A fechar o penúltimo ano parlamentar antes das eleições legislativas, o PS juntou os deputados para um jantar em Lisboa em que António Costa apresentou o caderno de encargos ainda antes de o alarme eleitoral disparar: o programa nacional de infraestruturas, o combate à precariedade e a lei de bases da Saúde. Pelo caminho, o líder socialista recordou António Arnaut para apelar à aprovação de uma lei de bases da Saúde depurada das “portas e alçapões com que a direita quis desvirtuar o SNS” e que “procura ser do século XXI”.

A Saúde foi mesmo um dos tópicos a que Costa dedicou mais tempo, numa intervenção em que fez um balanço da legislatura em passo acelerado. Costa espera que, nos próximos meses, a Assembleia da República aprove a proposta de lei de bases que a nova ministra da Saúde, Marta Temido, teve de concluir — e que lhe valeu um choque com a ex-ministra Maria de Belém — e, para deixar claro o peso que o tema tem para o PS, voltou a lembrar o pedido que António Arnaut lhe fez na última vez que estiveram juntos antes de o histórico socialista morrer: “Oh Costa, aguenta lá o nosso SNS.”

Costa garante que o PS não tem “nada contra o terceiro setor ou o setor privado” e até admite que “há tarefas essenciais que o terceiro setor, melhor do que o setor público pode desempenhar”. Mas a nova lei de bases precisava de uma “clarificação”: “É bom que haja medicina privada, mas não queremos que a saúde seja indistintamente assegurada por uns ou por outros”, defendeu. Aprovar o documento-base do setor será “algo absolutamente fundamental para os socialistas” até julho. Mas há mais tarefas a cumprir.

Por um lado, o programa nacional de investimentos: “Um compromisso eleitoral fundamental do PS, que apresentaremos no início do ano na Assembleia da República”, garantiu. Costa não esconde que deseja uma “maioria de dois terços” para o documento que define os grandes investimentos públicos da próxima década, mas também lembra a história recente.

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“Há quem nos acuse de estarmos há três anos no Governo e não termos construído o novo aeroporto” de Lisboa, mas “são exatamente os mesmos que há dez anos inviabilizaram” o arranque dessa obra. A “falta de consenso político” paga-se caro e Costa não quer “mais casos destes”.

Havia outro encargo na lista do líder socialista: o combate à precariedade. “A par da habitação, a precariedade laboral é o maior problema que se vive hoje na nossa sociedade”, porque“mina a confiança” das gerações mais novas e “gera incerteza”. Esse combate, dramatiza, “tem de ser o ponto de honra do PS”.

A lei laboral é um daqueles terrenos em que Costa tem encontrado resistências à esquerda. Na intervenção perante a bancada socialista — e onde estavam figuras do Governo como a ministra da Saúde, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, o ministro da Defesa e o ministro da Educação —, o secretário-geral do PS reforçou os argumentos para esses interlocutores, ao reassegurar que a proposta de revisão do Código Laboral apresentada pelo Governo serve, pela primeira vez em décadas, “não para fragilizar os direitos dos trabalhadores, mas para reforçar os direitos dos trabalhados” e recorda que o documento chega à Assembleia da República com “respaldo num acordo de concertação social”. É, defende, “uma lei que merece ser aprovada, uma lei que urge aprovar”.

Antes de apresentar o plano de ação dos próximos meses, Costa falou para algumas das principais figuras do PS. Logo para o arranque da intervenção, o líder socialista tinha uma palavra preparada para Ferro Rodrigues —“um grande exemplo de militante, de dirigente e de político —, para Carlos César — “um grande coração” e um “grande dirigente” —, ambos ao seu lado durante a intervenção. Mas também havia uma referência para Pedro Nuno Santos, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, o elemento fundamental na ligação entre São Bento e os partidos à esquerda no Parlamento e alguém a quem são apontadas aspirações mais altas no palco político.

“Tem uma tarefa que é muito difícil, e que eu conheço bem porque a desempenhei durante quatro anos, muito exigente, que dá dissabores e um sentimento de pouca realização pessoal”, admitiu o líder do PS, para depois reconhecer que esse esforço assegurou “uma legislatura de estabilidade” e “tranquilidade na vida dos portugueses”.

Numa espécie de legislatura em revista, António Costa lembrou as alterações à lei eleitoral que permitiram recensear automaticamente 1,5 milhões de portugueses a viver fora do país e assinalou os passos dados em matéria de descentralização. Alguns vaticinavam uma “derrota”, mas “a verdade é que a Assembleia da República aprovou, o Presidente da República promulgou, o Diário da República publicou (…) e descentralização é hoje uma realidade”.

O líder do PS destacou ainda aquilo que define como uma “vitória política da maior importância”; as novas políticas de habitação, que serão debatidas no Parlamento no início do próximo ano depois de contratempos do próprio PS para aprovar legislação neste campo. “A forma como foi liberalizado o mercado [de habitação] demonstra como o PSD e o CDS são partidos que não olham às pessoas, são partidos que olham ao mercado, aos seus interesses, àqueles que querem ganhar dinheiro”.