A taxa de retenção atingiu o valor mais baixo da última década no ano letivo de 2016/2017, mas o Conselho Nacional de Educação (CNE) alerta para uso excessivo da medida, que é a “mais cara e menos eficaz”.

As taxas de retenção e desistência têm vindo a diminuir nos últimos anos, tendo atingido no ano letivo de 2016/2017 o valor mais baixo da última década em todos os três ciclos de ensino, segundo o relatório Estado da Educação 2017. No 1.º ciclo, a taxa baixou para os 3%, “o que representa uma redução de cerca de 40% relativamente a 2014”, sublinha o estudo esta terça-feira divulgado pelo CNE. No 2.º e 3.º ciclos, as taxas rondam agora os 5,8% e os 8,5%, respetivamente, o que significa uma redução de cerca de 50% e 60% relativamente a 2013.

No entanto, a presidente do CNE, Maria Emília Brederode Santos, critica a “cultura de retenção” que ainda existe em Portugal, onde o chumbo é usado como “arma para conseguir que os meninos estudem”.

O relatório do CNE Estado da Educação 2017 revela que a retenção é uma das principais medidas usadas pelos professores para combater o insucesso escolar e atingir a equidade, apesar de ser a “mais cara e menos eficaz”. “É estranho, porque nos países do norte isto não acontece (…) A prática da retenção é não só injusta mas também inútil”, defendeu a presidente do CNE à agência Lusa, lamentando que esta medida seja “difícil de erradicar”.

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Logo no 1.º ciclo há muitos alunos a reprovar: “No 2.º ano de escolaridade há níveis de retenção muito elevados. Parece-nos muito negativo apanhar os miúdos logo à entrada do 1.º ciclo”, lamentou. Segundo o estudo do CNE, 7,4% dos alunos do 2.º ano ficaram retidos no ano letivo de 2016/2017.

Maria Emília Brederode Santos admite que o insucesso registado no 1.º ciclo possa estar relacionado com a aprendizagem da leitura e da escrita, defendendo a necessidade de se estudar as causas para este fenómeno, para se poder avançar com medidas.

Independentemente das razões para o insucesso, a presidente do CNE alerta para a retenção ser uma medida “socialmente injusta”. “Há uma cultura de retenção que está muito correlacionada, em Portugal, com o meio socioeconómico de origem. É muito injusto socialmente”, sublinhou, lembrando que uma criança que vem de um meio mais desfavorecido tem muito mais hipóteses de reprovar.

É entre os alunos de famílias mais carenciadas que há mais chumbos, assim como esta é uma realidade mais recorrente entre as crianças cujos pais têm menos formação educativa. É também nas regiões do interior que se encontram percentagens mais elevadas de insucesso, segundo o relatório do CNE, que, pela primeira vez, dedica todo um capítulo ao interior.

O insucesso escolar continua a atingir mais os rapazes do que as raparigas, sendo que também aqui se registou uma melhoria. “Já toda a gente sabe que os rapazes neste momento têm mais propensão para chumbar do que as raparigas, embora no secundário tenha havido um progresso com os cursos técnico profissionais e os cursos de dupla certificação”, sublinhou Maria Emília Brederode Santos.

Portugal surge quase isolado numa Europa onde a retenção faz parte do passado: “Os estudos mostram que é a medida mais cara e menos eficaz de todas as medidas que podem ser utilizadas para ajudar os meninos que estão a ter dificuldades. O repetir o ano só por si não resolve nada”, alerta.

O relatório apresenta também pela primeira vez um capítulo dedicado à análise das metas que a Europa definiu para 2020 e 2032, onde Portugal surge como um dos países que mais melhorou nas últimas décadas. “Fizemos um progresso enorme e estamos bastante próximos dessas metas, embora não estejamos lá ainda”, lembra a presidente do CNE.

Ao percorrer o caminho feito nas últimas quatro décadas, destaca-se a redução da taxa de analfabetismo, que na década de 1970 rondava os 25% e agora atinge menos de 5% da população, e a educação pré-escolar para as crianças a partir dos 4 anos, que nos anos 70 nem sequer aparecia nas estatísticas e agora está perto dos 95%. Outros dos pontos destacados no relatório é a taxa de escolarização entre os jovens dos 5 aos 14 anos, que é hoje de 98%, e a frequência dos jovens no ensino superior, que subiu de 5% para 43%.

