As alegações finais do caso Vistos Gold estavam marcadas para esta segunda-feira, mas acabaram por ser adiadas para o próximo dia 19 de março. O Ministério Público fez hoje um requerimento para serem ouvidos os testemunhos dos arguidos, prestados na fase de inquérito e de instrução, e que fosse localizada uma testemunha.

Este requerimento, feito pelo procurador José Espada Niza, provocou alguma revolta por parte dos advogados — que têm 48 horas para responder –, uma vez que estavam todos a contar dar hoje início às alegações, organizaram as suas agendas para tal e pediram aos seus clientes para estarem presentes em tribunal. Os advogados acusaram o Ministério Público de “deslealdade”, já que não apresentou este requerimento antecipadamente no Citius, de forma a que se pudessem preparar.

Na manhã do dia 19 de março serão feitas as alegações do Ministério Público e da parte da tarde serão as da HeliPortugal. As alegações serão retomadas depois dia 9 e 13 de abril e 2 e 7 de maio.

Antes do requerimento do Ministério Público, foi ouvida uma última testemunha, José Manuel Pereira, ex-funcionário da Everjets. O major afirmou que a empresa foi levantar o caderno de encargos do concurso para a operação e manutenção dos meios aéreos (Kamov) para o combate de incêndios “por interposta pessoa”. O Ministério Público defende que a Everjets nunca chegou a levantar o documento. Recorde-se que o antigo ministro da Administração Interna, no seu depoimento, disse ter enviado o caderno de encargos ao amigo Jaime Gomes — documento esse que depois foi parado às mãos da Everjets.

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José Manuel Pereira afirmou ainda que um funcionário da HeliPortugal, chamado Carlos Dantas, lhe disse que estava a elaborar o caderno de encargos e perguntou-lhe se a Everjets não estaria interessada em participar no concurso, ressalvando que toda esta questão do caderno de encargos nada teve a ver com ex-ministro.

Alegações adiadas um ano depois do início do julgamento

As alegações estavam para começar hoje com o Ministério Público, pouco mais de um ano depois do início do julgamento. O processo, que conta com 21 arguidos (17 pessoas singulares e quatro empresas), refere-se a uma rede que alegadamente atribuía autorizações de residência em troca de investimentos no país — as Autorizações de Residência para Investimento (ARI), também conhecidos como Vistos Gold — e que lucrava ilegalmente com este esquema.

Estão em causa crimes de corrupção ativa e passiva, tráfico de influências, prevaricação, recebimento indevido de vantagens, abuso de poder e branqueamento de capitais. António Figueiredo, que foi presidente do Instituto dos Registos e Notariado (IRN) entre 2004 e 2015, é o principal arguido do processo. Está acusado de 13 crimes, entre os quais crimes de corrupção passiva para ato ilícito, e chegou a estar em prisão preventiva.

A defesa do principal arguido do caso Vistos Gold

Entre os arguidos destacam-se ainda Miguel Macedo, antigo ministro da Administração Interna, acusado de três crimes de prevaricação de titular de cargo político e um crime de tráfico de influência; o ex-director-geral do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) Manuel Jarmela Palos; Maria Antónia Anes, a ex-secretária-geral do Ministério da Justiça; três empresários chineses e um angolano; o empresário Paulo Lalanda de Castro e funcionários do IRN.

De acordo com a acusação do Ministério Público, os arguidos terão “movido influências e praticado atos destinados a agilizar o procedimento legal de atribuição dos designados vistos gold, facilitando a atividade daqueles empresários e colocando meios do Estado ao serviço de interesses privados”, e assim obtendo “vantagens pessoais que, de outra forma, não poderiam ter obtido”.

Tudo o que está em causa no caso Vistos Gold

A HeliPortugal, assistente no processo, também se iria pronunciar esta segunda-feira. A empresa acredita ter sido prejudicada pelo antigo ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, na adjudicação de meios aéreos para o combate dos incêndios em Portugal.

Miguel Macedo rescindiu um contrato de 20 anos com a Heliportugal, em 2012, para a operação e manutenção dos helicópteros Kamov para o combate a incêndios. No mesmo ano, foi feito um concurso público para a manutenção destes helicópteros, que ficou deserto (não teve candidaturas). Dois anos depois, foi feito um novo concurso e é nesse âmbito que o antigo ministro é acusado de favorecer a Everjets, ao ter entregado o caderno de encargos do concurso ao amigo e empresário Jaime Gomes. Esse caderno acabou por chegar às mãos da Everjets, comprada pouco antes pelo grupo Bragaparques liderado pelo empresário Domingos Névoa.

No seu depoimento, Miguel Macedo assumiu ter passado o caderno de encargos a Jaime Gomes, referindo que o fez para que ele atraísse concorrentes e assim não correr o risco de ter novamente um concurso vazio. A Everjets venceu o concurso sem nunca levantar o caderno de encargos.

Macedo acusa MP de ser “descuidado” na acusação. “Fez um resumo do julgamento”, diz juiz