A freguesia de Airão Santa Maria tem uma estrada encerrada entre duas pedreiras desde março. A Câmara Municipal de Guimarães entendeu que estava em causa a segurança da população e mandou cortar o caminho com efeitos imediatos. Os técnicos do Ministério do Ambiente terão estado no local uns meses antes, segundo um dos proprietários, mas só terá mandado colocar vedações nas pedreiras.
“Identificado o problema – grave – de segurança relativa à circulação de pessoas e veículos (o que foi feito pelos técnicos municipais no âmbito do trabalho que estava a ser realizado) a Câmara procedeu a uma avaliação que resultou na necessidade de imediato se proceder ao corte do arruamento”, responde o município ao Observador. O corte da via foi realizado pela Proteção Civil Municipal, mas o presidente da Junta de Freguesia, Marçal Salazar, não conhece exatamente o motivo. Queixa-se de nunca ter visto o relatório que levou a esta decisão.
“A questão da segurança para nós é primordial, mas mais do que isso não sei dizer porque não tenho acesso ao relatório”, explica ao Observador Marçal Salazar. É por isso que entende os protestos da população, obrigada a mudar as rotinas por causa da estrada fechada. Para as pessoas que não assistiram a qualquer problema naquela pedreira e que não entendem qual o risco neste momento, o maior problema é terem de fazer um desvio de um ou dois quilómetros pela via alternativa.
A estrada está cortada desde 26 de março, segundo o Jornal de Notícias, e, aparentemente, ainda não há uma solução para o problema, apesar dos apelos do presidente da Junta. Domingos Pinheiro, que explora uma das pedreiras junto à estrada, critica o corte da estrada e o facto de nunca ter sido chamado para uma reunião no município. Todas as comunicações que recebeu da câmara foram sobre as vedações, que já tinha colocado por ordem do Ministério do Ambiente, segundo conta. “Antes de fecharem a estrada, já eu tinha vedado aquilo”, diz ao Observador Domingos Pinheiro.
O acidente de Borba serviu de alerta em todo o país
O acidente na estrada nacional 255, em Borba, com a morte de cinco pessoas, em novembro de 2018, lançou o alerta para o risco das pedreiras em todo o país. A Câmara Municipal de Guimarães decidiu prontamente fazer um levantamento da situação das pedreiras do concelho, incluindo as que não estão sob a alçada do município, ou seja, as que são fiscalizadas pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), tutelada pelo Ministério do Ambiente e Transição Energética. As preocupações principais do município eram a segurança e as questões ambientais.
“Entendemos este trabalho como uma boa prática, pois antecipa problemas e propõe critérios de intervenção baseados num conhecimento transversal, completo e efetivo da realidade no nosso território”, justifica a Câmara. Este levantamento, feito pelas divisões e departamentos municipais, dará origem a um relatório com todas as pedreiras no concelho, mas ainda não está finalizado — por exemplo, ainda faltam as pedreiras licenciadas pela DGEG. A Câmara, no entanto, considerou que a situação na freguesia de Airão Santa Maria era grave o suficiente para tomar medidas imediatas.
Domingos Pinheiro, dono da pedreira Fontegoda, de um dos lados da via, diz que recebeu uma visita do Ministério do Ambiente, em dezembro, solicitando que colocasse vedações na propriedade, o que afirma ter feito em uma ou duas semanas. “Desde que fiz a vedação, o Ministério do Ambiente nunca mais me chateou”, diz. “Em Janeiro, chatearam novamente o meu vizinho que ainda não tinha vedado.” Segundo conta, o vizinho, dono da pedreira Sorte da Pedra Quebrada, terá recebido um prazo para completar os trabalhos.
