Era apenas uma ameaça, acompanhada de um pedido de desculpas (por antecipação). Nesta segunda-feira a possibilidade de uma greve dos (únicos) motoristas que podem transportar combustíveis tornou-se mais real. O Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), que em abril paralisou o país durante dias, e o Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM) entregaram esta segunda-feira um pré-aviso de greve para 12 de agosto.
A decisão foi tomada no decorrer de uma reunião entre a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) e as estruturas sindicais, na sede da Direção Geral das Relações do Trabalho (DGERT), do ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, em Lisboa.
À saída da reunião, mais uma vez, acusações mútuas. Pedro Pardal Henriques, vice-presidente do Sindicato Nacional das Matérias Perigosas, garantiu que a ANTRAM está a mentir e que a associação que representa as empresas do setor não quer reconhecer o aumento gradual que tinha prometido.
“Se a ANTRAM voltar atrás nesta postura ridícula que está a ter de dar o dito por não dito, a greve será desconvocada, [mas] se a ANTRAM mantiver esta postura de não aceitar cumprir aquilo a que se comprometeu com os motoristas, a greve será realizada”, reiterou o vice-presidente do diz contar com o apoio de sindicatos espanhóis.
A ANTRAM devolve a acusação, apontando ao sindicato a intenção de “novamente ludibriar a comunicação social e aquilo que estava em cima da mesa nas negociações”. André Matias Almeida, advogado e representante da associação dos transportadores, remete para os protocolos assinados que, segundo a ANTRAM, “desmentem” o Sindicato Nacional das Matérias Perigosas.
A dividir trabalhadores e patrões estão as condições remuneratórias. Os representantes dos motoristas pretendem um acordo para aumentos graduais no salário-base até 2022: 700 euros em 2020, 800 euros em 2021 e 900 euros em 2022. Com os prémios suplementares que estão indexados ao salário-base, daria 1.400 euros no próximo ano, 1.550 euros em 2021 e 1.715 euros no ano seguinte.
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A associação que defende as transportadoras sugere um aumento de 300 euros para o próximo ano, mas não avançou com propostas nesta reunião porque “ninguém pode negociar sob ameaça e sob pressões constantes de pré-aviso de greve”, afirmou aos jornalistas André Matias Almeida. “O Sindicato das Matérias Perigosas quer discutir uma greve para este ano relativamente a um aumento que não negociou para 2022”, apontou ainda.
As negociações, no entanto, continuam noutra frente, com a FECTRANS — Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações, afeta à CGTP, que decidiu não avançar com a greve. A ANTRAM vai enviar propostas esta terça-feira e o processo vai continuar “num ambiente normal, de boa fé negocial”, garante André Matias Almeida.
Questionado pelos jornalistas se iria juntar-se à greve, José Oliveira, da FECTRANS, disse que tudo dependerá “do que for o desenvolvimento desta negociação”.
O SNMMP e o SIMM anunciaram no dia 6 uma paralisação, com início a 12 de agosto. Os dois sindicatos independentes, juntamente com a federação sindical filiada na CGTP, têm vindo a negociar com a associação empresarial do setor, a ANTRAM, a revisão do contrato coletivo, sob a mediação da Direção Geral do Emprego e Relações de Trabalho do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
O SNMMP foi criado no final de 2018 e tornou-se conhecido com a greve iniciada a 15 de abril, que levou o Governo a decretar uma requisição civil e, posteriormente, a convidar as partes a sentarem-se à mesa para negociações. A elevada adesão à greve de três dias surpreendeu todos, incluindo o próprio sindicato, e deixou sem combustível grande parte dos postos de abastecimento do país.
(Atualizada às 22:15)