Luís Marques Mendes não poupa nas palavras para criticar o depoimento de Joe Berardo na Comissão de Inquérito Parlamentar à Caixa Geral de Depósitos. “Este homem esteve no Parlamento manifestamente a “gozar com o pagode”. Não tem o mínimo de respeito pelos portugueses que viram milhões de euros dos seus impostos a entrar nos Bancos, por causa dos prejuízos que este homem e outros causaram ao sistema financeiro”, afirmou no seu habitual espaço de comentários da SIC.

O ex-líder do PSD não se ficou por aqui e diz mesmo que Berardo “não tem um pingo de vergonha. Depois de tudo o que se passou, dizer que pessoalmente não deve nada e que ainda anda a ajudar os Bancos só pode suceder com quem tem uma ‘lata’ monumental e um descaramento do tamanho do mundo”.

Os responsáveis dos bancos, nomeadamente da Caixa Geral de Depósitos e do Banco Comercial Português, também estiveram na mira de Marques Mendes. “Mais assustador é pensar o seguinte:  como é possível que os Bancos tenham emprestado quase mil milhões de euros a uma pessoa com estas características? Em muitos países, em condições semelhantes, já havia gente na prisão – gestores e devedores. Infelizmente, em Portugal, a justiça demora tempo de mais a investigar, a decidir e a julgar. É assim que se perde a confiança nas instituições do Estado”, concluiu.

Governo deve ficar com 100% do capital do SIRESP

“Na sequência dos incêndios de 2017 o Estado e o SIRESP combinaram que o SIRESP iria fazer grandes investimentos para tornar a rede mais operacional”, notou Marques Mendes, afirmando que “o Estado não pagou” por a alteração de contrato nunca ter recebido o visto do Tribunal de Contas, tendo “os privados do SIRESP ameaçado cortar o sinal e o Estado respondido com a ameaça de nacionalização”.

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Marques Mendes anunciou ainda que a situação se está a resolver com “negociações bem encaminhadas” entre o Governo e os acionistas PT Móveis (Altice) e Motorola Solutions para que o Estado fique com 100% do capital da empresa que gere a rede de comunicações das forças de segurança. “Em princípio,  a nacionalização já não vai avançar porque estão em curso negociações amigáveis entre as partes para o Estado adquirir o capital privado do SIRESP por via amigável. As negociações estão bem encaminhadas mas não estão concluídas”, enfatiza o comentador.

O epílogo da crise política: Costa não ganha tanto como gostaria e Rio mancha a sua imagem

Quanto ao fim da crise política após o chumbo da lei sobre a carreira dos professores, Marques Mendes considera que o “país ganhou e muito; Costa ganhou claramente mas não tanto quanto desejava; Rio e Cristas perderam bastante; PCP e BE nem ganharam nem perderam”.

Ou seja, “evitou-se o que seria um pandemónio político e financeiro, com todas as classes profissionais a exigirem o mesmo tratamento dos professores. E mostrou-se que, apesar da importância dos sindicatos, quem manda em Portugal é o poder político e não o poder sindical. Isto é muito importante para a democracia.”

Por outro, continuou, António Costa “desejava ter eleições antecipadas e não conseguiu. Mas ganha autoridade política, porque mostrou coragem e responsabilidade. Poucos políticos enfrentariam, a poucos meses de eleições, uma classe tão numerosa e poderosa como a dos professores”. Além disso, diz Mendes, coneguiu inverter “a dinâmica de campanha” para as europeias. “A campanha do PS estava sem alma. Ganhou um balão de oxigénio.” Já as campanhas do PSD e do CDS, “ao invés, perderam em crença e motivação.”

Na “derrota” do PSD e do CDS na crise política, que Mendes considera que é “grande” — “maior mesmo que a vitória de Costa” — é destacado o papel de Rui Rio. O líder do PSD, diz Mendes, “tinha uma imagem de político de contas certas que não cede à táctica política. Acabou por fazer tudo ao contrário. Perante um caso prático, Rio deu a imagem de taticista, tentando agradar aos professores pela caça ao voto, cedendo na sua imagem de rigor financeiro”.

Além disso, Rio, critica o também conselheiro de Estado, “teve uma atitude que não o favorece: atirar a culpa para os deputados. Isto não é bonito (um líder deve assumir e não alijar responsabilidades); e não é justo – Margarida Mano é uma deputada correta e leal.”

Já Assunção Cristas “foi mais inteligente porque esteve mais recatada. Mas o que fez na semana passada foi mau para a sua imagem e do CDS. Não se percebe como é que tem desbaratado o capital que adquiriu há ano e meio nas autárquicas em Lisboa.”

Sobre o futuro, nomeadamente o pós-legislativas de Outubro, Marques Mendes considera que a crise política começou a clarificar um ponto: “no futuro, nem é provável um Governo de Bloco Central, nem uma geringonça formal como a que tivemos até agora”.

Cada vez é mais provável um governo minoritário do PS, de geometria variável, fazendo acordos à esquerda e à direita, num cenário em que regressa o risco da instabilidade e dos governos de curta duração”, conclui.

O silêncio de Marcelo: o “padrão correto”

Quanto à maior surpresa de toda a crise política, o silêncio do Presidente da República, Marques Mendes fez uma análise cuidadosa. Para o comentador, Marcelo não tinha outra alternativa. Porquê? Devido a três razões:

  • “Se falasse, qualquer palavra que dissesse era interpretada como estando de um de lado ou de outro, a tomar partido por uma parte ou por outra. Passava de árbitro a jogador. Ainda por cima em tempo eleitoral.”
  • “Tinha de se resguardar para o caso de haver mesmo crise e ter de a resolver, decidindo ou não convocar eleições antecipadas. Qualquer sinal que desse antes, estava a beneficiar uns e a prejudicar outros.”
  • “Seguiu o exemplo de outros Presidentes em tempo de crise política, segundo o qual o Presidente nunca fala no decurso da crise. Foi assim com Cavaco Silva, na crise do PEC4, e foi assim com Mário Soares em 1987, quando houve um conflito entre o então Governo do PSD e a oposição do PS e PRD. Num caso e noutro, os ex-Presidentes só falaram no final da crise. Para a resolverem.”

Por isso mesmo, Mendes considera que o Presidente Marcelo adotou aquilo que designa de “padrão correto.”

António Costa em 2024? Ou Presidente da República ou da Comissão Europeia

Marques Mendes, tomando como garantida a permanência de António Costa como primeiro-ministro por mais um mandato, projetou a futura carreira política do líder socialista: “Daqui a cinco anos, tem de fazer uma opção — ou ser candidato a Presidente da República, depois de dois mandatos de Marcelo Rebelo de Sousa; ou ir para um cargo europeu

E entre o caminho europeu ou presidencial, Mendes garante que não se “surpreendia nada” se António Costa procurasse um cargo europeu após um segundo mandato como primeiro-ministro.

Por agora, o comentador televisivo aponta Michel Barnier, o Comissário que negociou o Brexit, como um possível candidato a Presidente da Comissão Europeia, já que ” uma maioria de países não aceita as candidaturas apresentadas pelos partidos”. Até agora, Manfred Weber, pelo PPE, e Frans Timmermans, do PSE, eram tidos como favoritos para assumir a posição.