José Maria Ricciardi esteve esta quarta-feira à noite na SIC Notícias e quebrou o silêncio que se arrastava desde o início de abril, quando se demitiu do Conselho Leonino e retirou o apoio a Bruno de Carvalho. Frequentemente apontado como o “eterno candidato”, o banqueiro defendeu a demissão do presidente do Sporting e não recusou totalmente a hipótese de se candidatar em caso de eleições antecipadas.
Leia as frases chave de José Maria Ricciardi e o que cada uma delas quer dizer.
O pedido de demissão
Os factos e a gravidade daquilo a que temos assistido leva-me a dizer que é absolutamente fundamental que tanto o Conselho de Administração como o Conselho Diretivo se demitam o mais depressa possível”.
O ex-membro do Conselho Leonino não optou por eufemismos e foi bastante claro. Para Ricciardi, o atraso na demissão de Bruno de Carvalho está a arrastar a situação e convulsão interna no Sporting. “É extremamente perigoso para o futuro” do clube, acrescentou. Pouco antes de começar a entrevista, a direção leonina pedira uma Assembleia Geral Extraordinária “o mais breve possível”; coisa que, na ótica de Ricciardi, “não é o mais adequado”. O banqueiro defende a demissão imediata de Bruno de Carvalho como primeira medida para a resolução da crise no Sporting.
A (não) relação entre os jogadores e o presidente
Os jogadores recusaram-se a falar com o presidente, não penso que queiram alguma vez mais falar com este presidente”.
Insistindo na premissa de que Bruno de Carvalho se deve demitir, José Maria Ricciardi sugeriu que essa é a única ação que pode atenuar a atual situação de quase guerra civil em Alvalade. A possibilidade de rescisão unilateral de muitos jogadores, avançada desde a primeira hora, coloca um problema patrimonial sobre o de prestígio ou a reputação do clube. Ricciardi, que fez parte da Comissão de Honra de Bruno de Carvalho, não acredita na hipótese de reconciliação entre jogadores e presidente.
[Veja no vídeo as críticas que incomodaram Bruno de Carvalho]
https://www.youtube.com/watch?v=HttPEkzWWCs&feature=youtu.be
De recordar que terça-feira, quando Bruno de Carvalho chegou à Academia do Sporting depois das agressões, os jogadores recusaram falar com o presidente. Já na segunda-feira, antes dos capítulos mais negros desta saga — o das agressões em Alcochete –, o plantel tinha respondido apenas com “sim” e “não” na reunião de emergência convocada pelo presidente.
O rombo financeiro em caso de rescisões unilaterais
Mas nunca será menos de 100 milhões de euros e portanto o Sporting não está em situação de ter um prejuízo desta ordem”.
Ainda que tenha admitido ser quase impossível avançar com um número certo, José Maria Ricciardi garantiu que o prejuízo, em caso de várias rescisões unilaterais, ascenderá aos 100 milhões de euros. Antes das agressões desta terça-feira e eventuais rescisões, o Sporting estava já numa situação frágil em termos financeiros: o terceiro lugar roubou o acesso à Liga dos Campeões e os cerca de 2o milhões com que o Bruno de Carvalho disse estar a contar.
As prováveis saídas de Rui Patrício, William Carvalho e Gelson Martins iriam colmatar o buraco que a Champions deixou. Agora, a possibilidade de que estes e mais jogadores (Bruno Fernandes, Bas Dost…) saiam a custo zero torna o panorama económico-financeiro a curto prazo algo dantesco.
A desilusão com Bruno de Carvalho
Começou a haver uma evolução no seu comportamento, que eu comecei a ficar desiludido e que foi num crescendo até estas Assembleias Gerais. Ainda hoje estou para perceber o interesse das próprias Assembleias Gerais”.
Apoiante de Bruno de Carvalho desde a primeira hora, José Maria Ricciardi pediu a demissão do Conselho Leonino no início de abril, depois da troca de críticas entre o presidente e o plantel. O banqueiro reconhece que os comentários feitos por Bruno de Carvalho aos jogadores, depois da partida da Liga Europa com o Atlético de Madrid, foram um erro: “E toda a gente comete erros”. Ainda assim, aponta a escalada de publicações nas redes sociais e declarações públicas do presidente do Sporting como o principal motivo para o seu afastamento.
A guerra civil pós Atlético de Madrid
Um presidente que tivesse perfil para ser presidente de uma instituição da importância do Sporting Clube de Portugal devia ter tido a maturidade de se sentar com os jogadores e o treinador e resolver isto a bem. Há uma palavra que ele devia descobrir, que ele não sabe qual é, que é a humildade”.
Para Ricciardi, Bruno de Carvalho deveria ter-se sentado com todos os jogadores, assim como com Jorge Jesus, e ter resolvido o conflito que surgiu depois do jogo em Madrid. Após as críticas aos jogadores – que incluíram pormenores de cariz pessoal, como o facto de Gelson Martins ter a dada altura rematado com o pé mais fraco -, Rui Patrício foi a cara do levantamento do balneário, que emitiu um comunicado que espelhava a crise entre presidente e jogadores.
No jogo seguinte, em Alvalade, o Sporting venceu o Paços de Ferreira e os jogadores ofereceram uma demonstração de união. No banco de suplentes, Bruno de Carvalho festejou os golos sozinho e ouviu assobios e viu lenços brancos das bancadas. A partir daí, vieram seis vitórias consecutivas e uma paz podre que chegaria ao fim com a derrota na Madeira.
A escalada dos últimos meses
O Dr. Bruno de Carvalho hoje em dia não é a mesma pessoa que era há um ano ou há seis meses”.
“Toda a gente tem defeitos”. É assim que José Maria Ricciardi explica o facto de ter apoiado Bruno de Carvalho desde a primeira candidatura e de ter mantido esse respaldo até às últimas eleições. Contudo, o antigo membro do Conselho Leonino não se revê nas últimas atitudes do presidente do Sporting e considera a escalada das últimas semanas inaceitável.
Comissão de gestão ou eleições para já?
O Sporting não se pode dar ao luxo de ter um vazio de poder a que qualquer eleição obriga. Uma das soluções será essa comissão de gestão que possa assegurar a resolução desta situação”.
Em questões mais práticas – e no caso de uma futura demissão de Bruno de Carvalho – Ricciardi defende a criação de uma comissão de gestão que dirija os destinos do clube até à data de eleições antecipadas.
Solução que, registe-se, não seria inédita na história do Sporting: aconteceu na época 1979/80, quando João Rocha transmitiu ao Conselho Leonino a sua intenção de se demitir da presidência do clube.
A (possível) candidatura à presidência
Não sei se serei, não é esse o meu projeto de vida, mas não vou dizer perentoriamente que não serei. Nessa altura irei tomar uma decisão, será pouco provável, mas não digo que não serei”.
Candidatura à presidência. O “eterno candidato” volta a ser candidato a candidato. José Maria Ricciardi hesita, volta atrás, defende-se, mas uma coisa é certa: não recusa a possibilidade de se candidatar à presidência do Sporting num cenário de eleições antecipadas. Ainda assim, revela que vê em Rogério Alves “todas as capacidades” para ser presidente do clube de Alvalade. Ou seja, se Rogério Alves avançar, como é possível, dar-lhe-á apoio.