Sobem para três as demissões no Governo e nos seus gabinetes na sequência do caso Familygate. Depois do afastamento do secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, e do seu adjunto e primo, Armindo Alves, agora foi a vez de o marido da secretária de Estado da Cultura, João Ruivo, ser exonerado da secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional.

O despacho publicado esta sexta-feira em Diário da República indica que o marido da secretária de Estado Ângela Ferreira tinha sido nomeado a 28 de março — precisamente o mesmo dia em que o Observador noticiou a sua nomeação — enquanto outro despacho, também publicado esta sexta-feira, aponta que foi exonerado a 10 de abril. O também vereador do PS na câmara de Cascais foi nomeado como técnico especialista pela secretária de Estado Maria do Céu Albuquerque menos de seis meses depois de a mulher ter tomado posse no Governo. Só esteve 13 dias no cargo. Cria, por isso, uma situação insólita: a nomeação e a exoneração ser publicada no mesmo dia em Diário da República.

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O caso de João Ruivo foi noticiado pelo Observador a 28 de março de 2019 como mais um exemplo de um familiar de governante nomeado por um outro governante. O vereador da câmara de Cascais, sabe o Observador, pediu para ser demitido das funções para não prejudicar o trabalho da mulher como governante num outro ministério. O despacho de exoneração tem o jargão habitual nestes casos: “Exonerou, a seu pedido“. O Observador contactou João Ruivo, que chegou a pedir que o contacto fosse feito por mensagem, mas não respondeu às questões após ser informado sobre qual era o assunto.

João Ruivo é vereador sem pelouro da câmara de Cascais, eleito pelas listas do PS, desde 2017. Foto: Facebook de João Ruivo

O caso de João Ruivo e Ângela Ferreira não configura uma nomeação direta de um familiar (como aconteceu com Carlos Martins e Armindo Alves), mas sim de um secretário de Estado que nomeou o cônjuge de outro secretário de Estado, a chamada nomeação cruzada. A lei atual não impede estes casos e a que está a ser preparada na Assembleia da República (e já conhecida proposta do PS) também não impede, embora obrigue a sejam tornados públicos.

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A lei que estabelece a orgânica (decreto-Lei n.º 11/2012) dos gabinetes do Governo que os técnicos especialistas têm “funções de assessoria especializada” e que devem ser “preferencialmente detentores de relação jurídica de emprego público ou provenientes de entidades do sector público sob tutela ou superintendência do respetivo membro de Governo”. Neste caso, não se parece verificar nada disto.

A nível de habilitações académicas, o currículo de João Ruivo é escasso nesta (e noutras) áreas: “Desde 2018 inscrito na licenciatura Gestão Autárquica, Instituto Superior Educação e Ciências“; “frequência da licenciatura de Economia no ISEG em 2009“; e “frequência de licenciatura Informática de Gestão entre 1997 e 1999 na Universidade Moderna”.

Quanto à experiência profissional também não há nada que indique que é especialista na área do Desenvolvimento Regional.  De 2000 a 2004, João Ruivo foi chefe de secção na FNAC Portugal. De 2004 a 2006 foi gestor de conta na empresa de Distribuição e Logística para a Informática, DLI. Entre 2006 e 2007 foi diretor Departamento na empresa J.P. Sá Couto, S. A., a empresa que um ano depois começou a distribuir os mediáticos computadores Magalhães. De 2008 a 2012 foi “country manager” da empresa TOPCOM. Nesse ano, tornou-se gestor de Conta Sénior na empresa ADVEO, onde ficou até 2014. Sai então para diretorde departamento na empresa GTI Software & Networking, onde fica até 2018. Ou seja: o seu currículo é ligado a empresas de informática.

Do currículo de João Ruivo consta também a intervenção política e cívica, mas sem especial relação com a área para o qual foi nomeado. O marido da secretária de Estado é vereador sem pelouros da Câmara Municipal de Cascais desde 2017. É também desde 2009 vice-presidente da direção de Associação Familiar e Desportiva da Torre e entre 2011 e 2019 foi diretor executivo da Associação Humanitária dos Bombeiros de Alcabideche. Foi também membro da assembleia de freguesia de Cascais entre 2001 e 2005 e da assembleia de freguesia de Alcabideche entre 2005 e 2017