Apesar de Domingos Pinheiro afirmar que recebeu a visita dos técnicos do Ministério do Ambiente, nenhuma destas pedreira faz parte do “Plano de Intervenção em Pedreiras em Situação Crítica”, aprovado em Conselho de Ministros e publicado em Diário da República no dia 5 de março. Nesta lista estão 191 pedreiras — das 1.426 licenciadas pela DGEG — que “comportam um ou mais fatores de criticidade para pessoas e bens e para o ambiente, resultantes da sua atividade e do seu impacto na envolvente, independentemente do estado atual de licenciamento ou de atividade”.
“As pedreiras em causa não constam da listagem anexa à RCM 50/2019, por não preencherem os requisitos de perigosidade aí previstos”, diz ao Observador Cristina Lourenço, subdiretora-geral da DGEG, referindo-se à Resolução do Conselho de Ministros onde foi publicada a lista. Cristina Lourenço diz ainda que a autarquia pode adotar as medidas que quiser nas estruturas que façam parte da sua jurisdição, como é o caso da estrada.
Num esclarecimento posterior, Cristina Lourenço acrescenta que as duas pedreiras, Sorte da Pedra Quebrada e Fontegoda, “encontram-se licenciadas desde 1990 e 1991, respetivamente, pela Câmara Municipal de Guimarães” e que, por isso, “não preenchiam os requisitos para inclusão na listagem anexa à RCM 50/2019”. A Câmara Municipal de Guimarães confirmou ao Observador que as pedreiras passaram há pouco tempo para a alçada do município, mas não conseguiu, neste momento, confirmar em que data.
A população queixa-se por ter de fazer um desvio
Domingos Pinheiro diz que a empresa em nome individual que explora a pedreira já o faz há uns 50 anos e que a pedreira já existia há uns 70. Reforça até que a parede mais próxima da estrada já estava assim quando a via foi criada em 1987. Marçal Salazar, presidente da Junta, não conseguiu confirmar a data, mas admite que terá sido por essa altura e que a distância das pedreiras à estrada será, agora, mais ou menos a mesmo que na altura. O Observador não conseguiu confirmar a informação junto da Câmara Municipal de Guimarães.
Certo é que, neste momento, as pedreiras não têm sequer cinco metros de distância à estrada. Antes das vedações e sinalização que terão sido pedidas pelo Ministério do Ambiente, segundo o proprietário, tudo o que separava a estrada do buraco da exploração era um monte de terra, blocos de pedra e silvas. Ora, já desde 1976 que a legislação prevê uma distância de 50 metros às vias públicas, o que claramente não foi cumprido, nem agora, nem na altura. O presidente da Junta de Freguesia diz não ter conhecimento de reclamações da população em relação às pedreiras.
A população reclama agora, mas por outro motivo. Com a estrada cortada tem de fazer mais um ou dois quilómetros para chegar à zona da freguesia onde se encontram os serviços, a escola ou a igreja. “O que está a causar mais transtorno às pessoas é a mudança hábitos e de rotinas, porque as pessoas deixaram de passar naquele local e têm de fazer um desvio maior”, diz Marçal Salazar. “Mas não estão isoladas, há uma via de ligação. A estrada que ainda está aberta é uma estrada municipal e é segura.” O desvio em questão é só nos casos de deslocação de carro, porque se as pessoas quiserem fazer o trajeto cortado a pé podem fazê-lo.
“Sou obrigado a ir quase à vila de Joane, que é do concelho de Famalicão, para me deslocar para esta parte de cá”, queixa-se José Oliveira, um morador da freguesia de Airão, ao Jornal de Notícias. A volta parece grande, mas a verdade é que a fronteira com a freguesia de Joane é próxima da zona onde a estrada foi cortada, explica o presidente da Junta. Ao Observador garante: “O nosso papel é pressionar a câmara para que agilize, o mais rapidamente possível, uma solução para isto, mas sempre salvaguardando a segurança das pessoas”.
Artigo corrigido às 17h15 do dia 19 de agosto, com a informação de que as pedreiras estão sob a alçada da Câmara Municipal de Guimarães, logo não constam da lista do Governo, que tem apenas pedreiras licenciadas pela Direção-Geral de Energia e Geologia.