O ministro da Cultura cabo-verdiano, Abraão Vicente, disse esta quinta-feira que o governo pretende a “classificação imediata” do crioulo como património nacional, entendendo que isso irá permitir um debate mais forte sobre a sua oficialização, com base científica.

“A nossa meta é que haja classificação imediata da língua cabo-verdiana como património nacional e pretendemos que seja cumprida ainda no decorrer desta legislatura”, perspetivou Abraão Vicente, numa mensagem alusiva ao Dia Internacional da Língua Materna.

Segundo o ministro, a classificação do crioulo como património nacional irá reconhecer o valor cultural da língua enquanto produto/património da Nação e partilhado por todos os cabo-verdianos.

Abraão Vicente referiu que o governo e vários organismos estatais têm trabalhado na criação das bases para um debate mais forte sobre a oficialização da língua cabo-verdiana, com base científica, mas entende que isso passa pelo reconhecimento da língua materna, através da classificação como património nacional.

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Classificar a língua cabo-verdiana a património nacional é reconhecê-la como o maior legado deixado pelo nosso percurso coletivo como Nação. É valorizar a identidade que iniciou o seu traçar na Ribeira Grande de Santiago, mais precisamente na Cidade Velha, aquando da descoberta deste arquipélago”, prosseguiu

Para a classificação, Abraão Vicente disse que será criada uma equipa multidisciplinar para trabalhar o dossiê, que será constituída por antropólogos, historiadores e gestores de património, e que, entre as várias missões, irá realizar a inventariação da língua cabo-verdiana.

O ministro entende que ao reconhecer o crioulo como património imaterial nacional, o Estado de Cabo Verde estará em condições para prosseguir com a sua oficialização através da Constituição da República e, por fim, avançar com a padronização.

“Para este governo, a oficialização da língua cabo-verdiana está na linha da frente, de modo que na próxima revisão constitucional seja debatida e reconhecida como língua oficial de Cabo Verde”, escreveu Abraão Vicente na mensagem enviada à imprensa, classificando o crioulo como “um dos maiores patrimónios criados pelo povo cabo-verdiano”.

O ministro reconheceu que a padronização da escrita do crioulo é um processo moroso e que pode levar duas ou três gerações, mas adiantou que o governo está a criar as condições necessárias para que seja ensinado e escrito em todo o território nacional.

Neste sentido, deu conta de que já se iniciou o processo de valorização no seio estudantil, num “trabalho minucioso de valorização”, através do programa de educação patrimonial. Também disse que está em elaboração o plano estratégico de educação patrimonial, para a valorização da língua materna num projeto que disse será de médio e longo prazo.

“Agora, mais do que nunca, prepara-se todos os meios para elevar, formalmente, a língua cabo-verdiana à dignidade e igualdade estatutária que ela merece”, projetou o ministro.

A Constituição da República de Cabo Verde ressalva que o Estado deva promover as condições para a oficialização da língua materna, em paridade com a língua oficial, no caso o português.

Presidente recomenda definição de “regras claras” para a escrita do crioulo

O Presidente da República de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, considerou esta quinta-feira que será de “grande valia” a definição de “regras claras” para a escrita do crioulo, entendendo que isso permitirá a sua utilização no sistema de ensino.

“Os estudos e trabalhos de investigação em curso nas diferentes disciplinas relacionadas com a língua cabo-verdiana têm trazido contribuições importantes, mas seria desejável que o processo avançasse para que, num espaço de tempo razoável, pudéssemos ter a possibilidade de, também, escrevê-la de acordo com normas adequadas”, disse o chefe de Estado cabo-verdiano.

Jorge Carlos Fonseca fez a recomendação numa mensagem alusiva ao Dia Internacional da Língua Materna, que se assinala esta quinta-feira, sendo que no caso de Cabo Verde a língua materna é o crioulo.

O chefe de Estado sublinhou que o crioulo é um dos principais traços de união entre os cabo-verdianos e disse que a sua promoção, “longe de contribuir para a secundarização da língua portuguesa”, permitirá uma convivência mais adequada entre ambas.

Lembrando a presença do crioulo na música, literatura e no dia a dia, Jorge Carlos Fonseca entendeu que é preciso que sejam definidas “regras claras” para a sua escrita, considerando que isso permitirá a sua utilização no sistema de ensino, além das experiências-piloto no país.

O mais alto magistrado da nação cabo-verdiana lembrou que um dos mais importantes veículos da língua materna, a morna, se candidata património imaterial da UNESCO, referindo, por isso, que esta celebração adquire importância particular.

Acreditamos que os trabalhos realizados com vista ao reconhecimento da Morna como Património Imaterial da Humanidade, as investigações sobre a língua materna em curso e o possível desfecho positivo dessa candidatura, constituem incentivos muito importantes para a afirmação da língua cabo-verdiana”, sustentou Fonseca

O Presidente da República sublinhou ainda as “importantíssimas contribuições” para o crioulo dadas por Eugénio Tavares, B.Leza, Orlando Pantera ou Sérgio Frusoni.

O Dia Internacional da Língua Materna foi instituído pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em 1999. A data é comemorada em todos os países membros da UNESCO, com o objetivo de salvaguardar, promover as línguas faladas pelos povos em todo o mundo.

Para assinalar o Dia Internacional da Língua Materna, a linguista e investigadora do Instituto do Património Cultural (IPC) cabo-verdiano vai lançar um livro de bolso para ajudar quem fala crioulo mas desconhece as suas regras gramaticais.

“Auto da língua cabo-verdiana” é o título da obra que é considerada pioneira no arquipélago, que foi feita a pensar em quem já fala crioulo e que o pretende fazer corretamente.