Conselho Nacional de Educação põe em causa existência do 2.º ciclo

A presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE) pôs esta terça-feira em causa a existência do 2.º ciclo, lembrando que se trata de uma “originalidade portuguesa”, que “não é uma boa prática” tendo em conta o elevado número de reprovações.

Para a presidente do CNE, Maria Emília Brederode Santos, deveria ser repensada a organização do ensino básico, atualmente dividido em três ciclos, “designadamente a velha questão do 2.º ciclo [um ano para entrar e outro para sair, dadas as dificuldades assinaladas nos anos de transição”, lê-se na introdução do relatório Estado da Educação 2017, hoje divulgado.

As taxas de retenção e desistência têm vindo a diminuir nos últimos anos, tendo atingido no ano letivo de 2016/2017 o valor mais baixo da última década em todos os três ciclos de ensino. No entanto, olhando para o relatório esta terça-feira divulgado, percebe-se que é nos anos de transição de ciclo (5.º e 7.º) que os alunos apresentam mais dificuldades e acabam por ficar retidos, uma realidade que continua a preocupar o CNE.

O 2.º ciclo é uma originalidade portuguesa. Só nós é que temos aqueles dois anos: que é um ano para entrar e um ano para sair e já se viu que não é uma boa prática”, disse a presidente do CNE à agência Lusa.

A taxa de retenção do 7.º ano, que em 2017 alcançou os 11,5%, “tem sido a mais elevada do ensino básico nos últimos quatro anos, enquanto no 8.º e 9.º ano os valores têm-se vindo a aproximar, rondando os 7% em 2017”, refere o relatório.

Para Maria Emília Brederode Santos, “valia a pena tentar encontrar outras formas de organizar o sistema que não criassem tantas transições, que acabam por provocar, como se percebe pelos resultados, mais dificuldades na aprendizagem dos alunos”. Sem apontar soluções, a presidente do CNE deu como exemplo a possibilidade de os nove anos do ensino básico poderem ser divididos em apenas dois ciclos, seguindo-se depois o ensino secundário (do 10.º ao 12.º ano).

Computadores nas escolas públicas são cada vez menos e mais velhos

A aposta nas salas de aula do futuro, com 40 destes espaços criados em 26 agrupamentos e escolas não agrupadas desde 2014, contrastam com o envelhecimento e redução do número de computadores disponíveis por aluno em todo o país.

Segundo os dados esta terça-feira divulgados no relatório Estado da Educação 2017 do Conselho Nacional de Educação (CNE), as 40 salas de aula do futuro criadas desde 2014 podiam, talvez, ser em número superior, deixa antever o relatório, ao referir que “a decisão de apetrechar estes espaços é da iniciativa das escolas, mas está muito dependente das parcerias que conseguem mobilizar para o efeito (fundações, autarquias, empresas tecnológicas)”, ou seja, de financiamento que não passa pelo Ministério da Educação.

Estas salas são concebidas, com a ajuda de mobiliário e tecnologia, para albergarem diferentes zonas de trabalho, podendo inclusivamente acolher mais do que uma turma em simultâneo, e privilegiam o trabalho em projeto, uma forma de trabalhar que se enquadra nos objetivos do Projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular, desde o presente ano letivo possível de aplicar em todas as escolas do país, desde que seja essa a sua vontade.

No entanto, aponta o relatório do CNE, há uma realidade tecnológica contrastante com estas salas de aula, com os computadores disponíveis nas escolas cada vez mais envelhecidos e cada vez em menor número, aumentando a média de alunos por computador.

Segundo o CNE, em 2016-2017, com um total de 302.415 computadores, havia menos 134.445 computadores do que em 2014-2015 (436.870), “o que corresponde a uma quebra de 31%, sendo o setor público o mais afetado”.

Em 2016-2017, 12% dos computadores disponíveis não tinham ainda ligação à internet e a grande maioria eram computadores de secretária e não portáteis. “O material disponível parece acusar alguma antiguidade na medida em que a percentagem de computadores em uso há mais de três anos, que em 2014-2015 era de 56,9%, em 2016-2017 representa 76,5% dos computadores existentes”, lê-se no relatório.

Nas escolas públicas o número médio de alunos por computador disponível era de 6,5 alunos no 1.º ciclo e de 3,6 ou 3,7 nos restantes ciclos de ensino.