“Somos todos Centeno”, frase dita pelo ministro da Saúde, foi uma “afirmação um pouco infeliz” segundo a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, que defende que não vale tudo, incluindo ir além das metas do défice, para Mário Centeno brilhar — é preciso investir nos vários setores do Estado, e o Bloco quer que essa discussão seja feita à esquerda. Sobre a integração dos precários na Administração Pública, Catarina Martins acusa algumas chefias, como os reitores, de estarem “a minar” o processo.
“O Governo devia rever claramente as suas metas de investimento na saúde e educação, como noutros serviços públicos. O PIB está a crescer e o nosso investimento em sectores essenciais é cada vez mais baixo. E é preciso ter cuidado, porque nós não podemos deixar que, para que Mário Centeno possa brilhar, os serviços públicos fiquem às escuras”, diz em entrevista publicada esta quinta-feira no jornal Público e Rádio Renascença, acrescentando que os “brilharetes” de Centeno, como apelidou João Galamba, não são uma questão de rigor orçamental mas sim de “ir para lá das metas”. E isso é sinónimo de falta “investimentos na saúde, na educação, território, segurança, que não são feitos”.
É nesse sentido que Catarina Martins defende que a discussão sobre investimentos, ora com fundos comunitários ora nacionais, deve ser feita à esquerda, e não deve terminar nesta legislatura. Sabendo que António Costa abriu uma via de diálogo com Rui Rio sobre este tema (o novo quadro plurianual de fundos comunitários), a coordenadora do BE diz que a ideia de aproveitar este tipo de financiamento para, por exemplo, lançar um processo de reconversão energética para reduzir a dívida externa é um debate que “não tem condições de ser feito à direita, mas tem condições para ser feito à esquerda”.
Mais: Catarina Martins critica que os investimentos públicos tenham de ser aprovados por dois terços do Parlamento, porque isso é “dar poder de veto ao PSD sobre o investimento” — e essa é “uma divergência clara que temos com o primeiro-ministro”. “Não tem nenhum sentido que a direita tenha opção de veto sobre investimentos que a maioria parlamentar pode decidir e debater à esquerda. Isso é deixar tudo como estava”, diz.
Sobre matérias laborais, onde Governo e partidos da esquerda têm tido o maior braço de ferro, Catarina Martins insiste nas críticas às medidas relativas à contratação coletiva, que o Governo teima em não apresentar. “É uma omissão gigantesca. Quando não há contratação coletiva, como está a acontecer no nosso país, o que acontece é que uma pessoa que está a trabalhar há dez anos está a trabalhar o mesmo que uma que acabou de entrar”, diz. E sobre o complexo processo de integração dos precários na Administração Pública, Catarina Martins admite que é “um dos projetos mais importantes e de mais difícil execução”, e aponta o dedo a chefias, nomeadamente no setor da educação, que estão a “minar”, a “boicotar” o processo e a torná-lo “mais lento do que gostaríamos”.
“Quando vejo os reitores e directores das faculdades a dizerem que os seus investigadores ou professores convidados não são precários, quando estão há décadas sem vínculo à faculdade, acho que os reitores estão a pensar muito mal e a boicotar este processo”, diz, defendendo que “é preciso fazer um trabalho de responsabilização das chefias que estão claramente a minar a lei feita pelo Parlamento e a boicotar o processo de integração de precários”.