que mais ansiedade cria são as expectativas que colocamos no futuro e isso faz com que não consigamos apreciar o presente. Tiffany Cruikshank diz que o “mindfulness” ajuda exatamente a libertar desta ânsia em controlar o futuro. “Temos que nos libertar dos planos e realmente apreciar o momento como ele está sem ter que o corrigir ou esperar que seja diferente”, explica. Com a prática e com o tempo, vai poder começar a ver diferenças na sua vida e o impacto que esta forma de viver tem.

Aplicar o “mindfulness” no trabalho

Muito se tem falado sobre os benefícios do “mindfulness” no trabalho. Mas esta ideia do estar presente no momento também significa que não se pode preocupar com o que vai acontecer amanhã nem concentrar-se na reunião que correu mal ontem. A revista Forbes diz que mudar este “chip” faz com que se consigam tomar melhores decisões, diminui o stress e também melhora a criatividade, o foco e a produtividade. E dá quatro exercícios simples, idênticos aos do dia-a-dia mas aplicados no trabalho:

  1. Crie um mantra para si próprio: não espere até ligar o seu computador para se concentrar. Comece a sua manhã com uma mensagem positiva ou um mantra e repita-o para si durante o dia. Pode ser qualquer coisa como: “Eu sou forte e sou capaz” para se conseguir manter calmo e focado antes de uma grande apresentação ou reunião. Tem de se perguntar a si próprio como é que quer estar no mundo e a partir daí crie os seus mantras diários para lá chegar.
  2. Concentre-se na sua respiração: acalmar a respiração vai colocá-lo num estado calmo e é algo que pode fazer em qualquer lugar. Basta concentrar-se em cada inspiração e cada expiração. Experimente este exercício fácil: respire profundamente pelo nariz durante três segundos, prenda a respiração mais três segundos e expire pela boca noutros três segundos. Repita algumas vezes. Isto acalma a mente e alivia o stress.
  3. Faça uma pausa para o almoço: e uma pausa significa afastar-se da sua secretária, dar uma volta, relaxar e esquecer o trabalho durante meia hora. Fazer uma pausa deliberada e afastar-se do trabalho é uma forma consciente de melhorar a sua concentração e reduzir a quebra que dá depois do almoço.
  4. Escreva uma nota de gratidão: antes de sair do trabalho, anote pelo menos uma situação positiva que tenha acontecido durante o dia e pense porque o deixou feliz. Isto treina o cérebro para se concentrar no positivo e aumenta a força mental para enfrentar o dia de amanhã ainda com mais resiliência.

Observar o dia a dia

Todos conduzimos em piloto automático a cantar, a pensar na vida, no trabalho, nos filhos, nos exames e em mil e uma coisas. Mas uma das formas mais simples de começar a incutir o “mindfulness” na sua vida é encontrar uma forma de se conectar com tudo aquilo que está à sua volta. E podem ser coisas simples: as sensações do seu corpo enquanto lava os dentes ou a loiça ou enquanto anda na rua ou vai no comboio para o trabalho. Qualquer coisa serve, desde que seja algo que faça todos os dias com regularidade. Escolha, por exemplo, duas tarefas que faz no dia a dia e enquanto as fizer desligue dos pensamentos, concentre-se naquilo que está à sua volta e faça disso uma rotina.

“As pessoas dizem que o “mindfulness” faz no cérebro aquilo que o ginásio faz no corpo. Por outras palavras, não podemos ir uma vez ao ginásio e esperar ter bíceps incríveis”, conclui Alexandra Frey.