O hospital de São João, no Porto, encerrou os serviços farmacêuticos durante a noite por falta de pessoal, deixando também de poder dar apoio noturno a grande parte da região. A denúncia foi feita pela Ordem dos Farmacêuticos e comunicada numa carta enviada à ministra da Saúde na qual a bastonária alerta para o facto de a segurança dos doentes estar em causa em muitos hospitais públicos.

Bastonária queixa-se: só falta os farmacêuticos “lavarem o chão” dos hospitais públicos

Segundo a carta, a que a agência Lusa teve acesso, o São João era um dos dois hospitais que dava até agora apoio noturno a grande parte da zona norte, como Matosinhos e Gaia, que já tinham fechado os serviços de prevenção por incapacidade de dar resposta.

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Agora,  também o São João vai ter de encerrar o serviço farmacêutico entre as 20:00 e as 08:00, segundo explicou à Lusa a bastonária.

O diretor dos serviços farmacêuticos do São João, Paulo Carinha, apontou para um “aumento de situações de potencial erro”, tendo inclusivamente remetido cartas ao primeiro-ministro e ao Presidente da República sobre o assunto.

Numa dessas cartas, a que a agência Lusa teve acesso, Paulo Carinha afirma que “o risco de ocorrência de erros graves”, por cansaço, excesso de trabalho e acumulação de tarefas, é “demasiado grave para poder ser ignorado”.

Num documento remetido à Presidência da República em setembro passado, o responsável relatou mesmo que só em agosto houve três erros com medicação e pelo menos um deles foi grave, com dano para o doente, que teve de ser internado por intoxicação.

Paulo Carinha alude a uma “situação dramática” vivida no seu serviço, que agora tem de encerrar durante o período noturno.

No ofício enviado à administração do hospital no mês passado, o diretor dos serviços farmacêuticos do São João refere que é imprescindível a entrada imediata de oito farmacêuticos e quatro técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica.

A falta de profissionais nos serviços farmacêuticos dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde está a fazer com que a atividade tenha de ser reduzida nalgumas unidades, de forma a continuarem a garantir a segurança nos serviços prestados, como a preparação de medicamentos, diz a bastonária da Ordem.

Segundo Ana Paula Martins, também no hospital de São João, como “em outros grandes centros hospitalares”, teve de haver “redução do número de horas de preparação de citotóxicos” (para doentes oncológicos) e de nutrição parentérica (endovenosa).

“Não estamos neste momento em condições, em algumas zonas do país, de assegurar durante 24 horas por dia a segurança no circuito do medicamento”, lamenta a bastonária, referindo que estão em falta cerca de 150 farmacêuticos e mais outros tantos técnicos de diagnóstico e terapêutica para assegurar o trabalho das farmácias hospitalares.

Ana Paula Martins diz que os serviços estão a ser forçados a reduzir o número de horas em que estão a garantir as necessidades dos hospitais, para poderem fazer o trabalho em segurança.

Na carta à ministra Marta Temido, a Ordem frisa que em vários hospitais não há farmacêuticos suficientes para a sua função, acrescentando que ainda têm de fazer trabalho de outros profissionais, que são também escassos.

Adiministração admite não ser possivel manter Serviço de Farmácia na sua plenitude

A administração do Hospital de São João, no Porto, admitiu esta sexta-feira que, devido a “um défice muito relevante” de recursos humanos, “não é possível” manter o Serviço de Farmácia “na sua plenitude”.

Devido à situação deficitária não é possível ao Serviço de Farmácia manter o nível de serviço na sua plenitude e que sempre foi norma no Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ)”, afirma a administração do hospital, em comunicado.

De acordo com a nota de imprensa, “não está tomada nenhuma decisão definitiva em relação à manutenção da presença física de farmacêutico durante o período noturno, mas, tal como em outros hospitais, pode não ser possível manter a prestação atual”.

Em resposta a uma denúncia feita pela Ordem dos Farmacêuticos, o hospital explica que “está identificado um défice muito relevante de recursos humanos nos Serviços Farmacêuticos (farmacêuticos e técnicos) do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), que foi agravado com a passagem recente dos horários para as 35 horas”. “Por este motivo, desde 2017 que o CHUSJ tem vindo a reclamar, sem sucesso, a contratação de recursos adicionais”, sublinha.

Na nota de imprensa, a administração do hospital afirma que “estão em preparação medidas de recurso que garantam a continuidade de tratamentos, o fornecimento imediato e tempestivo de fármacos e que envolvem a preparação e a constituição de armazéns avançados nos serviços clínicos e a preparação dos profissionais para esta contingência”.

Esclarece que “em julho de 2018 verificou-se uma desconformidade no fornecimento de um fármaco a um doente, da qual não resultaram sequelas permanentes para o doente devido à pronta intervenção dos profissionais logo que a situação foi detetada”.

“Na sequência do incidente foram tomadas medidas corretivas de que resultaram: a modificação das pausas e períodos de descanso na unidade de farmácia de ambulatório e a implementação de dois polos, em vez de um, da farmácia de ambulatório, concentrando num deles o doente oncológico, de forma a reduzir o stress e sobrecarga profissional e a verticalizar competências”, acrescenta.

Na denúncia, feita pela Ordem dos Farmacêuticos e comunicada por carta à ministra da Saúde, a bastonária alerta que a segurança dos doentes está em causa em muitos hospitais públicos, avisando para a dificuldade de garantir a segurança no circuito do medicamento 24 horas por dia.

O São João vai ter de encerrar o serviço farmacêutico de prevenção entre as 20h00 e as 8h00, segundo explicou à Lusa a bastonária.

A ministra da Saúde disse esta sexta-feira, em Coimbra, que as suas equipas estão a trabalhar para ultrapassar a questão da falta de recursos humanos nas farmácias hospitalares.

“A preocupação da senhora bastonária da Ordem dos Farmacêuticos mereceu-me a mesma preocupação, com a circunstância adicional de que à ministra da Saúde cabe-lhe ultrapassar os problemas”, disse Marta Temido.

A governante, que falava aos jornalistas à margem do encontro “Liderança e Governação Clínica – Um compromisso com o SNS”, adiantou que é nisso que as suas equipas estão a trabalhar neste momento, prometendo mais desenvolvimentos durante o dia