Joaquim Barroca confessou que ficou admirado por o terem chamado à comissão parlamentar de inquérito à Caixa. Ao longo da audição realizada esta quinta feira ao antigo gestor e ainda hoje acionista do Grupo Lena os deputados terão até concordado, ainda que pontualmente, perante as respostas evasivas sobre a negociação dos créditos com a Caixa Geral de Depósitos que terão chegado a ultrapassar os 300 milhões de euros.

Ainda que não tenha confirmado os valores em dívida, o ainda acionista (minoritário) do Grupo Lena garantiu que todos no grupo estão a trabalhar para pagar essa dívida.

“Nunca dissemos aos bancos que não íamos pagar. Todos os dias trabalhamos com o objetivo de pagar aos bancos”. E mais:  “Se tivessem pago o que nos devem, hoje não estaríamos aqui. Com o valor que temos a receber em três a quatro mercados poderíamos regularizar a divida”.

Joaquim Barroca referiu Angola, Venezuela e Argélia, países cuja capacidade financeira foi afetada pela desvalorização do petróleo a partir de 2015.

Mas as respostas mais frequentes foram: “Não sei, não posso precisar, não estive presente, não acompanhei.” A ponto do deputado comunista Duarte Alves ter perguntado: Afinal quem é que acha que deveria estar aqui do grupo Lena? Recordando que deixou de ter funções executivas há dez anos, Joaquim Barroca sugeriu o atual presidente executivo, Joaquim Paulo da Conceição.

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Discutiu expansão do grupo Lena com Sócrates? “Nunca, jamais”, responde Barroca

O motivo principal do interesse em ouvir Barroca no inquérito sobre a Caixa tem a ver com o mediatismo que o próprio referiu, mais concretamente, com a associação do antigo gestor do Grupo Lena à Operação Marquês onde é um dos acusados. Razão que aliás invocou para não responder a várias perguntas relacionadas com transações em Vale do Lobo. Não me convide a dizer algo que seja mau para mim”, respondeu ao deputado comunista Duarte Alves.

E se há devedor da Caixa cuja ligação direta ao ex-primeiro-ministro José Sócrates pode ser explorada pela comissão de inquérito é o grupo Lena e o seu antigo gestor. Joaquim Barroca é suspeito de ter facilitado através de contas suas e transações do grupo transferências para o antigo primeiro-ministro. E o amigo que José Sócrates que lhe emprestou dinheiro, Carlos Santos Silva, trabalhou com o grupo Lena desde meados dos anos 80. Por outro lado, o grupo ganhou contratos importantes adjudicados nesse período, nomeadamente pela Parque Escolar, para já não falar do contrato milionário (mil milhões de euros) para construir casas pré-fabricadas na Venezuela, anunciado numa visita do então primeiro-ministro português àquele país.

A ligação entre os grandes devedores da Caixa e o Governo de José Sócrates tem sido uma das linhas de atuação do PSD nesta comissão de inquérito, mas esta quinta-feira, praticamente todos os partidos foram atrás da pista.

Começando por Carlos Santos Silva. Joaquim Barroca descreveu como um parceiro do Grupo Lena que “prestava serviços, vendia conhecimentos, vendia projetos. Se eu quisesse perceber como poderia criar um projeto, pela sensibilidade que ele tinha era um bom conhecedor. Tinha projetos e projetistas.” A resposta a Inês Domingos do PSD.

A audição centrou-se muito na compra da construtora Abrantina, uma empresa em dificuldades financeiras e já com dívida à Caixa, em 2007. Foi com esta operação que a Caixa ficou com uma exposição ao Grupo Lena que se revelou problemática. A reestruturação da dívida da Abrantina, que segundo Barroca tinha créditos à Caixa que já estavam “mortos”, incobráveis, elevou o financiamento da Caixa ao grupo a 80 milhões de euros. A operação teve um parecer inicialmente negativo do parecer de risco, o qual exigiu condições que depois a Caixa aceitou prescindir: incluindo o aval pessoal da família dona do grupo Lena.

A Abrantina foi comprada porque tinha os alvarás que o Grupo Lena precisava para concorrer ao plano de investimentos e obras públicas lançado pelo Governo de José Sócrates, explicou Joaquim Barroca a Cecília Meireles do CDS. Acrescentou que a Caixa até apadrinhou esta operação que lhe permitiria recuperar créditos dados como perdidos, o que acabou por não acontecer, pelo menos totalmente, porque o plano de negócios não correu bem, reconheceu.

Joaquim Barroca não respondeu a perguntas sobre a negociação desta operação com a Caixa, porque não tratava de matérias financeiras. E até garantiu: “Nunca entrei na Caixa, nem sei onde é a entrada principal”. Mas quando argumentou que a dívida à Caixa resultou da reestruturação da dívida da Abrantina, foi prontamente desmentido por Mariana Mortágua.

“O que o Sr. está a dizer não é verdade, é mentira” A deputada do Bloco explicou que a dívida da Abrantina à Caixa eram apenas 16 milhões e o crédito que foi dado após a compra pela Lena foi de 80 milhões. Os créditos mortos eram apenas 10 milhões. Estes são os dados da Caixa. “Ou é por desconhecimento ou porque procura uma narrativa que não é validado por números”.

“Não vim para aqui para mentir, mas sim para tentar esclarecer o que possa. A realidade dos montantes e pormenores não posso precisar pelos anos e porque não estive”, respondeu Barroca.

O antigo gestor do Grupo Lena foi mais preciso, quase sempre pela negativa, nas respostas que deu às perguntas diretas sobre as suas relações com ex-gestores ou ex-políticos socialistas, muitos dos quais envolvidos na Operação Marquês.

  • Nunca discutiu com Vara os créditos na Caixa? Não. E com Sócrates? “Muito menos”.
  • Nunca discutiu expansão do grupo Lena com Sócrates. “Nunca, jamais”.
  • Quis comprar um lote em Vale do Lobo? Nunca comprou, mas mais tarde admitiu que assinou uma promessa de intenção de compra que nunca conduziu à movimentação de dinheiro. .
  • E Hélder Bataglia? Conhece, mas não muito bem.
  • Tem contas na Suíça? Não, tive até 2012.
  • E alguma vez fez uma transferência bancária para Vara administrador da Caixa? “Isso faz parte da Operação Marquês”, recorda Joaquim Barroca que já assinalou reserva sobre esse tema.
  • Recebeu numa conta sua dinheiro de um cliente holandês de Vale do Lobo? A mesma resposta já dada sobre o tema.
  • Alguma vez negociou com o gabinete de Sócrates um contrato com a Venezuela? “A que propósito. claro que não”.
  • E com outros ministros? A que propósito?
  • E teve contactos com Guilherme Dray (foi chefe de gabinete do ministro Mário Lino e mais tarde do primeiro-ministro José Sócrates)? “Só posso falar por mim, Eu não”.
  • E o Sr. Carlos Santos Silva teve contactos com estas pessoas? “Não sei”.

O ex-gestor do grupo Lena recusou ainda qualquer tese da triangulação entre Caixa e Governo de Sócrates, levantada pelo PSD. “Foi um mais-valia? Não”, até retirou valor ao grupo por exposição mediática. “Não sinto que tivesse trazido algum beneficio ao grupo.