Dois bebés que nasceram em Portugal na semana passada, filhos de imigrantes nepaleses que estão a trabalhar de forma legal no país — e que, portanto, teriam direito a serem considerados “portugueses de origem”, de acordo com a lei — não puderam ser ainda registados por falta de tradutor. A notícia é avançada pelo jornal Público, que dá conta de que estes duas crianças podem não ser caso único, já que o próprio Instituto dos Registos e Notariado (IRN) confirmou ao jornal já ter sinalizado que há “necessidade” de encontrar uma solução.

Os casos em questão aconteceram no Hospital de Beja, onde nasceram as duas crianças a 14 e 15 de julho deste ano. Os pais, nepaleses, são trabalhadores agrícolas na zona de Odemira e estão em Portugal com residência autorizada há mais de dois anos. Um deles fala português e ambos comunicam em inglês, de acordo com o Público. No entanto, como as mães das crianças não falam português, foi-lhes exigido que arranjassem um tradutor para poder registar os bebés. “Ofereci-me para traduzir o que a mulher [do outro imigrante,  Laxman Sharman] dizia e ele para traduzir o que a minha mulher dizia, mas não deixaram. Temos todos os documentos em dia. É muito cruel”,  declarou Babu Ghimire, pai de uma das crianças. Segundo o nepalês, uma enfermeira ter-se-á oferecido para traduzir do inglês, mas tal não foi aceite.

O IRN confirmou ao jornal que “cabe aos pais” fazerem-se “acompanhar por tradutor habilitado” e confirmou não ter “conhecimento de que existam intérpretes nos hospitais e maternidades”. Contudo, reconheceu que quando os funcionários falam outras línguas para lá do português, “possa haver dispensa de tradutor como uma mera faculdade”. Para além disso, o organismo garantiu que foi “sinalizada a necessidade de assegurar a tradução das declarações prestadas”, ou seja, que no futuro deverá haver solução para o problema.

Fátima Ferreira, do Sindicato Nacional Dos Registos, explicou ao Público as razões pelas quais a lei exige que haja um tradutor independente para registar os recém-nascidos filhos de estrangeiros, já que o registo “envolve muita lei, a lei da nacionalidade, a lei da composição do nome”, concretiza. Como exemplos concretos, dá a ordem dos apelidos de pais e mães (que variam de cultura para cultura), a necessidade de os pais entenderem perfeitamente o que lhes é perguntado ou até o possível conflito de interesses entre pai e mãe sobre a escolha da nacionalidade da criança.

Sem estarem formalmente registadas, as crianças não podem aceder a direitos como as prestações do abono de família ou a inscrição nos centros de saúde. No caso dos dois imigrantes ouvidos pelo Público, uma das crianças está a ser acompanhada no centro de saúde de São Teotónio (Odemira) “por simpatia”. A outra continua sem acompanhamento médico.

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