Em 1970, o autor austríaco Peter Handke publicou o livro “A Angústia do Guarda-Redes Antes do Penálti”. A obra em nada estava relacionada com futebol: o título era apenas uma metáfora. Mas num dia em que duas eliminatórias de um Campeonato do Mundo foram decididas nas grandes penalidades, parece aceitável recordar o livro que foi adaptado ao cinema em 1972, por Wim Wenders. Este domingo, Subasic e Schmeichel, os guardas-redes da Croácia e da Dinamarca, contrariam o título de Handke. 

Neste jogo dos oitavos de final do Mundial, a angústia pertenceu aos avançados, médios e defesas que falharam grandes penalidades. Os guarda-redes, esses, foram a límpida imagem da calma e da decisão. A história começou ainda no prolongamento: aos 115 minutos de jogo, a cinco do final do tempo extra, Luka Modric falhou o penálti que colocaria ali um ponto final no jogo e apuraria a Croácia para os quartos de final. Mas o capitão croata, titular indiscutível do Real Madrid, vacilou e permitiu a defesa de Kasper Schmeichel, guarda-redes do muito mais modesto Leicester City e chegou a fazer parte da formação no Estoril.

Schmeichel defendeu e atirou a decisão para as grandes penalidades: as mesmas que, um par de horas antes, tinham atirado Espanha para fora do Mundial pelas luvas de Akinfeev, outro guardião com muito pouca angústia.

O guarda-redes dinamarquês juntou-se ao homólogo da outra baliza, Danijel Subasic, dono da baliza do Mónaco e da seleção croata. Schmeichel e Subasic lutaram, mano a mano, para decidir não só que seleção era apurada para os quartos de final mas também qual deles era o herói nacional no país respetivo. O croata conseguiu defender três, o dinamarquês duas. Subasic carregou ao colo uma Croácia que foi insuficiente, ineficaz, desinspirada e completamente controlada pela Dinamarca durante os 120 minutos de jogo. A seleção de Modric e Rakitic terá de fazer muito mais se quiser vencer a Rússia no próximo dia 7 de julho e assumir uma candidatura à final — agora que Argentina, Espanha, Alemanha e Portugal estão fora do Mundial.

Com as três grandes penalidades defendidas, Danijel Subasic igualou um recorde estabelecido exatamente a 1 de julho, mas de 2006, por um português: há 12 anos, no Mundial da Alemanha, Ricardo defendeu três penáltis frente a Inglaterra e colocou a Seleção Nacional nas meias-finais da competição.

Num Mundial onde Lionel Messi, Cristiano Ronaldo e Luka Modric falharam grandes penalidades, seria altura de alguém escrever um livro que colocasse os pontos nos is: a angústia antes do penálti é de quem o marca, não do guarda-redes.

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