Foi com surpresa que o primeiro-ministro viu surgir Mário Nogueira, líder da Fenprof, no meio da rua e dirigir-se a si para confrontá-lo com a falta de acordo na última negociação entre sindicatos de professores e Ministério de Educação. António Costa visitava um agrupamento escolar em Paredes de Coura quando foi interpelado por Nogueira no meio dos populares. Durante vários minutos, os dois envolveram-se num debate acesso, sempre com cordialidade e alguma ironia, trocando argumentos sobre o descongelamento e recuperação da carreira de docentes. À volta dos dois, vários dirigentes sindicais e o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, assistiam em silêncio.

“Não houve avanço, senhor primeiro-ministro”, dizia Nogueira, referindo-se à reunião da última sexta-feira.  “Mas olhe que há um sinal”, respondia o primeiro-ministro. “Mesmo sem acordo vamos pôr na letra da lei e na vida das pessoas” a proposta do governo, a mesma que não colheu luz verde dos professores. Falhado o acordo, o ministro da Educação anunciou, na sexta-feira, que o governo vai operacionalizar a sua proposta, transformando-a em decreto lei.

Os professores pretendem recuperar os 9 anos, 4 meses e 2 dias em que as suas carreiras estiveram congeladas, não abdicando de nenhum dia, enquanto que o Governo só aceita dois anos, nove meses e 18 dias. É esse período que irá passar a decreto.

“Senhor primeiro-ministro, os 46 mil professores que tiveram a carreira descongelada não vão sequer recuperar um dia nesta legislatura. Só recuperam em 2021”, atacou Nogueira.

“Mas vocês sempre disseram que aceitavam que fosse repartido por vários anos”, retorquiu António Costa em tom irónico.

“Desde que, desde que… desde que a recuperação começasse em 2019”, atirou Nogueira. “Não é justo que as pessoas dêem o seu melhor e não haja justiça. Este é um Governo em que os professores depositaram muitas expetativas.”

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O primeiro-ministro reagiu prontamente a estas declarações, pegando também no conceito de justiça para acusar Mário Nogueira de estar a ser injusto com o seu executivo. “Este é o Governo que descongelou” as carreiras dos professores, disse Costa. “Nós não somos só o governo dos professores.”

“Claro, claro”, ia dizendo Nogueira, assentindo com a cabeça, enquanto o chefe do Governo falava. E retorquiu: “Mas os outros perderam 7 anos e recuperaram 7 anos”, e o mesmo não aconteceu com os professores, disse o líder da Fenprof.

António Costa justificou a proposta do governo, acabando por dizer que “ela não caiu do céu”.

“Pois não, caiu das Finanças que é onde às vezes parece estar Deus”, sublinhou o sindicalista, argumentando que se os professores não tiveram a mesma regra de perda de outras carreiras, não podem ter a mesma regra de ganho, já que ficarão a perder em relação a outros funcionários públicos.

Depois de vários minutos de debate, que nunca foi interrompido pelos presentes, Mário Nogueira rejeitou a ideia de que a concentração de dirigentes fosse uma manifestação, como disse António Costa, servindo apenas para “lembrar a memória” do governante para a luta dos docentes.

Antes de seguirem caminhos opostos, António Costa ainda disse a Mário Nogueira, com ar sorridente: “Vai ver que o decreto lei ainda diz mais do que está à espera.”

Na passada sexta-feira, o ministro da Educação anunciou ainda que, mesmo sem acordo dos sindicatos, vai avançar com o decreto de lei que prevê a bonificação de dois anos aos professores a partir de 1 de janeiro de 2019, a ser aplicada na próxima progressão. “Foi isso que surgiu deste processo negocial”, rematou Tiago Brandão Rodrigues.