A Organização Mundial de Saúde (OMS) recuou no apelo que fez há dois anos para aumentar globalmente os impostos sobre bebidas açucaradas, apoiada num relatório que saiu esta sexta-feira e que alguns especialistas consideram pouco fiável.
Em 2016, a OMS apelou às nações para taxarem as bebidas como refrigerantes e energéticas para combater a obesidade e a diabetes, estimando que um aumento de 20% no preço iria conter o consumo. No entanto, esta sexta-feira, os peritos da organização afirmaram que havia “visões em conflito que não conseguiram ser resolvidas” em relação à imposição de impostos e afirmam que cada país tem de tomar a sua própria decisão.
Jack Winkler, um especialista em nutrição da Universidade Metropolitana de Londres, no Reino Unido, considerou que em plena epidemia de obesidade, o recuo da OMS é “particularmente absurdo”.
A copresidente da comissão independente que fez o estudo, Sania Nishtar, afirmou que a maior parte dos 26 membros apoiava o imposto sobre o açúcar, mas um membro defendeu que a mensagem devia ser suavizada. A objeção era que se fizesse “uma recomendação forte”, porque o membro da comissão, que não foi identificado, considera que não há dados suficientes para suportar tal recomendação. Nishtar afirmou desconhecer a influência do lobby dos refrigerantes sobre os comissários, apesar de a indústria se ter manifestado contra o imposto, que considera discriminatório e ineficaz por si só no combate à obesidade.
Assim, a OMS passou a dizer que “quando a relação com o setor privado não contribuir para atingir os objetivos de saúde pública, os governos devem usar os seus poderes legislativos e de regulação para proteger as populações”, lê-se no relatório.
Jack Winkler indicou que no caso do Reino Unido, a aplicação do imposto levou os fabricantes a mudar os seus produtos e tornou mais barata a opção por produtos mais saudáveis. “Quando a OMS não adota uma solução prática que também faz poupança, é particularmente absurdo”, afirmou.
O professor de saúde pública europeia Martin McKee, da faculdade de higiene e medicina tropical de Londres, afirmou que a falta de consenso na comissão da OMS é “difícil de compreender”, assinalando que se trata do primeiro relatório da comissão, que ainda pode mudar de ideias.
Em outubro de 2016, a OMS tinha declarado que um aumento do preço das bebidas açucaradas ajudaria a reduzir o sofrimento e salvar vidas, com números de obesidade que atingiam os 500 milhões de pessoas em 2014.
A tributação dos refrigerantes e das bebidas açucaradas começou, em Portugal, no início deste ano, depois de ter sido aprovada na lei do Orçamento de Estado, estimando o Estado arrecadar 80 milhões de euros este ano. Nos Estados Unidos, a recomendação foi disputada pela indústria alimentar, que conseguiu travar impostos municipais sobre estes produtos em Nova Iorque, mas adotada em cidades como Filadélfia e Berkeley.
A organização internacional dos fabricantes de bebidas manifestou-se em 2016 contra o que considerou uma discriminação de certas bebidas apresentada como solução para um problema “real e complexo”, a obesidade.