Ainda com a noite eleitoral a quente, e com resultados por apurar à hora de os jornais irem para a gráfica, os principais editoriais da imprensa dos EUA não diferem muito na análise aos resultados: foi uma noite boa para os democratas, mas ficou longe de se ver uma “onda azul” como a que tinha sido pré-anunciada, escreve o Wall Street Journal, enquanto o Washington Post prefere dar ênfase ao facto de os democratas terem recuperado o controlo da Câmara dos Representantes pela primeira vez em oito anos, e o New York Times opta por refletir sobre o significado dessa recuperação: “E agora?” Agora é preciso legislar “sabiamente”.

Sob o título “Um grande dia para a democracia”, os coordenadores editoriais do principal jornal de Washington D.C. afirmam que a vitória dos democratas na Câmara dos Representantes é mais do que “a vitória de um partido”, é “um sinal de saúde da democracia americana”, na medida em que é “uma forma de manifestação contra os excessos, tanto de retórica como de política, cometidos pela administração Trump”.

“Desconfiados das maiorias absolutas, os autores da Constituição favoreciam os freios e contrapesos, cientes de que o poder legislativo poderia muitas vezes sobrepor-se ao executivo”, começa por dizer o Washington Post no seu editorial desta quarta-feira, sublinhando a importância de os EUA terem um poder legislativo de cor diferente do executivo para melhor exercer a função de supervisão. Como nos dois anos que passaram, os republicanos tiveram maioria na Câmara e no Senado, essa supervisão não terá sido a mais eficaz — “agora, o sistema constitucional tem uma nova hipótese de funcionar da forma exata em que foi pensado”, notam.

Para o Post, virar a Câmara dos Representantes, retirando a maioria aos republicanos de Donald Trump, sobretudo numa altura de prosperidade económica, é a prova de que os eleitores “recusaram votar com base no medo” e recusaram aceitar a “contínua degradação da cultura política da sua nação”. O que isto significa na prática? Que a Câmara dos Representantes “passa a estar em posição de investigar as numerosas transgressões da administração Trump e exigir responsabilidades” e passa a estar em posição de “oferecer uma agenda legislativa positiva”, nomeadamente em termos de políticas para combater as alterações climáticas, políticas de imigração ou reverter políticas relacionadas com o porte de armas. Em todo o caso, com o Partido Republicano a reforçar o seu peso no Senado, o Washington Post lembra que mesmo com o Congresso a propor alterações legislativas, elas podem sempre esbarrar no Senado ou no veto presidencial de Trump.

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Mais ou menos na mesma linha do Washington Post, também o New York Times começa por dizer no seu editorial que a nova maioria democrata no Congresso dá aos democratas “a oportunidade de mostrar que há uma maneira melhor de legislar que não seja reduzir impostos para os mais ricos e ameaçar todos os outros” — mas para o conseguirem têm de “saber escolher as suas batalhas políticas”. Que é como quem diz, devem escolher as batalhas políticas que têm maior probabilidade de não esbarrar na parede republicana do Senado ou do próprio Presidente. Isto porque a Câmara dos Representantes, chamada de câmara baixa, pode ser a que faz as leis, mas o Senado, câmara alta, é que as aprova.

“Dá aos democratas a oportunidade de pressionar o presidente Trump sobre até que ponto está interessado em fazer progressos dentro daquilo que são os seus objetivos assumidos, ou se quer apenas fazer uma guerra de trincheiras partidárias até ao fim do mandato”, lê-se.

Mais: se os democratas conseguirem ser espertos o suficiente para legislar matérias como aumentar o investimento para reparar obras públicas como pontes ou túneis, é provável que consigam pôr alguns congressistas republicanos do seu lado, e, consequentemente, do lado oposto ao de Trump. Se assim for, “tanto melhor”, escreve o editorial do New York Times. “Parte do segredo da política está em unir a própria equipa e em dividir a outra”, acrescenta.

Sob o título “Uma Câmara Democrata”, o editorial do Wall Street Journal sublinha que a vitória dos democratas na câmara baixa do Congresso não foi a “onda azul” que podia ter sido, mas as perdas do partido republicano foram ondulação bastante para “frustrar a presidência de Trump” — apesar de o presidente ter encarado os resultados das eleições intercalares como uma vitória. Na visão do Wall Street Journal, mais do que vitórias ou derrotas as eleições serviram para acentuar as “divisões políticas profundas” que se sentem nos EUA.

Para o Wall Street Journal, o que fica claro depois das intercalares desta terça-feira é que “morrem as possibilidades de reforma política conservadora nos próximos dois anos e começará o cerco às investigações e comissões de inquérito”.

Depois de dizer que terça-feira foi um “dia bom para os demcoratas”, o Washington Post ainda acrescenta que também pode ser um dia bom para os republicanos se aprenderem a lição da perda da Câmara dos Representantes. E que lição é essa? “Que fizeram um acordo com o diabo ao apoiarem Donald Trump”. Portanto, escreve o Post: “Se os resultados desta terça-feira ajudarem a reemergir os melhores rostos do partido republicano, então esta terça-feira terá sido um dia bom para a América como um todo”.