Samuel Infante, da associação ambientalista Quercus, referiu este sábado que o relatório sobre o impacte de emissões de CO2 da mineração de lítio em Portugal, que será apresentado na segunda-feira, aponta que, se o Governo avançar com a campanha de exploração de lítio, “Portugal não vai conseguir cumprir a neutralidade carbónica”.

O responsável que falava do assunto aos jornalistas na Torre, o ponto mais alto da Serra da Estrela, à margem de uma ação organizada por um grupo de cidadãos e associações ambientais contra a exploração de lítio em Portugal, disse que, segundo o estudo, a exploração de lítio irá “ter um impacto muito significativo em termos da qualidade de vida” das populações e ao nível do desenvolvimento local das regiões abrangidas.

O estudo, elaborado a nível nacional, revela o “completo contrassenso do Governo” em estar “por um lado a querer atingir a neutralidade carbónica” e, por outro, “avançar com um plano de mineralização do lítio que contraria todo esse investimento e todos esses compromissos que Portugal tem estado a assumir a nível mundial no combate às alterações climáticas”, reforçou o dirigente da Quercus.

“É um contrassenso e não podemos, por um lado, querer que Portugal assuma a neutralidade carbónica, os compromissos das Nações Unidas, o combate às alterações climáticas, a descarbonização da economia e, por outro lado, estar a querer apostar na mineração com esta dimensão, com esta escala, com este impacto. E isso vai pôr em causa todos os compromissos internacionais que Portugal tem vindo a assumir”, disse Samuel Infante.

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Para o ambientalista, se o Governo quer cumprir os compromissos que assumiu perante as alterações climáticas, “não pode avançar” com o plano de mineração previsto para o país.

O relatório, que vai ser apresentado na segunda-feira, será enviado ao Governo, a quem a Quercus irá também pedir esclarecimentos.

400 pessoas na Serra da Estrela contra a exploração de lítio

Cerca de 400 pessoas participaram, este sábado, na Torre, o ponto mais alto da Serra da Estrela, numa ação organizada por um grupo de cidadãos e associações ambientais contra a exploração de lítio em Portugal. A maior parte dos participantes são estrangeiros, mas também contou com representantes de associações ambientalistas e movimentos cívicos e do partido ecologista Os Verdes.

A ação, que decorreu no ponto mais alto de Portugal continental, consistiu na criação da mensagem “Não às minas. Water is life [A água é vida]” e no desenho da “árvore da vida”, com o recurso aos corpos das pessoas, que foram filmados com um ‘drone’. Segundo os promotores, a mensagem visual irá ser divulgada internacionalmente “para ampliar as vozes dos milhares de cidadãos e grupos ambientais do centro e norte do país que estão contra a mineração de lítio e outras substâncias à porta das suas residências”.

A iniciativa foi promovida pelas organizações Awakened Forest Project e Wildlings, com o apoio de outras entidades como a Tamera, Teia da Terra ou Linha Vermelha.

De acordo com Raquel Perdigão, da organização, a ação é “uma chamada de atenção para todos os contratos [de explorações de lítio] que estão prestes a serem assinados” em Portugal. “Nós queremos chamar a atenção, não só da população, mas também do Governo”, disse.

Raquel Perdigão explicou aos jornalistas que a exploração de lítico acarreta “riscos sociais, económicos e ambientais”, destacando a poluição devido às emissões de CO2 (dióxido de carbono) e de lençóis freáticos e preocupações com “a desflorestação das áreas que poderão sofrer essa extração”.

À rádio Observador, Pedro Santos, secretário da Direção Nacional da Quercus, lembra também que algumas destas minas a céu aberto vão ser instaladas numa zona reconhecida pela UNESCO como património agrícola mundial.

Pedro Santos, secretário da Direção Nacional da Quercus, explica o impacto das minas de lítio em Portugal

Os participantes exigem ao Governo e às entidades locais para que repensem os efeitos que a exploração de lítio terá para o país. Samuel Infante, da associação ambientalista Quercus, entidade que está desde a primeira hora na luta “contra a corrida ao lítio”, disse que a ação realizada na Serra da Estrela serve para dizer que o país “não precisa desta corrida” a esta exploração e existem alternativas de desenvolvimento. Os participantes dizem um “não redondo” ao Governo na corrida “completamente desenfreada”, disse o representante da Quercus.

Miguel Martins, do partido ecologista Os Verdes, que também marcou presença na ação, disse à Lusa que “não pode haver exploração de recursos minerais que coloquem em causa a qualidade de vida das populações, dos ecossistemas e do próprio ambiente”.

O local foi escolhido para o protesto — a Torre, o ponto mais alto de Portugal continental — foi por existirem diversos pontos de prospeção de lítio à volta da Serra da Estrela, com a concessão “Boa Vista”, que abrange os concelhos de Seia, Tábua, Oliveira do Hospital e Gouveia, segundo os promotores.

A ação popular realizada este sábado é contra a estratégia internacional do Governo “de lançar Portugal como destino para a mineração de lítio, com 10,1% do território para prospeção”.

O protesto apanhou de surpresa o pastor Pedro Gomes, de Oliveira do Hospital, que apascenta 400 ovelhas na Serra da Estrela. Pedro Gomes disse à Lusa que a exploração de lítio “é muito prejudicial para a saúde e para as águas” e o Governo devia “por um travão” no processo.