Há três administradores do grupo GPS acusados pelo Ministério Público (MP) que ainda se encontram em funções. O próprio presidente do Conselho de Administração, António Calvete, Manuel Madama (a quem foram apreendidos 29 mil euros, “em numerário” e 60 veículos) e Fernando Catarino estão incluídos no Conselho de Administração para o quadriénio 2015-2018, de acordo com a acusação a que o Observador teve acesso. Nesse Conselho de Administração para o quadriénio 2015-2018, estava também António Madama que renunciou em setembro de 2016.

Foram os arguidos António Calvete, Manuel Madama, Fernando Catarino, Agostinho Ribeiro e um quinto elemento que constituíram a sociedade GPS, a 3 de novembro de 2003. Os cinco arguidos estão acusados de corrupção, peculato, falsificação de documento, burla qualificada e abuso de confiança.

De acordo com a acusação do Ministério Público, os colégios do grupo GPS receberam mais de 300 milhões de euros pagos através dos contratos de associação com o Estado: dessa verba, mais de 34 milhões terão tido alegadamente um uso indevido por parte dos arguidos. Serviram para pagar viagens, cruzeiros, carros, jantares, vinhos e seguros pessoais e até bilhetes para o mundial de futebol de 2006. Ao arguido Manuel Madama, foram apreendidos 29 mil euros “em numerário” e ainda 60 carros no valor estimado de 361.150 euros. A António Madama foram também apreendidos 25 mil euros em dinheiro e sete carros no valor estimado de 154 mil euros.

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José Manuel Canavarro. “Não autorizei, não assinei, nunca mandei pagar”

A acusação foi uma “surpresa” para um dos arguidos, o ex-secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa, José Manuel Canavarro, que revelou ao Observador que vai “solicitar a abertura de instrução”. Isto porque, para o arguido, “as acusações não têm fundamento”. O ex-secretário de Estado está acusado de corrupção passiva por, alegadamente, ter favorecido, no exercício da sua função, interesses do grupo empresarial GPS. O outro arguido identificado como decisor público é José de Almeida, que foi diretor regional de Educação de Lisboa entre 29 de setembro de 2004 e 26 de maio de 2005.

Estes dois arguidos estão acusados de terem vinculando o Estado através da celebração de contratos de associação com o grupo GPS. Segundo garantiu José Manuel Canavarro ao Observador, “o contrato de associação foi celebrado 20 meses depois de sair do Governo. Na celebração dos contratos [de associação] nenhum ato meu é referido”, disse ainda, acrescentando: “Não autorizei, não assinei, nunca mandei pagar. Quem decidiu não fui eu”.

O arguido explicou ao Observador que assinou apenas dois despachos: um a dar conhecimento de uma rotura de rede de escolas em Lisboa e Vale do Tejo e outro com a previsão de rede. “Não tem eficácia externa. Não é uma autorização. É apenas informação previsional“, explicou ao Observador, referindo-se ao segundo despacho. Nesse despacho, assinado por José Manuel Canavarro, datado de janeiro de 2005 (cerca de um mês e meio antes de ter saído do governo), pode ler-se:

Constato efectivamente existir ruptura na rede pública, particularmente a partir de 2005, pelo que urge solução adequada para obviar maiores constrangimentos. Nesse sentido, sem interferir na criação de escolas particulares cuja iniciativa é, nos termos da lei, exclusivamente da iniciativa dos particular, é de equacionar a proposta constante do ponto 3 do despacho do Sr. DREL e conferir-lhe execução nas condições e termos legalmente previstos para apoios dessa natureza.”

José Manuel Canavarro foi secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa entre 21 de julho de 2004 e 12 de março de 2005, no governo liderado por Pedro Santana Lopes, até à posse do Governo seguinte, de José Sócrates. Depois de sair do Governo, foi convidado para ser consultor no grupo GPS, explicou ao Observador.

De acordo com a acusação, “em troca dessas decisões favoráveis [estes cinco arguidos] ofereceram [aos dois decisores públicos] cargos remunerados nos quadros das sociedades do seu grupo e outras vantagens patrimoniais”. Canavarro defende-se: “Fui um colaborador a recibos verdes, pagando impostos. Não tive lugar de quadro. Exerci funções de assessoria como colaborador externo”, explicou, acrescentando que “declarou no registo de interesses e no Tribunal Constitucional”. José Manuel Canavarro disse ainda ao Observador que “nunca” teve “qualquer interferência em entidades públicas” enquanto foi consultor e garantiu: “Nunca me foi pedido [qualquer interferência]”.

GPS diz que há “incongruências que poderão ferir de morte esta acusação”

O grupo GPS ainda não tem uma posição sobre a acusação — algo que considera “absolutamente extemporâneo”, de acordo com declarações do gabinete de comunicação ao Observador. A extensão do processo e “ausência de meios” disponibilizados pelos Ministério Público estão na base da ausência de posição.

Este processo tem pelo menos 1.930 dias (cinco anos, três meses e 15 dias), e recebemos a acusação há apenas alguns dias. Estamos a analisar de forma aprofundada a peça, desde logo muito extensa (270 páginas), num processo principal que tem 19 volumes, com pelo menos 4.593 páginas, a que se somam 26 apensos, desdobrados em cerca de 2.000 pastas de arquivo, com várias centenas de milhar de folhas”, explicou a mesma fonte.

O grupo GPS acusa o Ministério Público de “desigualdade de armas entre a acusação e a defesa” por não disponibilizar cópias de documentos. Para o grupo, ” a defesa está diminuída, senão mesmo impedida”. Isto porque o grupo GPS alega que não dispõem de uma “cópia (digitalizada ou em papel) dos documentos constantes do processo”, que “foram apreendidos”. “O Ministério Público alega ausência de meios para facultar cópia dos elementos constantes do processo”, explicou fonte do grupo.

Segundo a mesma fonte, o grupo GPS conta ter “uma posição mais substantiva nos próximos dias“. “De qualquer forma, importa desde já vincar um conjunto de incongruências que poderão ferir de morte esta acusação“, disse ainda a mesma fonte.